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Como a conjuntura do País afeta o ambiente público e o empresarial

Investir em carreiras transversais é caminho para inovar no serviço público

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Por Redação
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Fonte: arquivo pessoal.  

Ariana Frances Carvalho de Souza, Analista Técnico de Políticas Sociais (ATPS) com experiência nas políticas públicas de Cultura, Assistência Social e Participação Social

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Gabriela Lotta, Professora na FGV EAESP e integra a lista dos cem acadêmicos mais importantes do mundo pelo portal Apolitical

A melhoria de serviços públicos deve ser uma prioridade para os governos, já que é por meio deles que conseguimos garantir acesso a direitos e as condições necessárias para o bem estar da população. Se, por um lado, a melhoria dos serviços pode - e deve - ser buscada por meio da inovação tecnológica e da digitalização, parte expressiva dessa melhoria ainda passa pelo trabalho de pessoas. Isso porque, apesar das diversas transformações provocadas pelas evoluções tecnológicas, são ainda as pessoas que dão vida e materialidade às ações do Estado. São homens e mulheres - trabalhadores do serviço público - que desenham, implementam, monitoram e avaliam as políticas. Se queremos melhorar os serviços, devemos apostar nessas pessoas.

A boa notícia é que na última semana o Governo Federal anunciou a criação de mais de 4.000 vagas de concursos públicos. Há pela frente uma grande oportunidade de recomposição de parte do corpo de trabalhadores que se aposentou ou saiu recentemente do serviço público. Se essa recomposição é essencial para garantir continuidade e aprimoramento da ação estatal, ela deveria ser vista também como uma oportunidade para o governo federal promover inovações no serviço público, apostando na contratação de carreiras inovadoras e de atuação transversal. 

O Estado brasileiro tem inovado de forma tímida no campo da gestão de pessoas. Há poucos avanços em termos de desenho de carreiras, engajamento e qualificação dos servidores, fatores essenciais para o desenvolvimento de melhores serviços públicos. Mais do que isso, o Estado brasileiro ainda pensa "dentro da caixinha" a partir da lógica de carreiras setoriais e especializadas, com baixa mobilidade intraestatal e, portanto, capacidade limitada de construir soluções intersetoriais e inovadoras. Ao mesmo tempo, há boas experiências dentro do próprio governo federal que poderiam ser vistas agora como exemplos do que pode ser feito neste processo de recomposição.

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Um dos bons exemplos está na área de políticas sociais, a carreira de Desenvolvimento de Políticas Sociais que congrega os Analistas Técnicos de Políticas Sociais (ATPS). Foi dela que o presidente Lula sentiu falta durante o recente anúncio de novos concursos públicos que serão realizados pelo Executivo Federal. Como explicou a ministra da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, o presidente ligou para saber sobre o concurso para atender as pastas da área ambiental, mas também da área social, de igualdade racial, de políticas para as mulheres, dentre outras. Se essas áreas são prioridade para o atual governo - e essenciais para o país - sua prioridade deve também se materializar em termos de contratação de servidores públicos.

A carreira de ATPS foi criada no segundo governo Lula, em 2009, e pensada para o desenvolvimento de políticas sociais de forma transversal e intersetorial, considerando que é a perspectiva necessária para lidar e desenvolver soluções para os problemas complexos da área social, de um país tão desigual. O concurso para a carreira contemplou áreas diversas como gestão social, Saúde, Assistência Social e Previdência Social.

Há 10 anos, em julho de 2013, tomaram posse os primeiros analistas de políticas sociais em diversos ministérios que, conforme já sinalizado em pesquisas sobre a atuação política da burocracia, levaram para dentro da administração pública federal seus valores aderentes às políticas sociais e seu engajamento político voltado para o desenvolvimento social.

Atualmente, são 755 analistas de políticas sociais em 11 ministérios, com maior número no Ministério da Saúde (47,5%) e no Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social (11,1%), mas com atuação relevante nos ministérios recriados do Desenvolvimento Agrário (8,1%) e dos Direitos Humanos (5,7%), e no monitoramento de pautas sociais na Casa Civil. É uma carreira que nasceu com mais diversidade e representatividade, outro fator que contribui com políticas inovadoras. Hoje, 69,4% dos ATPS têm entre 31 e 40 anos, 66% são mulheres, 24,6% são pardos e 4,8% são pretos. Ao mesmo tempo, os ATPS têm uma alta qualificação, com diversos especialistas, mestres e doutores. Um perfil interessante e que não se observa em outras carreiras que também se destacam na gestão pública federal e que consegue representar a diversidade da população brasileira

Ao longo dos últimos anos, a carreira foi a base de sustentação para a manutenção de vários programas sociais, tendo profissionais envolvidos em diversas políticas e programas essenciais como Bolsa Família, Cadastro Único, Sistema Único de Saúde (SUS), Sistema Único de Assistência Social (SUAS), Saúde na Escola, Saúde dos Povos Indígenas, Cisternas, Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), bem como em temas transversais como direitos humanos, controle social, gênero e raça. Sem servidores engajados, a desintegração das políticas públicas que vem ocorrendo desde 2016, com seu ápice nos últimos 4 anos, teria sido ainda maior. A participação da carreira foi relevante também para o diagnóstico de destruição e desfinanciamento das políticas sociais, realizado no Grupo de Transição para o novo governo Lula.

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Esse é um excelente exemplo de desenho inovador de carreira que conseguiu avançar na construção de uma burocracia mais qualificada, intersetorial, transversal e com vocação para o serviço público. E deveria servir de referência para os concursos que serão realizados nos próximos meses. Se queremos um Estado mais capaz de produzir melhores serviços públicos, é essencial que iniciativas como a da carreira de ATPS sejam priorizadas e que se avance ainda mais na construção de uma burocracia com atuação transversal, vocacionada e engajada em políticas sociais e na defesa de um Estado democrático de direito.

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