COLUNA-Turbulência política à frente

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Por (O AUTOR É EDITOR DE FRONT PAGE DO SERVIÇO BRASILEIRO DA REUTERS. AS O
Atualização:

O radar político mostra claras zonas de turbulência à frente e o placar apertado da eleição presidencial do último domingo é só um dos motivos para esta previsão. Um presidente que vence no primeiro turno, como Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em 1994 e 1998, ou que vence com larga vantagem no segundo turno, como Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2002 e 2006, inicia seu governo com um amplo mandato popular que se impõe fortemente sobre o Parlamento. Com exceção dos deputados e senadores claramente de oposição, todos os outros querem se aproveitar, de algum modo, da popularidade do novo governante. Há quatro anos, a presidente Dilma Rousseff (PT) não teve uma vitória esmagadora no segundo turno, mas ainda assim foi expressiva --56,05 a 43,95 por cento dos votos válidos, uma diferença de 12 milhões de votos. Além disso, ela foi eleita surfando na altíssima popularidade do presidente que saía, Lula, e num país com forte crescimento econômico. Agora, a diferença pró-Dilma não chegou a 3,5 milhões de votos. Mais, ela não foi eleita pela popularidade do presidente atual --embora a melhora durante a campanha da aprovação a seu governo certamente tenha ajudado-- e a situação econômica é de estagnação. Os problemas se seguem. Um dos partidos historicamente aliados, o PSB, deixou o governo no ano passado, lançou candidato a presidente nesta eleição e, para piorar ainda mais o quadro, decidiu apoiar o adversário de Dilma, Aécio Neves (PSDB), no segundo turno, sacramentando um caminho sem volta. Ao menos por ora. Além disso, o maior partido da coalizão governista, o PMDB, está rachado como há tempos não se via. A primeira mostra disso se deu antes de a campanha eleitoral começar, quando cerca de 40 por cento dos convencionais votaram contra a repetição da coligação com o PT, mesmo sendo novamente candidato a vice o presidente do partido, Michel Temer. E ainda falando de PMDB, o nome mais cotado do partido para ser o próximo presidente da Câmara dos Deputados é o do líder da bancada na Casa, Eduardo Cunha (RJ), que já se mostrou, para dizer o mínimo, bastante independente do Palácio do Planalto. Outro ponto é o fato de ser muito mais complexa a distribuição de cargos de primeiro, segundo e outros escalões por não se tratar de um governo novo. Ninguém quer perder o espaço que já tem e todos tentam ocupar mais espaço ainda, o que torna mais difícil agradar a base parlamentar. Ao mesmo tempo, pela primeira vez em muito tempo a oposição promete ser realmente atuante no Congresso, e o derrotado na eleição presidencial tem um mandato que pode usar para cobrar o que foi prometido na campanha. Presidente do PSDB, se quiser se manter em evidência para uma segunda tentativa para chegar ao Palácio do Planalto em 2018, Aécio precisará ser muito mais combativo na tribuna do Senado do que foi na primeira metade de seu mandato de senador. E terá companhias de peso de seu partido para isso. Além do seu companheiro de chapa, Aluysio Nunes (SP), voltam à Casa José Serra (SP) e Tasso Jereissati (CE). E Dilma ainda tem um outro grande problema. Seu governo e sua base parlamentar estão sob bombardeio de pesadas denúncias de corrupção, especialmente na Petrobras. Segundo depoimentos de um ex-diretor da estatal, haveria um suposto esquema de sobrepreços nos contratos da empresa, que serviriam para abastecer partidos e políticos governistas. Para coroar todo esse quadro, a última edição da revista Veja trouxe reportagem com o que seria declaração do doleiro Alberto Youssef, em depoimento à Polícia Federal, dizendo que tanto Lula como Dilma saberiam do suposto esquema. Especialmente por conta disso, a palavra impeachment já começa a circular. Dilma rebateu com veemência a acusação, publicada a dois dias da eleição, e garantiu que quer a investigação completa do escândalo "doa a quem doer". Mas o assunto impeachment emergirá de tempos em tempos, dependendo da temperatura política, do desempenho da economia e, claro, das próprias investigações. Diante desse cenário é importante a presidente realmente colocar em prática o que tem prometido desde que foi confirmada sua reeleição: diálogo. Também será fundamental escolher um coordenador político muito hábil, com bom trânsito no Congresso, com os partidos e, principalmente, com a própria presidente. Se a definição do novo ministro da Fazenda será importante para sinalizar em qual direção vai caminhar a economia nos próximos anos, a escolha do coordenador político é essencial para mostrar quais as chances de Dilma atravessar as zonas de turbulência sem tantos solavancos. * Esta coluna foi publicada inicialmente no terminal financeiro Eikon, da Thomson Reuters.

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