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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

As pessoas estão satisfeitas com as políticas de proteção ambiental no Brasil?

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Por Redação
Atualização:

Deivison Henrique de Freitas Santos. Cientista Social e Mestrando em Ciência Política (UFPR). Bolsista Capes

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Bianca Pataro. Mestre em Ciências Sociais (PUC-MG), na linha de Cultura, Identidades e Modos de Vida. Consultora socioambiental

No decorrer do século XX e a partir da popularização de conceitos como sustentabilidade e desenvolvimento sustentável[1], a relação entre sociedade e meio ambiente se tornou tema de grande preocupação. Nos dias de hoje e em diferentes medidas, lideranças políticas de todo o mundo, empresas, comunidades indígenas e pequenos e grandes produtores rurais têm se mostrado importantes agentes nos processos que objetivam a proteção ambiental e o combate às mudanças climáticas.

Especificamente no Brasil o cenário não é diferente. A preocupação com o meio ambiente tem sido fonte de vários debates e conflitos envolvendo figuras públicas e atores sociais de diversos campos. Tais confrontos e discussões, muitas vezes, ocorrem acompanhados de sugestões de políticas públicas visando a mitigação ou o controle de danos ocasionados ao meio ambiente, em razão de vários processos, sejam de exploração, sejam de produção agrícola.

Nesse contexto, e tendo em vista a relevância cada vez maior do tema em questão, torna-se pertinente indagar: em que medida as pessoas estão satisfeitas com as políticas de proteção ambiental no Brasil? E até que ponto existem variações na (in)satisfação dos brasileiros a depender de variáveis sociodemográficas e de ideologia política? Essas indagações podem servir de ponto de partida para diversas reflexões acerca da conjuntura atual do país, repleta de problemas e limitações na forma como tem se dado a relação entre a sociedade e o uso dos recursos naturais.

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Assim, neste artigo, tais questões foram analisadas a partir da utilização dos dados contidos no Estudo Eleitoral Brasileiro de 2018, survey organizado pelo Centro de Estudos de Opinião Pública da Universidade Estadual de Campinas.

Um breve panorama da situação

Ao contrário de debates negacionistas sobre as mudanças climáticas, as alterações no clima e seus efeitos ambientais e sociais são um fato (NOBRE et al., 2012). Diante disso, os controles sobre o uso de recursos naturais e sobre a emissão de poluentes avançaram ao longo das últimas décadas, sendo os acordos bilaterais envolvendo entidades governamentais, não governamentais e sociedade civil em torno dessa questão uma alternativa para regular a atuação antrópica e minimizar seus efeitos no ambiente. Não é de agora o debate sobre a relevância da proteção ambiental no Brasil. Ele já vem, por exemplo, desde a promulgação da Constituição de 1988, com uma seção específica para tratar do tema[2]. De lá para cá muito se avançou, mas ainda há muito a ser feito.

Embora não mais nos níveis que ocorria até meados de 2005, o desmatamento na Amazônia Legal brasileira apresenta tendência de alta desde 2013, segundo informações do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)[3]. Além disso, os conflitos e disputas políticas recentes, inclusive dentro do próprio Ministério do Meio Ambiente, têm servido para agravar ainda mais a situação que o país vem enfrentando[4].

A crise econômica é outro elemento que vem prejudicando os investimentos e a destinação de verbas para órgãos públicos responsáveis pela fiscalização e proteção ambiental no Brasil[5]. Por fim, é difícil ignorar a postura negacionista de parte expressiva das lideranças da República, sobretudo do presidente Jair Bolsonaro, que, em diferentes ocasiões, menosprezou o trabalho de cientistas dedicados a combater os ataques ao meio ambiente em solo nacional[6].

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É nesta conjuntura que surgiram as reflexões em torno das questões expostas por este artigo, considerando-se o questionamento sobre o grau de (in)satisfação da população brasileira com a proteção ambiental no país. Isso é relevante não somente pelo tema em si, mas também pelo fato de que, nas eleições de 2022, certamente, o debate ambiental será um dos pontos centrais a serem tratados pelos candidatos a cargos públicos.

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Vamos aos dados!

Pois bem, para investigar as perguntas centrais do artigo, e como já apontado, foram operacionalizadas informações contidas no Estudo Eleitoral Brasileiro de 2018, pesquisa pós-eleitoral, com amostra de 2506 respondentes representativa do cenário nacional.

O questionário possui uma pergunta com a seguinte indagação: vou citar algumas políticas e gostaria que o(a) sr. (a) utilizasse essa escala para me dizer o quanto está satisfeito com cada uma delas, sendo que a nota 0 quer dizer totalmente insatisfeito, e a nota 10 quer dizer totalmente satisfeito. Então, foi apresentado ao entrevistado uma lista de políticas, dentre elas, a política de proteção ambiental.

As respostas a tal pergunta foram recategorizadas para melhorar sua visualização. Os indivíduos que escolheram alguma opção entre 0 e 3 foram incluídos na mesma categoria, nomeada como "Insatisfeitos"; àqueles que optaram pelas alternativas 4, 5 ou 6 foram somados e nomeados como "Indecisos"; e, por fim, àqueles que optaram por alguma alternativas entre 7 e 10 foram somados e nomeados como "Satisfeitos". Assim, chegou-se ao Gráfico 1.

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O Gráfico 1 indica que, entre os respondentes, havia naquele momento grande insatisfação no que se refere às políticas ambientais. Dentre eles, mais de 60% se enquadraram na categoria de insatisfeitos. Contudo, observa-se parcela de 23,1% de indecisos e pequeno número de pessoas satisfeitas (13,5%). Os resultados da média e do desvio padrão das avaliações reforçam esse achado: a média das pontuações ofertadas às políticas de proteção ambiental ficou em 2,8, com desvio de 3 pontos.

Gráfico 1 - Opinião dos entrevistados sobre as políticas de proteção ambiental (%)

 Foto: Estadão

Fonte: ESEB (2018)

Por conseguinte, também foram realizados cruzamentos envolvendo a opinião sobre as políticas de proteção do meio ambiente e outras quatro variáveis: idade, escolaridade, região de moradia e ideologia. Os cruzamentos foram acompanhados de testes que buscam averiguar se existem variações estatisticamente significativas nas distribuições (qui-quadrado).

No primeiro caso, as idades foram recategorizadas de modo a criar quatro grupos, indo dos mais jovens até os mais idosos. O Gráfico 2 revela que, independentemente das idades dos respondentes, a maioria se mostrava insatisfeita (entre 57,4% e 65,3% das ocorrências a depender da categoria de idade). Em média, todos os casos apresentam uma faixa de 23% de indecisos. É possível notar que os entrevistados idosos demonstraram um pouco mais de satisfação (19,3%), mas o teste qui-quadrado indica que não existem diferenças estatisticamente significativas (p = 0,136), o que reforça o resultado de que, em geral, havia grande insatisfação, a despeito das idades.

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Gráfico 2 - Opinião sobre as políticas de proteção ambiental no Brasil separada por idade (%)

 Foto: Estadão

Fonte: ESEB (2018)

A escolaridade dos entrevistados também foi recategorizada de modo a se criar quatro grupos: os analfabetos; àqueles com alguma experiência no ensino fundamental; àqueles com alguma experiência no ensino médio; e as pessoas com alguma experiência no ensino superior.

O Gráfico 3 exibe que, de novo, a insatisfação é o que prevalecia entre os respondentes. Contudo, também é possível identificar diferenças estatisticamente significativas entre eles (p = 0,000). Os indivíduos analfabetos se mostraram muito mais insatisfeitos que os demais. Cerca de 76% desses respondentes se apresentavam descontentes. Esse número fica na casa dos 58% no caso dos indivíduos do nível fundamental, 62% entre os que possuem alguma passagem pelo nível médio e 71% entre os indivíduos com alguma experiência no nível superior.

Embora seja perceptível o aumento gradual no número de insatisfeitos, flutuando entre os níveis fundamental e superior, os valores não superam àqueles encontrados entre os analfabetos. Já se avaliados apenas os satisfeitos, percebe-se que eles estão em menor número entre as pessoas com alguma passagem pelo ensino superior (4,8%).

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Gráfico 3 - Opinião sobre as políticas de proteção ambiental no Brasil separada por escolaridade (%)

 Foto: Estadão

Fonte: ESEB (2018)

O Gráfico 4, por sua vez, mostra que, a depender da região de moradia do entrevistado, existem diferenças em sua opinião sobre o tema em análise (p = 0,031). Embora na maioria dos casos, uma vez mais, a insatisfação prevalecia no momento da pesquisa, é possível notar algumas variações. As regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste eram as mais descontentes. Todas possuem mais de 63% de respondentes que externaram descontentamento em relação às políticas de proteção ao meio ambiente, com destaque para 68% entre os indivíduos do Centro-Oeste. Já as pessoas das regiões Sul e Sudeste, apesar de existir uma maioria de insatisfeitos (58,5% e 62,2%, respectivamente), mostravam-se mais indecisas sobre o tema, sobretudo os sulistas (29%).

Gráfico 4 - Opinião sobre as políticas de proteção ambiental no Brasil separada por região de moradia (%)

 Foto: Estadão

Fonte: ESEB (2018) 

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Já o Gráfico 5 traz a comparação entre grau de (in)satisfação com a proteção ambiental e a ideologia dos entrevistados. A ideologia dos indivíduos foi mensurada por uma escala de 10 pontos, que vai da esquerda (0) até a direita (10) - escala essa que foi recategorizada. Os valores de 0 a 3 foram somados e nomeados como "Esquerda"; a soma dos valores 4, 5 e 6 se tornou a categoria "Centro"; e a categoria "Direita" foi criada a partir da soma dos valores de 7 a 10.

O teste qui-quadrado apresenta que, mais uma vez, existem diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos dados (p = 0,000). A maior quantidade de insatisfeitos se situa à esquerda do espectro ideológico. Entre os respondentes de esquerda, 69,9% alegaram descontentamento; já entre os de centro, a insatisfação ficou na faixa de 62%; enquanto nos de direita se percebe o menor número de insatisfeitos (59,8%). Chama atenção o crescimento no número de satisfeitos conforme se vai da esquerda à direita. Além disso, também merece destaque o número superior de indecisos entre àqueles que se colocaram no centro (27,2%).

Gráfico 5 - Opinião sobre as políticas de proteção ambiental no Brasil separada por posicionamento ideológico (%)

 Foto: Estadão

Fonte: ESEB (2018)

Considerações finais

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Em primeiro lugar, surpreende a expressiva insatisfação da população e a eleição, naquele momento, de candidato que se mostrava contrário ao maior controle das questões ambientais. Em todas as situações, embora em algumas existam ligeiras diferenças, observa-se um significativo percentual de pessoas que alegaram estar descontentes, mas, ainda assim, a pauta ambiental não teve peso suficiente na definição do candidato vitorioso. É possível supor que, diante de novos eventos que se apresentaram entre 2018 e 2021, como os números relacionados ao desmatamento e dados internacionais sobre a mudança climática, a insatisfação mostre-se maior atualmente, ao que se soma o fato das políticas para o meio ambiente não serem prioridade do atual governo federal.

O resultado da análise, ademais, evidencia a existência de demandas de políticas públicas na área ambiental que visem controlar a situação calamitosa encontrada em várias regiões do Brasil e que garantam a fiscalização e a diminuição dos ataques ao meio ambiente em solo nacional. Também, é interessante não haver diferenças nas posturas sobre as políticas avaliadas de acordo com as idades dos respondentes.

Uma hipótese que poderia ser formulada sobre esse tema é a de que os jovens, por possivelmente estarem mais engajados na pauta ambiental e de mudanças climáticas, mostrar-se-iam mais insatisfeitos quando comparados aos mais idosos. O resultado, portanto, pode indicar que a pauta ambiental não se mostra mais aderente aos jovens, sendo que a insatisfação das pessoas vai além dos limites de faixas etárias e de outras variáveis.

Por sua vez, as diferenças identificadas nos casos relacionados à escolaridade também chamam atenção. É possível imaginar que os indivíduos mais escolarizados demonstrariam uma postura mais crítica sobre o tema. Todavia, o que se notou foi um quadro diferente. Foram os analfabetos que se mostraram mais insatisfeitos com as políticas em análise neste artigo.

É sabido que as mudanças no clima trazem consigo muitas injustiças. Embora os países mais ricos sejam os principais responsáveis pela crise, são as nações mais empobrecidas que sofrem de forma mais impactante os efeitos das transformações climáticas[7]. No Brasil, existem milhares de indivíduos que já percebem os impactos de tais mudanças no seu dia a dia. Pequenos agricultores, comunidades indígenas e ribeirinhas e até mesmo comunidades urbanas afetadas, por exemplo, por enchentes e demais intempéries. Dada a correlação existente no país entre escolaridade e renda, pode-se supor que a parte mais prejudicada, os mais pobres, tenha relação com os analfabetos que engrossam a fileira de descontentamento.

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Em relação à região de moradia, identificou-se maior insatisfação entre os moradores das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. De certo modo, isso não surpreende, dado o fato de que são essas as regiões que vêm sendo mais degradadas por queimadas e pelo desmatamento[8]. Para mais, já que a pesquisa que fundamenta o presente estudo foi realizada em 2018, é possível vislumbrar as mudanças que esse contexto pode ter sofrido em razão das queimadas de 2019 e 2020, assim como dos desastres envolvendo mineradoras, como o desastre da Vale, na cidade mineira de Brumadinho, também em 2019.

Em se tratando da ideologia, foi possível constatar que, a depender da identificação ideológica dos respondentes, a opinião sobre o assunto sofre mudanças. Aqueles que se colocam mais à esquerda estavam mais insatisfeitos com as medidas de proteção ao meio ambiente. Enquanto isso, os entrevistados de centro foram mais moderados e indecisos nessa questão. Os de direita se apresentaram menos insatisfeitos e mais satisfeitos se comparados aos demais - mesmo que a insatisfação também prevalecesse nesse grupo. Tal resultado está em consonância com trabalhos a exemplo de Armesto (2021), que ressalta a maior simpatia de grupos e partidos de esquerda com pautas ligadas à sustentabilidade e à preservação do meio ambiente, enquanto agremiações de direita tendem a priorizar mais o crescimento e o desenvolvimento econômico.

Ficou evidente que, a despeito da idade, escolaridade, região e ideologia, o sentimento que prevalecia em mais da metade da população em 2018 era de descontentamento com o modo como tem se dado a relação entre sociedade e meio ambiente no país. Ou seja, mudanças, além de indiscutivelmente necessárias, eram esperadas pelo povo brasileiro. A questão que se coloca é: nas próximas eleições, qual será o peso dessa pauta?

Referências

ARMESTO, A. (2021). Preocupación por el cambio climático, condiciones económicas individuales y priorización del medioambiente en América Latina. Opinião Pública, 27(1): 1-27.

NOBRE, C. A.; REID, J.; VEIGA, A. P. S. (2012). Fundamentos científicos das mudanças climáticas. São José dos Campos, SP: Rede Clima/INPE.

ROMEIRO, Desenvolvimento sustentável: uma perspectiva econômico-ecológica. Dossiê Sustentabilidade, Estudos Avançados, av. 26 (74), 2012.

Notas

[1] Para Romeiro (2012), o conceito de desenvolvimento sustentável surgiu na década de 1970, no contexto de debates sobre os impactos do crescimento econômico aos recursos naturais, aparecendo inicialmente com a denominação de ecodesenvolvimentismo e evidenciando o esforço em encontrar um equilíbrio entre, de um lado, os defensores do desenvolvimentismo e, de outro, aqueles que acreditavam que o crescimento econômico levaria à catástrofe.

[2] Ver: https://www.dw.com/pt-br/brasil-falha-na-aplica%C3%A7%C3%A3o-de-leis-ambientais-diz-onu/a-47210135>. Acesso em: 16 de dez. 2021.

[3] Ver: http://www.inpe.br/noticias/noticia.php?Cod_Noticia=5811>. Acesso em: 16 de dez. 2021.

[4] Ver: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-57590198>. Acesso em: 16 de dez. 2021.

[5] Ver: https://www.dw.com/pt-br/corte-de-verba-refor%C3%A7a-desmonte-da-fiscaliza%C3%A7%C3%A3o-ambiental-no-brasil/a-57327500>. Acesso em: 16 de dez. 2021.

[6] Ver: https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2019/07/bolsonaro-critica-diretor-do-inpe-por-dados-sobre-desmatamento-que-prejudicam-nome-do-brasil.shtml>. Acesso em: 16 de dez. 2021.

[7] Ver: https://www.dw.com/pt-br/a-injusti%C3%A7a-global-da-crise-clim%C3%A1tica/a-50291890>. Acesso em: 10 de ago. 2021.

[8] Ver: https://g1.globo.com/natureza/noticia/2019/11/18/quatro-estados-respondem-por-mais-de-80percent-do-desmatamento-na-amazonia.ghtml>. Acesso em: 10 de ago. 2021.

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