Jair Bolsonaro perdeu em boa parte para si mesmo as eleições de 2022 e, a julgar pelo que está acontecendo na capital paulista, sua figura e influência políticas sofrem acelerado processo de erosão. O curioso é que o potencial de votos “antissistema” em geral e o “de direita” (como se queira chamar isso) em particular aumentou desde a derrota de Bolsonaro.
Em São Paulo, o óbvio “herdeiro” é Pablo Marçal. Não importam as diferenças entre cada um: esses personagens de meteórica ascensão trafegam no mesmo “filão”. Asseguram que são capazes de mudar para melhor a vida de cada um “arrebentando” com “isso que está aí”.
As lições trazidas por Bolsonaro, e que aparentemente Marçal ainda não assimilou, é que a parte mais fácil da trajetória política é surfar a onda dos sentimentos gerais de angústia e impotência diante, por exemplo, da percebida mão de ferro do STF, da Receita, da burocracia, agravadas pelo medo gerado por questões de segurança pública e o dia a dia travado, sobretudo de empreendedores.
“Acabar com o que está aí”, porém, pode ser coisa muito diferente dependendo do setor. E a grande dificuldade de “ondas disruptivas”, como as de Bolsonaro antes e Marçal agora, é definir claramente seu eixo de ação e, portanto, seus objetivos estratégicos — além da óbvia conquista do poder. Bolsonaro nem sequer criou uma estrutura razoavelmente hierarquizada, o que espelha fielmente a falência de partidos políticos no Brasil.
Ocorre que essas agremiações são essenciais para se governar no sistema brasileiro que ainda perdura. Conforme o próprio Bolsonaro demonstrou, revelou-se uma ilusão fatal supor que o personagem “conectado com os anseios populares” trafegue como quiser no semipresidencialismo jabuticaba, acrescido do STF.
Leia também
O que se possa chamar de “voto de direita” – e não só o voto “antissistema” – padece, em primeiro lugar, da falta de partidos com definido propósito ideológico. Resultado direto do fato de que no Brasil inexiste uma clara definição do que é “ser conservador” ou “liberal conservador”. Portanto, de agendas prioritárias além de chavões como “diminuir o tamanho do Estado”.
O momento político da onda antissistêmica e que engloba “a direita” vai dependendo de várias agremiações ou representações setoriais que não são unidas. Sem capacidade até aqui de conduzir alianças – e consensos –, especialmente num ambiente de alto fracionamento, como é o do Legislativo, e de enorme bagunça institucional.
Num universo eleitoral tão amplo cabem várias figuras de ponta, o que já se antevê para 2026. O problema é quando só uma delas acha que é dona da agenda.