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Opinião|Desafios da reforma tributária para a infraestrutura

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Fernanda Sá Freire, Marco Behrndt e Mércia Braga Foto: Divulgação

A Reforma Tributária, enfim, parece ter ganhado corpo e tração, ainda que sob protestos e críticas de alguns setores econômicos que foram surpreendidos com a celeridade da votação na Câmara dos Deputados, que parece não ter entendido muito bem o desenho desse novo sistema, bem como quais os impactos financeiros que essa reforma irá causar – especialmente para o setor de infraestrutura, que foi contemplado apenas com a promessa de uma possível redução de impactos do IBS e da CBS sobre a aquisição de bens de capital.

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Os investimentos em infraestrutura de portos, aeroportos, ferrovias, estradas e energia, por exemplo, são parte essencial do desenvolvimento socioeconômico do país. Contudo, por se tratar de projetos que envolvem cifras milionárias/bilionárias, os governos do mundo inteiro concedem à iniciativa privada o encargo de desenvolvê-los, visando, com isso, redução de custos e maior eficiência, considerando a expertise desses agentes.

Como contrapartida para atrair esses investimentos, os governos sempre tiveram um protagonismo na estruturação de um plano de incentivos fiscais, já que os agentes privados estão mais inclinados a participar de grandes empreendimentos quando existe uma redução de custo.

Nesse sentido, sempre se destacaram os incentivos fiscais para aquisição interna ou importação de ativos. No Brasil, podemos citar o REIDI (Lei 11.488/2007), no âmbito federal, que permite a suspensão de PIS e COFINS na aquisição (interna ou importação) e locação de máquinas e equipamentos, materiais de construção e até mesmo prestação de serviço de construção civil. No âmbito estadual, sempre se destacaram os benefícios de suspensão do ICMS nas importações ou diferimento do imposto nas aquisições internas ou do Diferencial de Alíquota (DIFAL) do ICMS, que representam um interessante mecanismo de preservação de caixa.

Não obstante, visando uma simplificação do sistema tributário, a reforma veda a concessão de benefícios fiscais, prevendo apenas alíquotas reduzidas para determinados setores, dentre os quais não estão contempladas as obras de infraestrutura.

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De fato, o texto menciona que a Lei Complementar poderá reduzir o impacto do imposto sobre a aquisição de bens de capital pelo contribuinte. Porém, considerando que não existe mais a possibilidade de concessão de benefícios fiscais e que sequer as obras de infraestrutura estão contempladas com redução de alíquota ou em regimes tributários diferenciados, não se vislumbra margem para que a Lei Complementar crie mecanismos que realmente reduzam os custos desses projetos. Dito de outra forma, não parece que seja possível uma desoneração imediata como o REIDI, que representa uma redução de custo de cerca de 10%.

O argumento que poderia ser suscitado é no sentido que a Lei Complementar “poderá” prever a recuperabilidade dos créditos no curto prazo. Não obstante seja difícil saber como será a redação dessa Lei Complementar, ainda que seja possível prever uma sistemática célere – o que seria um desafio, considerando que o cronograma para início de operação e auferimento de receita desse tipo de projeto é longo – fato é que está sendo admitida a necessidade de desembolso de caixa com alíquota média de 27% (alíquota agregada da CBS e IBS). No caso, as novas regras tributárias irão impor que o agente privado seja capaz de obter no mercado de crédito valores muito maiores, o que, por consequência, onera ainda mais o financiamento desses empreendimentos.

Ainda, cabe mencionar que, atualmente, os serviços de engenharia civil são tributados pelos municípios a uma alíquota máxima de ISS de 5% e, como mencionado acima, são contemplados pelo REIDI, para suspensão do PIS e COFINS. Assim, ao mencionar apenas redução de impactos na aquisição de bens de capital, a proposta deixa de considerar um relevante aumento de custo do projeto que deverá ser observado nas obras de infraestrutura.

Veja, a história vem nos mostrando que normas tributárias possuem um caráter indutor de conduta, e a concessão de incentivos é uma grande aliada para atração de novos investimentos no setor de infraestrutura, especialmente diante da necessidade de reduzir o custo na fase de implementação do empreendimento. No caso, o incentivo fiscal não visa apenas baratear o acesso a um bem, mas, especificamente, garantir a viabilidade financeira para alocação em um maior número de empreendimentos.

Quando se olha, por exemplo, para os estudos sobre os novos empreendimentos relacionados a produção de hidrogênio verde – aqui destacado em razão do seu impacto no processo de transição energética –, fica claro que investidores devem buscar países que são protagonistas no desenvolvimento de políticas públicas, em especial tributária, de forma a viabilizar um melhor retorno do investimento.

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Portanto, dadas as novas condições impostas pela reforma tributária, visualiza-se um risco eminente de o Brasil ser preterido em face de outros países ou, no mínimo, o investidor não será capaz de pulverizar seu capital em diversos empreendimentos, retardando o crescimento de infraestrutura essencial para o país. Assim, é urgente a necessidade de o Governo, agora junto com os Senadores, trabalhar em alterações na proposta para garantir mecanismos capazes de atrair investidores e viabilizar as obras de infraestrutura no país.

*Fernanda Sá Freire, Marco Behrndt e Mércia Braga são, respectivamente, sócios e advogada da área de Tributário do Machado Meyer Advogados

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