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Opinião | Enciclopédia

Não existe mais o romantismo de ficar imaginando como seria um lugar, uma situação, uma época. Basta “dar um Google” e, pronto! A ansiedade dos nossos jovens está cada vez mais insaciável. Para aplacá-la, as respostas têm que ser imediatas, a apenas um clique de distância

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convidado
Por Fernando Goldsztein

Sempre que vejo meus filhos pesquisando no Google, lembro da minha época de colégio. Pesquisávamos em enciclopédias. Elas foram, por muito tempo, um sonho de consumo e de status. Lembro bem dos vendedores de enciclopédia que, muito educados, batiam à porta das casas para oferecer o produto.

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Para os que não tinham condições de ter uma enciclopédia, a solução era a biblioteca da escola. Lembro das tradicionais Britannia, Delta-Larousse, Mirador e Barsa. Tinham, em média, uns 20 volumes. Eles eram sóbrios, grandes e pesados. Suas capas duras e letras douradas reluziam nas estantes e prateleiras.

Dada a quantidade de assuntos e a restrição de espaço nos livros, não se encontrava mais do que uma página sobre o tema buscado. Muitas vezes, era apenas meia página ou menos.

Meus filhos ficam perplexos quando relato as limitações que tínhamos naquele tempo. Não existe mais o romantismo de ficar imaginando como seria um lugar, uma situação, uma época. Basta “dar um Google” e, pronto! A ansiedade dos nossos jovens está cada vez mais insaciável. Para aplacá-la, as respostas têm que ser imediatas, a apenas um clique de distância.

A velocidade da evolução é impressionante. Consumimos as telas como se fossem o ar que respiramos. E, gostemos ou não, cada vez mais dependeremos da tecnologia. O processo é inexorável, especialmente em tempos de IA generativa.

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Recentemente, fiz um curso sobre IA. Uma das primeiras falas do professor foi: “As pessoas não correm o risco de serem substituídas pela IA. Porém, correm sim o risco de serem substituídas por outras pessoas que saibam fazer uso da IA”. Portanto, a questão não é evitar, mas conseguir limitar o tempo nas telas, especialmente com relação às crianças e aos adolescentes.

Outro dia, escutava o papo do meu filho com um amigo (ambos com apenas onze anos de idade). O amigo relatava uma situação ocorrida quando foi dormir na casa de um outro colega. Havia acordado de madrugada e estranhou o local. Estava com medo, escutava supostos ruídos e não conseguia pegar no sono novamente. Resolveu, então, pedir ajuda ao ChatGPT no seu celular. Segundo o menino, o ChatGPT “conversou” com ele, tranquilizou-o, disse que nada de errado iria acontecer e que ele deveria fechar os olhos e pensar somente em coisas boas. E ainda, de quebra, escolheu algumas trilhas sonoras tranquilas para ajudá-lo a dormir.

Pergunto aos leitores deste texto, especialmente àqueles que, assim como eu, são do tempo da enciclopédia: onde é que vamos parar?

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Fernando Goldsztein
Fundador do The Medulloblastoma Initiative e conselheiro da Children’s National Foundation. Foto: Marcos Nagelstein/Estadão
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