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Bruno Soller analisa o comportamento do eleitor brasileiro com base em big data e pesquisa

Opinião|Brasileiro tem lado na guerra: é pró-Israel e considera Hamas um grupo terrorista

Pesquisa e levantamento nas redes sociais revelam maior engajamento em prol de israelenses em meio ao conflito na Palestina. 78% das postagens foram em defesa da nação judaica.

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Atualização:

O mundo acompanha atentamente os desdobramentos da eclosão da guerra entre Israel e o grupo terrorista Hamas, e a pauta tem dominado praticamente o noticiário de todos os lugares. No Brasil, não é diferente. Presidente em exercício do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o País tem tido papel de destaque na condução das tratativas de busca pela paz e apresentou uma solução que não obteve êxito, em função da prerrogativa de veto dos Estados Unidos, um dos países com cadeira definitiva no órgão. Esse ambiente tem gerado no eleitor brasileiro particular interesse em entender mais do conflito e criado posicionamentos sobre o assunto.

Em levantamento encomendado pela CNN à consultoria Quaest, por meio de monitoramento digital, os dados mostram que o tema só não superou a mobilização em torno dos atos de 8 de janeiro, em que manifestantes invadiram os poderes da República. Esse engajamento revela que o conflito no Oriente Médio tem movimentado a opinião pública brasileira. Mais de 10 milhões de menções ao conflito foram detectadas e chama a atenção o altíssimo engajamento em prol de Israel, mostrando que o brasileiro, diferentemente da posição de neutralidade defendida pelo País, tem um lado definido na guerra. 78% das postagens foram em defesa da nação judaica.

Conselho de Segurança da ONU; Estados Unidos vetaram resolução do Brasil sobre o conflito entre Israel e Hamas Foto: Craig Ruttle/AP

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A solidariedade do brasileiro com Israel é tamanha, que em pesquisa exclusiva feita pela RealTime Big Data para o Blog De Dados em Dados, do Estadão, 84% dos entrevistados em todo o território nacional acreditam que o Brasil deveria estar ao lado de Israel na disputa. Para 89%, o Brasil deve condenar o Hamas e o considerar um movimento terrorista. São números expressivos, que demonstram que não há qualquer dubiedade na avaliação que o brasileiro faz sobre a questão.

A solução apresentada pelo Brasil ao Conselho de Segurança, da criação de um corredor humanitário, também é amplamente defendida pela população. 4 a cada 5 brasileiros entendem que foi uma boa proposta, apesar de não acreditarem que o Brasil tenha capacidade em liderar esse movimento internacional. Apenas 29% acham que o Brasil tem plenas condições de mediar esse emblemático e duradouro caso diplomático mundial.

O que mais chama a atenção sobre a razão dessa descrença não é nem mesmo um certo “complexo de vira-lata”, parafraseando Nelson Rodrigues, mas sim os problemas internos pelos quais o Brasil passa. É inimaginável para 66% dos entrevistados que o Brasil consiga findar o conflito, sendo que não consegue vencer a guerra local contra a violência. Os recentes episódios de assassinatos em São Paulo e, principalmente, no Rio de Janeiro aumentaram a sensação de insegurança para os cidadãos.

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A guerra contra a violência no Brasil vitima mais que a maioria das contendas mundiais. Parece ilógico para a população que esse mesmo país que não consegue vencer o narcotráfico e deixa sua população à mercê da violência urbana tenha capacidade de ser um solucionador de paz. 33% dos brasileiros afirmam já terem passado pessoalmente por uma situação de violência. Número gigantesco e que mostra o tamanho do problema no País.

As eleições locais de 2024 estão sob a égide da discussão da segurança, mesmo não sendo responsabilidade constitucional dos prefeitos atuar no tema. Mas o clima nessa esfera é terrível e amedronta a população. No Global Peace Index, o Brasil registra o maior grau de medo de violência em todo o mundo. O combate ao crime custa caríssimo e a violência é valorada em 9% do PIB nacional.

Mais de 60% dos ouvidos aprovam a frase: “antes de liderar movimentos de paz pelo mundo, o Brasil precisa equacionar seu problema interno de violência.”, um certo balde de água fria na expectativa que o governo brasileiro possa ter em lucrar algum ganho político eleitoral com a atuação internacional. É bem verdade que, para a maioria, 58%, Lula tem mais capacidade para lidar com as questões diplomáticas do que Bolsonaro, mas, mesmo assim, há um dado preocupante para o governo: 51% creem que Lula está mais empenhado na situação do conflito do que cuidando do seu próprio quintal.

As relações internacionais ajudam muito na construção de imagem dos atores políticos que posteriormente será importante na hora da decisão do voto, mas ela por si só não é fator determinante para a escolha de uma candidatura. Para 72%, Lula é mais amplo e diplomático do que Bolsonaro, muito provavelmente reflexo de uma política internacional mais isolacionista do ex-presidente, que era um crítico contumaz do globalismo e dos fóruns internacionais. Vale recordar que, em diversos palcos que Bolsonaro teve para falar à comunidade global, ele preferiu usar seu discurso para fazer discussões sobre a política interna, mostrando diferenças suas para o Brasil que recebeu dos governos petistas.

A crítica que sempre pairou sobre um certo nanismo diplomático brasileiro, com posicionamentos fluidos, sem se comprometer com grandes questões de beligerância entre nações, arrefece quando o País toma a dianteira em um conflito de grandes proporções como esse. Há que se entender, todavia, que a descrença no êxito do movimento é real e factível. A contradição entre ser promotor da paz mundial e viver em uma guerra civil é a motricidade do pensamento do cidadão comum. Entretanto, como citou certa vez Aristóteles, nada é mais paradoxal do que a guerra, já que o seu verdadeiro objetivo é a paz.

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Opinião por Bruno Soller

Bruno Soller é estrategista eleitoral. Especializado em pesquisas de opinião pública, é graduado em Relações Internacionais pela PUC-SP, com especialização em Comunicação Política pela George Washington University. Trabalhou no governo federal, Câmara dos Deputados e Comissão Europeia.

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