Um ato praticado em DESCONFORMIDADE COM A LEI NÃO PODE GERAR DIREITOS; NÃO PODE SERVIR DE PARADIGMA para justificar a prática de outro ato também irregular, ilícito, ilegal. NÃO SE VALIDA UM ATO TENDO POR PARÂMETRO UM OUTRO ATO INVÁLIDO.
E essa compreensão de juridicidade impõe-se observar em um momento tão importante como o presente, a se evitar desinformação e mesmo má-fé nos debates. Admitir que uma situação ilícita, não responsabilizada no passado, possa servir de referência para não se responsabilizar outra situação ilícita no presente e no futuro, como no caso das "PEDALADAS FISCAIS", é o mesmo que admitir não possa mais haver condenação por qualquer crime neste país, como o homicídio, o estupro, o roubo, a corrupção e tantos outros, pois muitos criminosos nunca foram levados às grades dos tribunais ou sequer foram processados; é o mesmo que admitir devessem ser abertas todas as portas dos presídios do país e que nunca mais ninguém fosse condenado por crime algum.
E embora isso possa parecer absurdo, tal absurdo se encontra na mesma e exata dimensão no discurso de se pretender invocar tratamento isonômico para uma situação que tem como paradigma uma ilegalidade. Em casos tais, pode-se até argumentar com a avaliação de critérios como o "JUSTO" ou o "INJUSTO", onde uns são ou podem vir a ser punidos e outros não. E, realmente, é natural que uma situação como essa deflagre mesmo sentimentos de inconformismo e de injustiça pelo tratamento diferenciado.
Mas para o enfrentamento dessa real sensação de desequilíbrio em tema tão sensível como o da responsabilização criminal, a solução não passa pelo equivocado discurso de "não se punir hoje porque não se puniu ontem". Passa, isso sim, pela necessidade de se chamar à responsabilidade todos quantos envolvidos com ilegalidades no passado e no presente.
No ambiente jurídico, e naquilo que se possa ter como sério, consistente, ético e honesto, não há frestas para argumentos que buscam ludibriar.
O impeachment é um processo político, mas é jurídico também; é jurídico e político. Esses componentes, no impeachment, se entrelaçam e se completam; jamais se excluem. Um mínimo de visão jurídica no enfrentamento desse tema tão sensível do impeachment é uma prudente medida.
E como é corretíssima a premissa de que não pode mesmo haver impeachment sem crime de responsabilidade, por outro lado cumpre observar premissa de mesma inteligência a informar que, havendo crime de responsabilidade, o impeachment se impõe.
Alexandre Vidigal é juiz Federal em Brasília, Doutor em Estudos Avançados de Direitos Fundamentais, pela UC3, de Madri e Coordenador Acadêmico do Instituto dos Magistrados Federais-IMAFE