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Ouvidores se dizem traídos

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Por Agencia Estado
Atualização:

"Fomos traídos". Perplexos, o ouvidor nacional agrário Gersino José da Silva e a ouvidora-adjunta Maria de Oliveira acompanharam a ordem de prisão dada por agentes da Polícia Federal a 16 líderes dos sem-terra que comandaram a ocupação da fazenda da família do presidente Fernando Henrique Cardoso. O ouvidor Gersino tinha empenhado a palavra aos sem-terra que não haveria prisões quando o grupo de manifestantes deixasse a fazenda, invadida no sábado pela manhã. Aos poucos, os sem-terra saíram da fazenda, primeiro crianças, depois as mulheres. Propositalmente, os líderes identificados pela PF foram deixados para o final, sob o argumento de que a presença deles era necessária durante a vistoria da propriedade. Segundo Maria de Oliveira, os agentes não tinham mandado de prisão quando informaram que levariam os sem-terra, algemados, para a Superintendência da PF em Brasília. Constrangimento Nas seis reuniões de negociação, os sem-terra chegaram a questionar o ouvidor sobre o que aconteceria se a promessa não fosse cumprida. Deixou claro que pediria demissão imediatamente. Cumpriu a sua palavra, acompanhado da ouvidora-adjunta, ambos estavam no cargo desde 1999 quando foi criada a ouvidoria agrária. "Nós nunca passamos por um constrangimento igual", indignou-se Maria, comentando que a ouvidoria trata de conflitos no campo envolvendo posseiros, índios e garimpeiros, além dos sem-terra. A ouvidora-adjunta garantiu que desde as 16 horas do sábado até às 3 horas da madrugada de hoje, quando selaram o acordo com os sem-terra para a desocupação da fazenda, houve consultas hierárquicas a todos os envolvidos no processo. As informações eram repassadas ao ministro do Desenvolvimento Agrário, Raul Jungmann, que estava em Buritis, ao secretário-executivo do ministério, José Abrão, e, também, à Polícia Federal que recebia as orientações do Planalto. Depredação O diretor-geral da PF, Agílio Monteiro Filho, também sabia do acordo com os sem-terra, garante Maria de Oliveira. Mas fontes da PF, no entanto, asseguram que em nenhum momento se condicionou a desocupação pacífica à não prisão dos sem-terra. "Não houve nenhuma negociação para que a prisão não fosse realizada. Depois da reintegração de posse, esse era o caminho normal que teríamos de cumprir", afirmou a fonte, alegando que houve danos à propriedade: depredação da casa do capataz e de uma colhedeira e dois tratores, além de uma janela quebrada na sede da fazenda. "Desde o princípio, a posição da PF era de fazer a prisão das lideranças e realizar as vistorias, como aconteceu", revelou essa fonte. Quando a PF anunciou a prisão, Gersino e Maria não reagiram. "Nós nos sentimos acuados e perplexos, assim como os trabalhadores", desabafou Maria de Oliveira. Segundo ela, não houve oportunidade para qualquer reação diante do aparato do Exército, da Polícia Federal e Corpo de Bombeiros que cercava os sem-terra. "Os sem-terra estavam emocionalmente despreparados a uma ordem de prisão, em função da promessa da ouvidoria", lamentou.

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