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Recapitulando

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Por Luis Fernando Verissimo

Uma crônica escrita para ser lida no dia 31 de dezembro ou é o que se espera de uma crônica escrita para ser lida no dia 31 de dezembro – um apanhado final do que foi o ano que termina, uma retrospectiva dos seus melhores e piores momentos, etc. – ou um monumento à alienação. Cheguei a pensar em escolher uma figura que simbolizasse o ano e o Brasil em que estamos vivendo e estava quase me definindo pelo Japonês Bonzinho, mas acabei optando por desconsiderar a data. Me recuso a recapitular, ainda mais um ano de péssima qualidade como foi 2015, que, fora a volta do Botafogo à primeira divisão, não teve nada que o recomendasse. Prefiro aproveitar o espaço para fazer uma retrospectiva pessoal, de coisas que a vida me ensinou, da sabedoria acumulada através dos anos que, penso, as novas gerações podem aproveitar. Aprendi que filosofia é tudo que você diz com o olhar parado – a não ser que você esteja dando um pum. Que felicidade é descobrir que ainda tem Coca na latinha que você pensava ter esvaziado. Que a frase mais enternecedora da língua portuguesa é “esse é o colesterol bom”. E a mais bonita é “os triglicérides estão normais”. Que o controle remoto é a maior invenção da humanidade desde a varinha para coçar as costas.  Que o pudim de laranja é a única prova convincente da existência de Deus. Além da Patrícia Pillar, claro. Que em terra de cegos o trânsito deve ser uma loucura e quem tem um olho abre uma seguradora. Que algo morreu dentro de alguns brasileiros com a descoberta de que não se pode confiar mais nem em bancos suíços, e nada mais é sagrado.  Que você sabe que não está agradando quando a mulher olha para você como se tivesse acabado de tirá-lo do seu nariz. Que você sabe que está ficando velho quando a sua memória... a sua memória... O que é que eu ia dizer, mesmo?  Que você sabe que está ficando velho quando só consegue sair da poltrona na terceira tentativa e aí esquece por que se levantou.  Que você sabe que está ficando um velho filosófico quando lhe perguntam o que você acha de viver no Brasil e você responde “A gente acaba se acostumando...”.

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