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A direita civilizada não é uma utopia

A votação da PEC 45 revelou o contraste entre os verdadeiros liberais e os conservadores de fancaria. A concertação de interesses em bases civilizadas, alinhadas à Constituição, move o País

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Por Notas & Informações
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A histórica aprovação da reforma tributária pela Câmara mostrou quão longe o Brasil pode avançar quando forças políticas adversárias são capazes de superar divergências para debater, civilizada e democraticamente, projetos de interesse de toda a sociedade. Foi exemplar, nesse sentido, o diálogo republicano estabelecido entre o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e parlamentares de diferentes afiliações ideológico-partidárias a fim de destravar as negociações que, ao fim e ao cabo, levaram à construção dos termos finais da reforma.

A votação confortável da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45, com mais de 370 votos favoráveis nos dois turnos, revelou, ainda, que uma direita civilizada, liberal e propositiva – a direita que este jornal tanto tem conclamado a se organizar e se distanciar de qualquer associação com essa extrema direita selvagem encabeçada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro – não é uma utopia. Ela existe e, como se viu, mostrou seu grande valor para a construção democrática de consensos em prol do País. Nos dias que antecederam a votação da PEC 45, ficou evidente o contraste entre os verdadeiros liberais democratas e os conservadores de fancaria.

Imbuído da missão de conciliar o apoio a uma proposta de interesse nacional e a defesa dos interesses de São Paulo, Tarcísio foi a Brasília para negociar ajustes nos termos da reforma tributária com membros do governo federal e do Congresso. Foi o que bastou para ser hostilizado por Bolsonaro e pela malta que ainda o acompanha no PL. Para os bolsonaristas, Tarcísio cometeu o pecado mortal de fazer a boa política, vale dizer, a política que produz bons resultados para o País, independentemente de eventuais concessões programáticas ou ideológicas que possam ser feitas com vistas ao interesse público.

Não surpreendem, portanto, os apupos ao governador paulista, não só humilhado pela bancada do PL, como jogado por Bolsonaro aos cães das redes sociais, numa tentativa patética do ex-presidente de demonstrar um poder que, hoje, só existe na sua imaginação. Essa direita raivosa e destrutiva privilegia a polarização, a intolerância e a recusa ao diálogo como instrumentos de ação política. Nada tem a oferecer ao País, como restou demonstrado.

A direita selvagem é infensa à cooperação com adversários. Não reconhece a necessidade de concertações políticas nem é capaz de firmar compromissos para impulsionar o desenvolvimento do País. Os verdadeiros conservadores, ao contrário, como genuínos democratas que são, são plenamente capazes de sentar-se à mesa com adversários políticos para discutir reformas do Estado por meio da negociação democrática, não da ruptura. Foi o que se viu na aprovação da PEC 45. É dessa direita que o País precisa e, como se viu, deu um passo à frente para reafirmar sua importância para o desenvolvimento do País.

Mas, paralisados pela ideia de fazer uma oposição irracional ao governo do petista Lula da Silva, os bolsonaristas ditos “liberais” não têm esse alcance. Tanto que tiveram de ouvir o óbvio do governador de São Paulo. A Bolsonaro e à bancada do PL, Tarcísio teve de relembrar que “a direita não pode perder a narrativa de ser favorável a uma reforma tributária” – e por razões óbvias: uma reforma que modernize o sistema tributário, reduzindo a capacidade do Estado de infernizar a vida dos empreendedores, obviamente deve ser apoiada e liderada por quem se diz liberal.

Como mostraram as bem-sucedidas negociações para a aprovação da PEC 45, o Brasil só tem a ganhar quando adversários políticos se dispõem a debater projetos de interesse nacional de forma madura e civilizada.

A sociedade tem muito a refletir a partir da aprovação da reforma tributária, uma conquista de todos; não de um governo, de um partido ou de indivíduos. Dessa compreensão advirá a constatação de que o melhor interesse público, perene, sempre se sobrepõe às disputas político-ideológicas de ocasião; e a concertação de interesses em bases civilizadas, alinhadas à Constituição, é o que move o País.