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Pediatras defendem fim do álcool na gravidez

Livro da Sociedade de Pediatria traz dados científicos sobre efeitos nocivos ao feto

Por Karina Toledo
Atualização:

A Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP) lançou ontem uma publicação em que defende que as grávidas não consumam álcool - mesmo moderadamente. A abstinência é recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e demais entidades da área, como sociedades de obstetrícia, mas há médicos que liberam uma taça de vinho de vez em quando às pacientes. Estudos brasileiros indicam que de 20% a 40% das gestantes consomem bebida alcoólica."Mesmo entre os médicos, a desinformação ainda é grande", alerta Clóvis Constantino, presidente da SPSP. "Além de alertar a população e os profissionais de saúde, queremos sensibilizar o poder público para a necessidade de incluir advertências nos rótulos de bebidas." O livro Efeitos do Álcool na Gestante, no Feto e no Recém-Nascido reúne as principais evidências científicas sobre o tema.De acordo com a pediatra Conceição Segre, coordenadora do livro, o álcool ingerido pela gestante ultrapassa a barreira da placenta e se acumula no líquido amniótico. Também atinge o feto pelo sangue do cordão umbilical, prejudicando a transferência de nutrientes e oxigênio. Em cerca de uma hora, os níveis de álcool no sangue fetal são iguais aos da mãe. Mas, como o bebê tem massa corporal menor e o fígado imaturo para metabolizar a substância, calcula-se que o efeito tóxico para ele seja oito vezes maior.Sequelas. As consequências dessa intoxicação permanecem a vida inteira, com intensidade variável, diz Conceição. Nos casos mais graves, que caracterizam a síndrome alcoólica fetal e atingem um a cada mil bebês, ocorrem malformações na face, diminuição no perímetro cefálico - por causa das alterações no sistema nervoso - e retardo no crescimento pré e pós-natal. Estima-se que para cada caso da síndrome completa haja outros três do chamado "espectro de distúrbios fetais causados pelo álcool". "São alterações neurológicas percebidas apenas mais tarde, quando a criança está em idade escolar", conta a médica. Dificuldades de linguagem, déficit de atenção e hiperatividade são alguns dos efeitos tardios. "O nível seguro para o consumo é desconhecido. Por isso, a não ingestão de álcool pela grávida e pela mulher que deseja engravidar é a única forma de prevenção", defende Conceição.O psiquiatra Erikson Furtado, professor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, conta que um estudo feito nos anos 1980 mostrou que uma única dose de álcool era capaz de provocar o que os médicos chamam de sofrimento fetal - alterações no batimento cardíaco associadas à queda na oxigenação. "Pacientes relatam que depois de beber percebem o bebê mais inquieto. Isso pode ser sinal de sofrimento fetal", diz a psiquiatra Camila Magalhães Silveira, do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa). "Há a cultura de que se pode beber um pouquinho. Mas, de pouquinho em pouquinho, faz-se um consumo regular", afirma.Antonio Moron, da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), afirma que alguns médicos adotam uma postura mais liberal para parecer mais "simpático" às suas pacientes. "A crença de que só uma tacinha não faz mal é muito difundida, mas é um conceito totalmente errôneo."Autorização. As colegas de trabalho Fernanda Guerra, de 33 anos, e Cintia Castellanos, de 29, estão grávidas do primeiro filho. As duas contam que foram autorizadas por seus obstetras a consumir álcool moderadamente. "Passei por vários médicos até escolher um para fazer o pré-natal e o parto. Todos disseram que não tinha problema beber só um pouquinho", conta Fernanda. Apesar da autorização, ambas optaram por não arriscar.Já a estudante Iara (nome fictício), de 24 anos, revela que sentia muita vontade de tomar vinho quando esperava a filha, hoje com 7 meses. "O médico disse que depois do primeiro trimestre não havia problema em consumir o equivalente a uma taça por semana. E eu aguardava esse dia muito ansiosa."

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