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Opinião|Itaipu quita a dívida de sua construção

Com uma usina amortizada e modernizada, que venham mais 50 anos de energia limpa e abundante, capaz de transformar e desenvolver as economias do Brasil e do Paraguai

Em 2023, ano do cinquentenário do Tratado de Itaipu, Brasil e Paraguai celebram um feito extraordinário: a quitação da dívida contraída para a construção de uma das maiores obras de engenharia do mundo, a Hidrelétrica de Itaipu, no Rio Paraná, fronteira dos dois países. Em 28 de fevereiro ocorrerá o pagamento da última parcela, assim distribuída: US$ 107 milhões ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e US$ 8 milhões à Eletrobras.

Para assegurar a construção desta obra portentosa – ainda hoje modelo e padrão de engenharia para o mundo –, a Eletrobras captou empréstimos em dólar. A amortização do empréstimo deu-se por intermédio do custo do serviço de eletricidade da Itaipu, valor definido anualmente e pago em dólar por consumidores brasileiros e paraguaios em contrapartida da energia suprida.

Energia é insumo fundamental para o desenvolvimento econômico e social de todas as nações. É nesse contexto que se insere Itaipu, exercendo papel da mais alta relevância para o Brasil e para o Paraguai. O tratado que permitiu a construção da usina, motivo de orgulho para as duas nações vizinhas e irmãs, resultou de extraordinária ação diplomática do Brasil com o Paraguai e a Argentina. A obra, em si, é um dos exemplos da capacidade técnica e empreendedora do nosso país, reconhecido internacionalmente pela geração de energia limpa e renovável.

Itaipu reuniu tecnologias que são referência para as barragens brasileiras e para o mundo. Um exemplo clássico é a usina chinesa de Três Gargantas, atualmente a maior hidrelétrica em termos de potência instalada no mundo, que contou, tanto na concepção de seu projeto quanto na realização de suas obras civis, com a participação decisiva de empresas brasileiras.

Passados 50 anos do tratado que a viabilizou, Itaipu acumula produção de 2,9 bilhões de megawatts-hora (MWh), a contar de maio de 1984, quando entrou em operação a sua primeira turbina. Essa marca equivale à energia consumida no mundo por 46 dias. Mas os recordes de Itaipu não se restringem à sua produção. Desde a fase de elaboração de seu projeto, erigiu-se uma história de respeito ao meio ambiente, com a finalidade de garantir a qualidade da água do reservatório e de preservar a fauna e a flora da região.

Em 2015, o programa socioambiental desenvolvido pela Itaipu em parceira com 29 municípios lindeiros obteve o reconhecimento da Organização das Nações Unidas (ONU) como a melhor gestão de recursos hídricos do mundo. Concorreu com 40 iniciativas de todos os continentes e conquistou o primeiro lugar na categoria Melhores práticas em gestão da água, agraciado com o prêmio Água para a Vida. A área protegida da usina, de mais de 100 mil hectares somente na margem brasileira, obteve da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em 2019, o reconhecimento como Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, maior status de proteção ambiental global.

Com os olhos no futuro, Itaipu iniciou em 2022 o maior programa de atualização tecnológica da história da usina, que prevê investimentos de mais de US$ 900 milhões em dez anos, buscando garantir a qualidade de seus equipamentos e sistemas de controle.

Exemplo de engenhosidade financeira e de engenharia de grandes barragens, a eminente obra de nossa diplomacia, superando divergências sobre os limites de fronteiras que nos distanciavam, fez surgir o maior empreendimento hidrelétrico do mundo em energia gerada, mediante a associação entre dois países irmãos, Brasil e Paraguai. As águas do Rio Paraná passaram, assim, a ser motivo de união, amizade e integração.

Sustentada pelos recebíveis oriundos da comercialização de sua energia elétrica, a estruturação financeira de Itaipu é extremamente competente porque paga a dívida, a operação e a manutenção da usina. Mas não só. Distribui royalties e, além do mais, garante, principalmente ao Paraguai, autossuficiência enérgica.

Desde 1985, a título de encargos do anexo C do tratado, já foram repassados US$ 20,2 bilhões aos dois países. A compensação financeira denominada royalties, de grande impacto socioeconômico, rendeu mais de US$ 13 bilhões aos consorciados, beneficiando, no Brasil, 347 municípios em cinco Estados: Paraná, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Minas Gerais e Goiás, além do Distrito Federal.

A dívida, que até 2021 representava cerca de 60% do orçamento da usina, algo em torno de US$ 2 bilhões anuais, será integralmente paga agora em fevereiro. Além desse feito digno de comemoração, brasileiros e paraguaios terão, a partir deste ano, a oportunidade de atualizar as condições dispostas no anexo C, em que são definidas as bases financeiras e de prestação dos serviços de eletricidade da entidade binacional. Quitada a dívida, auspiciosas negociações para a revisão do anexo serão conduzidas pelos governos do Brasil e do Paraguai, em benefício de nossos povos.

Com uma usina amortizada e modernizada, que venham mais 50 anos de energia limpa e abundante, capaz de transformar e desenvolver as economias do Brasil e do Paraguai.

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DIRETOR FINANCEIRO EXECUTIVO DA ITAIPU BINACIONAL, FOI DIRETOR-GERAL DA ANEEL

Opinião por André Pepitone da Nóbrega