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Coluna do Estadão

| Por Roseann Kennedy

Roseann Kennedy traz os bastidores da política e da economia, com Eduardo Gayer e Augusto Tenório

Projeto do Carf torna a sonegação um risco calculado e vantajoso, alertam auditores

O texto aprovado na Câmara exclui juros e multas; governo avalia arrecadação imediata e, inicialmente, não deve derrubar acordo

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Por Roseann Kennedy
Atualização:

O projeto de lei que retoma o voto de qualidade do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) é visto no governo como a bala de prata para aumentar o caixa e entregar R$ 50 bilhões ao Tesouro. Mas, de olho nos recursos imediatos, possíveis com a retomada do voto de minerva pró-União, o governo fez concessões no texto que poderão transformar a sonegação em um risco calculado e vantajoso para empresários e advogados, na avaliação de auditores fiscais.

Ministro da Fazenda, Fernando Haddad 20-04-2023 Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADAO

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“O projeto foi vendido como se fosse um aperto sobre os contribuintes com pendências com o Fisco. Uma vitória da Fazenda no seu intuito de aumentar a arrecadação. E não é nada disso. O texto torna a sonegação uma atividade de risco calculado e a insolvência tributária um grade negócio para os contribuintes e tributaristas”, afirma o presidente da União Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco), Mauro Silva.

O problema apontado pelos auditores é que o PL aprovado na Câmara com base em acordo negociado entre deputados e o Ministério da Fazenda, exclui punições em casos decididos com o voto de qualidade. Serão excluídas as multas e o Fisco não representará o contribuinte ao Ministério Público por crime tributário. O contribuinte poderá pagar o débito, em até 90 dias, sem a incidência de juros de mora acumulados. Em até 90 dias do julgamento definitivo a favor da Fazenda, o contribuinte poderá pagar o débito sem a incidência de juros de mora acumulados. Os juros de mora são calculados pela Taxa Selic.

Presidente da Unafisco, Mauro Silva Foto: Divulgação

Na visão da Unafisco, o novo modelo passará a mensagem ao sonegador de que é mais vantajoso dever, aplicar o dinheiro e depois pagar o imposto, os advogados e ainda aumentar o patrimônio sem nenhum gasto real.

“Vai ser uma espécie de joint-venture, uma parceria empresarial com vantagem mútua que vai além da tradicional relação de defensores legais e clientes. Será interessante arrastar o máximo possível os processos, pois os valores investidos poderão pagar a dívida original, ampliar o patrimônio e ainda pagar os advogados sem ter nenhum custo real”, ressaltou.

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A pedido da Coluna, a Unafisco fez simulações

A pedido da Coluna, a Unafisco fez as contas para explicar porque considera que o texto poderia estimular a sonegação. Os auditores afirmam que um processo no Carf e depois na Justiça dura em torno de 10 anos. Consideraram esse prazo e uma dívida inicial de R$ 1 milhão para fazer a projeção a seguir.

Aplicando R$ 1.000.000,00 no Tesouro Prefixado com juros semestrais 2023, na data do resgate o valor líquido será de R$ 2.219.597,00.

“Ou seja, em 10 anos ele não desembolsará nada. Terá 1.219.597,00 livres. Dos quais vai tirar parte para a banca de tributaristas”, concluiu.

Agora, a Unafisco quer levar as contas aos senadores e apelar por mudanças.

Governo não tem intenção de recuar em acordo para tirar juros e multas

O montante que o governo pode arrecadar com a garantia da retomada do voto de minerva pró-União em julgamentos tributários enche os olhos da equipe econômica. Os R$ 50 bilhões estimados são considerados fundamentais para o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, cumprir a promessa de déficit fiscal zero no ano que vem.

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O ditado popular “é melhor pingar do que faltar” é uma máxima ouvida constantemente entre os diversos atores envolvidos na discussão do PL do Carf. Interlocutores da equipe econômica apontam que, desde o começo das discussões, ficou claro que livrar de multa e juros seria “a medida mais eficiente” de fazer os pagamentos realmente acontecerem.

Parecer no Senado deve ser apresentado até o final de agosto

No Senado, PL do Carf já tem relator, é o senador Otto Alencar (PSD-BA). A expectativa é de que até o final de agosto ele apresente seu parecer. O senador pretende conversar com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e com o advogado-geral da União, Jorge Messias, além do relator da matéria na Câmara, deputado Beto Pereira (PSDB-MS).

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