Decisão do Fed ajuda Brasília

Pressionado pela crise política e pela resistência ao plano de ajuste de suas contas, o governo brasileiro teve pelo menos uma boa notícia nesta semana. O aumento de juros nos Estados Unidos foi mais uma vez adiado. Com isso a presidente Dilma Rousseff ganha algum tempo para reformular e negociar a arrumação do Orçamento antes de um novo aperto no mercado financeiro. Avançar nessa negociação é fundamental para definir um rumo para o próximo ano, dar ao mercado algum sinal tranquilizante e afastar o risco de um novo rebaixamento da nota de crédito do País. Mas a elevação dos juros básicos poderá ocorrer até dezembro, segundo indicou a presidente do Federal Reserve (Fed, banco central americano), Janet Yellen. Sem dar um prazo, ela deixou essa possibilidade aberta. Além disso, 13 dos 17 membros do comitê responsável pela política monetária previram uma alta de 0,25 ponto ainda este ano.

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Por Redação
Atualização:

Se os juros básicos forem aumentados nos Estados Unidos, o acesso ao financiamento internacional ficará mais difícil, especialmente para governos com as contas em mau estado. Além disso, o crédito soberano do Brasil já foi rebaixado ao grau especulativo pela Standard & Poor’s (S&P), uma das três mais importantes agências de classificação de risco. Se mais uma grande agência retirar do País o grau de investimento, um rótulo de seriedade, muitos fundos serão obrigados, legalmente, a abandonar as aplicações em títulos do governo brasileiro. Isso poderia representar a perda imediata de cerca de US$ 8 bilhões, segundo estimativa da gestora britânica Ashmore. De acordo com o mesmo informe, as aplicações podem ter chegado a US$ 16 bilhões, mas parte já deve ter sido descartada.

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A presidente Dilma Rousseff e pelo menos alguns de seus auxiliares parecem ter esquecido esse perigo, quando resolveram, no fim de agosto, mandar ao Congresso um projeto de Orçamento com déficit primário de R$ 30,5 bilhões. Esse lance foi um fator importante para o corte da nota brasileira, segundo explicação divulgada pela S&P. A posição do Brasil já se havia enfraquecido com a redução, anunciada algumas semanas antes, das metas fiscais para 2015 e para o próximo ano. A admissão de um buraco na proposta orçamentária de 2016, num cenário de crise política e de resistência ao ajuste dentro do próprio governo, completou os dados necessários à decisão de cortar a nota brasileira.

Pouco antes do rebaixamento o ministro da Fazenda, em entrevista na Europa, mencionou esse risco aos jornalistas. Mas o perigo foi obviamente subestimado no Palácio do Planalto. Por isso o anúncio da S&P foi recebido por pessoas do primeiro escalão do Executivo como algo inesperado pelo menos naquele momento. Há poucos dias a Moody’s, outra agência de peso, divulgou um comentário favorável ao novo esforço do governo para propor um programa de ajuste. Seria obviamente um erro tomar esse comentário como sinal de complacência com novos erros e de paciência para uma longa espera. Uma nova imprudência do governo brasileiro, agora, terá consequências muito mais graves, porque fundos serão forçados a se fechar para o Brasil.

Também será imprudente menosprezar o risco de aumento, nos próximos dois meses, dos juros americanos. Quanto a esse ponto os dirigentes do Fed foram claros. A economia americana continua em recuperação e poderá crescer 2,1% neste ano. Além disso, o desemprego, já reduzido a 5,1%, tende a continuar em queda. Como a inflação permanece muito baixa, há espaço para manter os juros entre zero e 0,25%. Mas eles chamaram a atenção principalmente para o quadro externo, com problemas na China e a retomada lenta na União Europeia. Mas todo o cenário será reavaliado em outubro e dezembro e ninguém poderá alegar surpresa se os juros afinal subirem.

Os céus têm ajudado, mas um sentido de urgência poderia ser muito útil no Palácio do Planalto. Sensatez, visão de longo prazo e preocupação com a eficiência da máquina também seriam bem-vindas.