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Brasil quer discutir lei sobre internet com internautas

Ministério da Justiça abre consulta pública para definir os direitos do e-cidadão

Por Tatiana Mello Dias
Atualização:

A ideia é ótima – resta saber como será colocada em prática. O Brasil inaugurou na semana passada o que se pode chamar de primeira consulta pública colaborativa do mundo. A sociedade participará, pela primeira vez, da elaboração de um projeto de lei – de uma forma muito mais clara, simples e acessível do que as consultas públicas que são feitas hoje, por exemplo, na Anatel. O tema em discussão é justamente de interesse dos internautas: o Marco Civil da Internet, a primeira legislação brasileira que definirá os direitos e deveres de sociedade, empresas e governos na internet. "Estamos utilizando uma metodologia de consulta para que seja um marco da liberdade de expressão e da democracia. Isso significa ampliar o potencial de debate através da internet", disse o ministro da Justiça, Tarso Genro, durante o lançamento da consulta pública na quinta-feira, 29, no Rio de Janeiro. O público opinará mediante cadastro no site Culturadigital.br. O texto-base foi elaborado pelo Ministério da Justiça em parceria com o Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio. São três eixos de discussão: direitos individuais e coletivos, responsabilidade dos atores e diretrizes governamentais. Entre os assuntos a serem discutidos estão vários temas delicados que hoje ainda não têm regras claras. Os provedores podem armazenar os logs (dados de navegação de usuários)? Como? Por quanto tempo? O usuário tem direito a acessar a web anonimamente? O poder público tem a obrigação de disponibilizar as informações na internet? De que maneira? Como o governo pode ajudar a universalizar a banda larga? Essas questões –e muitas outras – ainda não têm respostas. "Estamos buscando contribuições qualificadas", disse Ronaldo Lemos, responsável na FGV pelo projeto. Ele explica que o próprio Ministério da Justiça moderará a discussão. Podem participar pessoas físicas ou instituições, que terão peso igual. "Ganha o debate quem melhor expor sua opinião", diz. O texto-base ficará em discussão por 45 dias. Depois, será elaborado um projeto de lei, que ficará novamente em discussão por 45 dias, até que o texto final seja aprovado colaborativamente. Hoje, segundo Lemos, há 43 projetos de lei que legislam sobre um ou outro tema, mas não há um marco organizado como esse. "O vazio deixado pela falta desse marco abre espaço pra propostas de regulação que não são boas", explica Alfredo Manevy, secretário executivo do Ministério da Cultura. A abertura para a discussão veio justamente do movimento contrário proposto pelo projeto de lei 84/1999 (mais conhecido como Lei Azeredo), que tipificava os crimes na internet. "Uma das grandes críticas era a de que o Brasil teria uma lei penal (a Lei Azeredo) antes dos usuários de internet terem seus direitos assegurados", disse ao Link Pedro Abramovay, secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça. Foi ele quem puxou a discussão e articulou os responsáveis pela elaboração do projeto: Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV-Rio (que ajudou a elaborar o texto-base), Ministério da Cultura (que colaborará com a consulta pública, hospedada no Culturadigital.br) e deputados federais, como Júlio Semeghini (PSDB-SP) e Paulo Texeira (PT-SP), que encabeçam a discussão na Câmara. "Eu não tenho que me identificar para sair de casa. Isso também não faz sentido na internet", diz o deputado Teixeira. Após o movimento de oposição à Lei Azeredo – que chegou a classificar o projeto como "AI-5 digital", o Congresso realizou uma série de discussões sobre o tema. Em julho, o próprio deputado Semeghini havia sinalizado a possibilidade de criar uma nova legislação. O projeto do marco, porém, surgiu após a visita do presidente Lula ao Fórum Internacional do Software Livre, em junho desse ano. O marco regulatório não especificará nenhum crime na internet. Não serão abordados temas como pirataria, fraudes e espalhar o vírus – esses são temas para uma próxima legislação, que será aplicada – mas sem abusos, porque os direitos de liberdade dos internautas, se tudo correr como esperado, estarão garantidos pelo marco. "Queremos evitar que a discussão sobre esses pontos fique reaparecendo. Hoje cada projeto de lei tenta dar uma solução própria. O que a gente quer é discutir isso de uma vez por todas, da forma mais aberta possível, e as soluções têm que ser discutidas em cima desse projeto", diz Lemos.  

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