Na última coluna, escrevi que caberia ao general Augusto Heleno a tarefa de colocar ordem na cozinha do governo Jair Bolsonaro. Pobre general, com sua missão inglória. Não bastasse ter de apagar as chamas dos fogões, precisa fingir que o feijão não queimou quando todo mundo sente o cheiro à distância.
Foi o que fez no episódio de outra mancada de Bolsonaro, desta vez quanto à (real ou hipotética) base militar dos EUA no Brasil: disse que fizeram um “auê” e que Bolsonaro não entendia de onde tinha surgido o assunto.
Como assim? Na entrevista ao SBT semana passada, questionado diretamente a esse respeito, o presidente disse que a cooperação com os Estados Unidos, além de comercial, “pode ser bélica” e abriu a possibilidade de se discutir isso.
O chanceler Ernesto Araújo foi além, e, em Lima, confirmou a possibilidade. “Não haveria problema na questão de uma presença desse tipo.”
Já o secretário de Estado americano, Mike Pompeo, disse textualmente a Eliane Cantanhêde que os EUA ficaram muito satisfeitos com a “oferta” do presidente Bolsonaro.
Resta a pergunta: quem foram os responsáveis pelo “auê”? O presidente e o chanceler, que, no afã de agradar aos Estados Unidos, meteram os pés pelas mãos e causaram uma reação alarmada nas Forças Armadas – como Heleno bem sabe e tratou de contornar, assim como o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, que disse não ver “razão” para uma base americana em solo brasileiro.
A razão? O “auê” ideológico de sempre do presidente com o tal risco socialista. Afinal, foi esse o caminho tortuoso do raciocínio de Bolsonaro na entrevista ao SBT, ao analisar a possibilidade de uma base russa na Venezuela. “Nós das Forças Armadas somos o último obstáculo para o socialismo”, se empolgou.
Bolsonaro, Araújo e Pompeo comungam da ideia de uma união de EUA e Brasil para “tornar o mundo um lugar mais seguro”, como disse o auxiliar de Donald Trump. Os militares, com os pés firmes no chão, estão de cabelo em pé com essas maquinações, ainda que Heleno tente bancar o blasé.
DIREITA CINDIDA? Apoio a Bolsonaro sofre primeiros abalos nas redes Os grupos de WhatsApp, as páginas pró-Bolsonaro nas redes sociais e os perfis que alimentam o culto ao capitão no Twitter sofreram os primeiros abalos no apoio monolítico após os primeiros dias de governo. O monitoramento das redes mostrou que a primeira controvérsia a causar estrago foi a decisão do PSL de apoiar a reeleição de Rodrigo Maia na eleição da Câmara dos Deputados. O fato foi bem explorado pelo MBL (Movimento Brasil Livre), que fincou pé na candidatura (que o próprio movimento sabe que é só para marcar posição) de Kim Kataguiri.
A adesão de nomes estrelados do PSL, como a deputada estadual eleita Janaina Paschoal, que explicitou o desconforto com o apoio a Maia, serviu para mover os canhões da crítica contra a ala mais midiática da bancada federal. A nomeação de Murilo Resende para coordenar o Enem foi outro foco de cizânia na direita, de novo regida pelo MBL – que já recebeu recados dos bolsonaristas para que pare de dividir a o campo conservador.
2020 JÁ CHEGOU Bruno Covas marca posição diante de avanço de Meirelles A decisão de nomear para a Secretaria Municipal de Educação um desafeto de João Doria Jr. foi o marco simbólico de independência de Bruno Covas em São Paulo. Foi um aviso de que seu governo começou para valer e, principalmente, que ele não aceitará “surpresas” vindas do Palácio dos Bandeirantes na sucessão de 2020, em que disputará a reeleição.
Incomodou Covas, de acordo com aliados do prefeito, o espaço dado por Doria a Henrique Meirelles, que sabidamente tem pretensões políticas. Interlocutores de Covas dizem não ver problema na nomeação do amigo João Cury, expulso do PSDB por apoiar Márcio França – e cuja gestão foi criticada na chegada pelos auxiliares de Doria –, quando o próprio governador designou como principal secretário justamente Meirelles, que disputou a Presidência contra o tucano e ex-padrinho Geraldo Alckmin. Recado mais claro impossível: cada um no seu quadrado, no PSDB e nos próximos projetos políticos.
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