Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Vitória da sociedade

Condenação de Jair Bolsonaro por seus ataques à imprensa resguarda o direito à informação

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
2 min de leitura

Jair Bolsonaro foi condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) a pagar R$ 50 mil por dano moral coletivo em razão de seus ataques sistemáticos a jornalistas, sobretudo mulheres, e por sua campanha de desqualificação da imprensa profissional e independente. A decisão, tomada pela 4.ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP em ação movida pelo Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo em 2021, transitou em julgado.

A condenação de Bolsonaro por agressões contra jornalistas e veículos de imprensa é emblemática, menos pelo valor financeiro – irrisório para quem, segundo consta, arrecadou mais de R$ 17 milhões em doações de apoiadores via Pix – e mais pelo valor simbólico. Ao reconhecer que Bolsonaro é um inimigo da imprensa livre, o TJ-SP deu um claro recado a outros que, como ele, são infensos às normas do Estado Democrático de Direito: quem resolver minar a liberdade de imprensa e agredir jornalistas terá de prestar contas à Justiça.

O veredicto representa um marco histórico na luta contra a escalada dos discursos de ódio e, em particular, contra a desvalorização do jornalismo profissional como um dos guardiões da verdade dos fatos, sem a qual, como ensinou Hannah Arendt, não há debate público em bases minimamente racionais com vista à construção de consensos. Em outras palavras: sem imprensa livre, não existe democracia.

Muito antes de assumir a Presidência da República, Bolsonaro já era conhecido por sua hostilidade atávica à imprensa profissional e independente, vale dizer, o jornalismo que é crítico por dever de ofício às ações e omissões dos detentores de poder político. Como presidente, Bolsonaro degradou a posição de chefe de Estado e de governo ao usar o poder inerente ao cargo para atrapalhar, quando não impedir, o livre exercício da atividade jornalística.

Já no primeiro ano de governo, convém recordar, Bolsonaro editou uma medida provisória (MP) que desobrigava as empresas de capital aberto de publicar seus balanços em jornais de grande circulação, como prevê a Lei das Sociedades Anônimas. Sem esconder que, com a edição dessa MP, pretendia satisfazer um desejo pessoal de vingança, Bolsonaro afirmou que estava apenas “retribuindo”, por meio da asfixia financeira das empresas jornalísticas, o “esculacho” que, segundo ele, recebia da imprensa.

A perseguição a jornalistas durante seu governo também se deu por meio da instrumentalização de instituições de Estado, como a Advocacia-Geral da União, a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República. São muitos os exemplos de cooptação de órgãos públicos para atender aos interesses privados de Bolsonaro, a revelar a estreiteza moral e política do ex-presidente. Tão infenso à transparência era o governo passado que, no curso de uma tragédia sanitária, a imprensa profissional teve de se unir para levar ao público informações essenciais que Bolsonaro queria manter escondidas.

A condenação de Bolsonaro, portanto, não é uma vitória da imprensa. É, antes, uma vitória da sociedade.