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‘Quem vai pagar o penduricalho do quinquênio dos juízes é o cidadão’, diz executiva da Transparência

Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil, se diz ‘chocada’ com o avanço da PEC do Quinquênio que, se aprovada, vai fazer um rombo de R$ 40 bilhões no Tesouro; ‘o Senado pretende constitucionalizar uma nova regalia’, alerta

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Por Fausto Macedo
Atualização:
Entrevista comJuliana SakaiDiretora executiva da Transparência Brasil

A PEC do Quinquênio, que avança no Senado após aprovação da Comissão de Constituição e Justiça, vai criar mais um gordo penduricalho acima do teto constitucional para juízes, promotores, procuradores e outras categorias do funcionalismo que pegarem carona no ‘trem da alegria’. A avaliação é de Juliana Sakai, diretora-executiva da Transparência Brasil. “O Senado pretende constitucionalizar uma nova regalia”, alerta.

Em entrevista ao Estadão, Juliana Sakai lembra que a Constituição impõe os limites de teto remuneratório ‘com o intuito de proteger o erário’. A PEC do Quinquênio, no entanto, vai promover mais um furo na regra ‘para garantir aumentos de remuneração automáticos de 5% a cada cinco anos, fora do teto’.

“O modelo de remunerações acima do teto de magistrados e procuradores é o pior exemplo que temos para outras carreiras do serviço público, e abre um péssimo caminho para outros servidores pleitearem os mesmo privilégios”, afirma Sakai, formada em Relações Internacionais pela USP e mestre em ciência política.

Ela argumenta que a PEC do Quinquênio irá demonstrar ‘cristalinamente como o Congresso legisla para interesse dos poderosos do sistema de Justiça, e não para a sua população’. “Teremos mais injustiça também dentro do serviço público, já que magistrados e procuradores não precisarão bater qualquer meta para receber aumento.”

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LEIA JULIANA SAKAI

A PEC do Quinquênio a surpreende mesmo diante de tantas regalias desfrutadas por setores do funcionalismo?

É chocante perceber que os membros da nossa Justiça queiram aumentar ainda mais os seus gordos salários, que já ultrapassam o teto remuneratório. Só os magistrados estaduais conseguiram embolsar R$ 3,8 bilhões acima do teto em 2023.

Frequentemente, a Transparência tem denunciado privilégios concedidos a carreiras do serviço público que já estão entre as mais bem remuneradas, como a dos próprios juízes e procuradores. A PEC amplia esse rol de penduricalhos?

Uma grande parte dos penduricalhos é criada por meio de decisões internas dos próprios CNJ e CNMP, como no caso da licença prêmio e licença compensatória. Com a PEC, o Senado pretende constitucionalizar uma nova regalia. A Constituição, que traz os limites de teto remuneratório com o intuito de proteger o erário dos poderosos, pode ser modificada para garantir aumentos de remuneração automáticos de 5% a cada cinco anos, fora do teto.

A estimativa do Tesouro é um rombo de R$ 40 bilhões/ano. O contribuinte conseguirá suportar mais esse peso na conta? Quem vai pagar?

Quem paga é o cidadão, e principalmente o cidadão mais pobre, que precisa de um serviço público de qualidade, mas vê dezenas de bilhões de reais embolsados por uma elite que não se envergonha de querer enriquecer às custas do contribuinte. O serviço público precisa de pessoas com vocação, interessadas na promoção da Justiça.

O novo penduricalho, se aprovado pelo Congresso, é justo para um País que atravessa grandes dificuldades econômicas?

A criação deste penduricalho simbolizará uma grande excrescência do estado brasileiro produzida pelos poderosos deste país. O Quinquênio demonstrará cristalinamente como o Congresso legisla para interesse dos poderosos do sistema de Justiça, e não para a sua população. Teremos mais injustiça também dentro do serviço público, já que magistrados e procuradores não precisarão bater qualquer meta para receber aumento, diferentemente do que tem sido estipulado para outras carreiras.

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Quando a proposta passou na CCJ do Senado, há duas semanas, o relator incluiu outras categorias ao texto, além de juiz e promotor. Abriu-se espaço para membros da Advocacia Pública da União, dos Estados e do DF. Também para delegados de polícia, ministros e conselheiros dos Tribunais de Contas. É um ‘arrastão’?

O modelo de remunerações acima do teto de magistrados e procuradores é o pior exemplo que temos para outras carreiras do serviço público, e abre um péssimo caminho para outros servidores pleitearem os mesmo privilégios.

Juliana Sakai aponta, ainda, mais desigualdade dentro do serviço público Foto: Alex Silva/Estadão

Como conter uma proposta que trará novos gastos bilionários?

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A sociedade civil e a mídia precisam continuar pautando este absurdo para desgastar politicamente todos aqueles que defendem essa medida. É necessário aumentar este custo político a ponto de parlamentares não quererem mais apoiar a PEC.

O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco, questionado sobre o alcance da PEC do Quinquênio, alegou que ela pode evitar que juízes deixem a toga e migrem para a iniciativa privada. O argumento a convence?

A magistratura é uma das carreiras mais concorridas do serviço público, é a elite do serviço público. A média salarial do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul em 2023 foi de R$ 80 mil. Não é o maior valor, é a média. Mas o que aconteceria, se ao invés de aumentarmos as remunerações, as abaixássemos – para respeitar o teto de R$ 44 mil – e afastássemos magistrados interessados unicamente em enriquecer às custas do contribuinte? Talvez manteríamos servidores com mais vocação ao serviço público, que gastariam menos tempo se organizando para pleitear novos penduricalhos e mais tempo em discutir e implementar melhorias no acesso à Justiça.

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