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Quer começar a fazer terapia? Veja como escolher o profissional ideal e a linha terapêutica

Conexão e acolhimento são alguns dos aspectos fundamentais a serem considerados, afirmam especialistas

Por Fernanda Bassette

Não importa se você está passando por uma crise pontual, como um momento de luto ou uma mudança de emprego; se foi diagnosticado com algum transtorno de saúde mental, como ansiedade ou pânico; ou ainda se quer apenas desenvolver o autoconhecimento. Na prática, todas essas situações são desafiadoras e há momentos em que não sabemos como lidar com elas. É nessa hora que a terapia pode fazer a diferença e ajudar a encontrar o melhor caminho. Mas como escolher o profissional e a abordagem terapêutica ideais?

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“Decidir começar a terapia é um passo corajoso e compassivo em direção ao autoaperfeiçoamento. Envolve se responsabilizar e se permitir ter um espaço para discutir questões pessoais importantes. Escolher o terapeuta certo é crucial, e o fator mais importante nessa decisão é a conexão terapêutica entre você e o terapeuta”, diz ao Estadão o psicoterapeuta londrino Joshua Fletcher, autor do livro E como você se sente em relação a isso? Tudo o que você sempre (nunca) quis saber sobre terapia, recém-lançado no Brasil pela editora Sextante.

Um dos conselhos de Fletcher é que não é preciso se contentar com o primeiro terapeuta que encontrar – a menos que aconteça um verdadeiro “match” entre vocês dois. “É essencial garantir que haja uma conexão e que a pessoa se sinta segura e confortável com o terapeuta, pois estará compartilhando com ele alguns aspectos vulneráveis de si mesmo no que, às vezes, pode ser um ambiente desafiador”, ressalta o profissional.

Conexão entre paciente e terapeuta é fundamental para o sucesso da terapia Foto: Yurii Maslak/Adobe Stock

O psicólogo Rodrigo Acioli Moura, conselheiro do Conselho Federal de Psicologia, estende o raciocínio de Fletcher à escolha da abordagem terapêutica – existem centenas de linhas possíveis, algumas mais tradicionais e conhecidas, como a terapia cognitivo-comportamental, e outras menos populares, que surgem como variações das anteriores.

“Não existe melhor linha terapêutica. O que existe é ‘o/a’ terapeuta. O tipo de abordagem é a lente que aquele terapeuta vai usar sobre aquela pessoa. É a ferramenta de trabalho com a qual aquele profissional se identifica e conseguirá trabalhar melhor”, afirma Moura, destacando que, independentemente da linha, o objetivo é o mesmo: ajudar o paciente a melhorar sua qualidade de vida e a sua saúde mental.

O psicólogo Rafael Brito, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, também reforça que não existe uma abordagem melhor ou pior; a escolha depende do que o paciente entende como melhor para si. “A literatura científica aponta que o elemento comum das terapias, mostrando o que as torna eficazes ou não, é a aliança terapêutica, ou seja, o vínculo que esse profissional gera com o paciente para que ele consiga se abrir e contar seus problemas sem nenhuma inibição e dificuldade”, diz.

Uma dica ao considerar a escolha da abordagem terapêutica é perguntar ao terapeuta sobre seu treinamento, orientam os especialistas. Um bom profissional reservará algum tempo para explicar seus métodos e, se necessário, vai encaminhá-lo a um colega mais experiente para lidar com o problema que você está enfrentando.

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“Por exemplo, se você estiver lidando com um transtorno de ansiedade ou ataques de pânico, você pode considerar consultar um terapeuta cognitivo-comportamental. Por outro lado, se você estiver lidando com o luto, você pode preferir um conselheiro ou terapeuta especializado em aconselhamento de luto. No final das contas, depende de suas necessidades específicas, mas é sempre valioso ter uma conversa inicial com o terapeuta para ver se parece a opção certa para você”, explica Fletcher.

Entre as centenas de abordagens terapêuticas, algumas se destacam. São elas:

Psicanálise

Talvez seja a abordagem mais conhecida devido à fama de seu fundador, Sigmund Freud. Parte do entendimento de que a mente é dividida em instâncias conscientes e inconscientes e que os conteúdos que fazem parte do inconsciente influenciam os comportamentos cotidianos, podendo causar sintomas como ansiedade ou dificuldade de relacionamento, por exemplo.

“A grande questão é que a gente não conhece esses conteúdos e é preciso trabalhá-los para primeiro conhecê-los e, depois, conseguir integrá-los na personalidade do paciente de uma maneira que eles não tenham mais esse poder sobre a pessoa”, explica Brito.

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Na forma mais clássica, usa-se o divã e o paciente fica de costas para o terapeuta para evitar que a troca de olhares iniba a pessoa de acessar determinados espaços da mente e lembranças mais longínquas de seu passado. Mas, hoje em dia, nem todo psicanalista trabalha assim – há profissionais que entendem que a conexão visual é importante para uma leitura da linguagem corporal e das reações do paciente.

Vale destacar que, recentemente, um livro publicado pela microbiologista Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC), e pelo jornalista científico Carlos Orsi, diretor da mesma instituição, levantou uma discussão sobre a eficácia da psicanálise. Na obra, intitulada Que bobagem! pseudociências e outros absurdos que não merecem ser levados a sério (Editora Contexto), eles defendem que a psicanálise é uma prática que não tem respaldo científico para o tratamento psicológico de pessoas. Como mostrou reportagem do Estadão, esse debate não é novo e há divergências de entendimento mesmo entre os psicanalistas.

Terapia cognitivo-comportamental (TCC)

Trata-se de outra abordagem bastante conhecida e com objetivos terapêuticos bem estabelecidos na literatura científica. Ela compreende a mente como um produto de interconexão de pensamentos, cognição, crenças e emoções. A ideia é que essa interconexão, a depender de como é estruturada, pode gerar comportamentos que podem ser patológicos para a pessoa.

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A proposta da TCC é ajudar o paciente a achar soluções mais adequadas para seus problemas, por meio de conversas diretas com o terapeuta – olho no olho. “Nas sessões, trabalhamos esses comportamentos patológicos para que se tornem mais adaptativos para a vida daquela pessoa”, explica Brito.

Gestalt

Faz parte das abordagens mais humanistas, que priorizam as interpretações pessoais dos diferentes fenômenos. Parte da premissa de que o ser humano tem a capacidade de escolher, sendo o responsável por sua história. “É centrada na experiência da própria pessoa na busca por maior sentido, por integração das coisas da vida com maior autenticidade”, diz.

Tende a focar mais nas demandas “aqui e agora” em detrimento do passado, com a intenção de aumentar a consciência a respeito das diferentes sensações, emoções e comportamentos dos pacientes.

Analítica

Tem uma abordagem muito semelhante à psicanálise e também parte da premissa de que a mente é dividida em instâncias conscientes e inconscientes. A diferença é que ela trabalha com a ideia de que existe um inconsciente coletivo e que as grandes questões da humanidade estão inscritas em todos os seres humanos.

“Essa abordagem trabalha os diversos padrões de figuras e sentimentos que todos os humanos têm. Trabalha o arquétipo da sombra, da mãe, do sábio, figuras que habitam em nós”, diz Brito.

A psicologia analítica também considera os mitos, símbolos e narrativas sociais, reconhecendo a importância que os fatores culturais exercem sobre a experiência humana.

Psicodrama

É a linha menos usual e trabalha questões da psiquê através de ações. Usa técnicas de dramatização de situações da vida, com interpretação de papéis, para provocar reflexões que ajudem a pessoa a entender seus comportamentos e/ou emoções em cada situação.

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Como em uma peça de teatro, a ideia é trabalhar a expressão corporal, linguagem verbal e fazer encenações vivendo diferentes papeis – existem vários grupos que fazem trabalhos de psicodrama.

“O paciente traz uma situação da vida e experimenta diferentes papeis e outros modos de vê-los na mesma cena. Com isso, seria possível integrar mais possibilidades e repertórios para a solução de problemas”, afirma Brito.

Pode ser que não funcione

Mesmo que você esteja diante do melhor profissional, talvez a terapia não funcione e nem evolua da forma como esperava. E não há nenhum problema em decidir mudar de profissional. Os especialistas ressaltam, entretanto, que é muito difícil estipular um tempo mínimo para essa percepção – não pode ser muito pouco, porque talvez não tenha dado tempo de o vínculo ser criado, nem pode demorar demais, senão o paciente vai insistir em algo que não está funcionando.

“Tanto o profissional quanto o paciente podem entender que o processo não está funcionando. Costumamos pensar em um período de dois a três meses, algo em torno de oito a 12 sessões para avaliar se aquele trabalho está fazendo algum sentido ou não”, diz Brito.

Alguns sinais importantes são:

  • Falta de compreensão e confiança: se você se sente incompreendido pelo terapeuta ou não se sente totalmente acolhido, esse pode ser um sinal de que o relacionamento terapêutico não é tão eficaz quanto deveria ser.
  • Progresso estagnado: depois de um tempo considerável na terapia, se você achar que não está sendo ouvido como deveria e não notar nenhuma progressão, pode ser hora de refletir se essa abordagem ainda é realmente benéfica para você.
  • Sentir-se pior: embora seja normal que as coisas às vezes pareçam piores antes de melhorarem, uma falta prolongada de melhora pode indicar que a terapia não é eficaz.
  • Esconder ou mentir: se você sente a necessidade de esconder partes de si mesmo ou mentir para seu terapeuta, isso pode atrapalhar o processo terapêutico. Um relacionamento terapêutico forte deve permitir abertura e honestidade.
  • Falta de segurança e conforto: sentir-se seguro e confortável é crucial na terapia. Se você não se sente assim, pode ser um sinal de que o terapeuta não está atendendo às suas necessidades de empatia e consideração positiva incondicional.
  • Limitações da abordagem: às vezes, a abordagem terapêutica em si pode ter limitações. Se você sente que atingiu uma parede, explorar abordagens alternativas pode oferecer novos insights e progresso.

“Às vezes, a terapia não funciona devido a uma incompatibilidade entre o paciente e o terapeuta, ou entre o problema e a orientação teórica do terapeuta. Isso não é necessariamente um reflexo da habilidade ou competência do terapeuta, mas sim uma questão de encontrar o par certo”, diz um trecho do livro de Fletcher.

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Moura, do CFP, também enfatiza a importância de escolher um profissional qualificado para garantir a segurança e a qualidade do atendimento. De acordo com o Censo da Psicologia, realizado pelo CFP em 2022, há mais de 500 mil psicólogos em atuação no Brasil e 80% deles trabalham com psicoterapia de alguma maneira. O número de profissionais que se cadastraram para fazer atendimento online, por exemplo, aumentou 600% depois da pandemia de covid-19. Ou seja: oferta de profissionais não falta, mesmo que não haja um pertinho de você.

“A pandemia quebrou o tabu em torno da terapia. O assunto saúde mental passou a ser mais valorizado, ao lado da importância da atividade física. Podemos falar de atividades terapêuticas, por exemplo, que trazem boas sensações para a pessoa. Correr, pintar, tocar um instrumento, bordar são situações que trazem uma boa sensação e bem-estar. Mas fazer psicoterapia é algo mais técnico e que deve ser acompanhado por profissionais devidamente qualificados”, finaliza.

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