Dilma é reeleita em disputa apertada e acena com diálogo, mas cenário à frente é difícil

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Por ALEXANDRE CAVERNI E CESAR BIANCONI
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Reeleita neste domingo com o eleitorado mais dividido desde a redemocratização do país, a presidente Dilma Rousseff (PT) procurou em seu pronunciamento logo após o resultado das urnas fazer um gesto ao lado derrotado dizendo que o primeiro compromisso de seu novo mandato será o diálogo. Em um curto e elegante discurso de reconhecimento da derrota, Aécio Neves (PSDB) foi na mesma linha. Mas considerando o grau de radicalização da campanha do segundo turno, o cenário político à frente vai precisar mais do que gestos e acenos para se evitar uma turbulência normalmente não vista em inícios de mandatos. "Minhas primeiras palavras são, portanto, de chamamento de base e união", disse Dilma em um hotel em Brasília. "Nas democracias maduras, união não significa necessariamente unidade de ideias nem ação monolítica conjunta, pressupõe, em primeiro lugar, abertura e disposição para o diálogo." "Esta presidente aqui está disposta ao diálogo, é esse meu primeiro compromisso do segundo mandato: diálogo", acrescentou. Falando um pouco antes em um hotel de Belo Horizonte, Aécio disse que unir o país deve ser a prioridade. "Cumprimentei agora há pouco por telefone a presidente reeleita e desejei a ela sucesso na condução do seu próximo governo, e ressaltei: considero que a maior de todas as prioridades deve ser unir o Brasil em torno de um projeto honrado e que dignifique a todos", disse o tucano. Até a véspera Aécio falava em "libertar" o país do PT, acusava a presidente de ter fracassado em todas as áreas, especialmente na economia, e dizia que a única forma de acabar com a corrupção do governo era tirar os petistas dele. Dilma, por sua vez, dizia que o senador mineiro representava uma forma de governar que trazia desemprego e arrocho salarial e que, se eleito, os programas e as conquistas sociais dos 12 anos de governos petistas poderiam ser perdidos pela população. Os ataques mútuos dos dois candidatos se espalharam, especialmente nas redes sociais, muitas vezes alimentados pelo noticiário sobre as denúncias de corrupção na Petrobras. O ápice das denúncias sobre um suposto esquema de sobrepreços de contratos da estatal para alimentar partidos e políticos governistas foi reportagem da revista Veja desta semana, que trouxe o que seria uma declaração do doleiro Alberto Youssef de que tanto Dilma como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva saberiam de tudo, o que foi rebatido com veemência. No final, Dilma venceu com 51,6 por cento dos votos válidos, contra 48,4 por cento de Aécio. O placar foi mais apertado até do que o da eleição de 1989, quando Fernando Collor de Mello (PRN) derrotou Lula por 53,03 a 46,97 por cento. Em milhões de voto, os 54,5 milhões de votos obtidos por Dilma foram um pouco menos do que os obtidos por ela no segundo turno da eleição de 2010. Mas, além do triunfo geral, ainda que apertado, a presidente também conseguiu uma vitória simbólica importante: derrotou o tucano em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país, Estado natal de ambos, mas base política dele, onde foi governador entre 2003 e 2010. Ela já tinha sido vitoriosa no Estado no primeiro turno e fez disso uma de suas principais peças de artilharia contra o adversário, com a campanha petista batendo na tecla de que quem conhecia Aécio, não votava nele. O placar do segundo turno lá foi 52,4 a 47,6 por cento dos votos válidos. Mas o tucano massacrou a presidente em São Paulo, maior colégio eleitoral do país, por 64,3 a 35,7 por cento, uma diferença de 6,8 milhões de votos. Em termos percentuais, o Estado onde Aécio conseguiu sua maior vitória foi Santa Catarina (65,6 a 35,4 por cento), enquanto para Dilma isso se deu no Maranhão (78,8 a 21,2 por cento). Mas Dilma ganhou também no terceiro maior colégio eleitoral, Rio de Janeiro, por 54,9 a 45,1 por cento.

PROBLEMAS À VISTA

O placar apertado da eleição será um complicador político para o convívio com uma base parlamentar que já deu muito trabalho no primeiro mandato, mesmo quando a popularidade da presidente era bastante alta.

Sem contar que a oposição promete ser muito mais ativa do que foi até agora nos governos petistas.

"Em 2010, nós tivemos 44 (milhões de votos), agora tivemos 50 (milhões), isso mostra a força do nosso partido e inclusive a capacidade de fazer a pauta das coisas que são fundamentais para o país", disse o senador eleito por São Paulo, José Serra. "Uma oposição pode fazer uma grande contribuição ao Brasil se souber criticar o que está errado e souber propor."

O senador José Agripino (DEM-RN), coordenador da campanha derrotada, foi além e disse que o novo governo Dilma começa "em contagem regressiva". Isso num cenário em que a oposição tem no próprio Aécio um forte nome natural para a disputa de 2018.

Neste quadro, a presidente voltou a defender na noite de domingo uma reforma política.

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"Meu compromisso, como ficou claro durante toda a campanha, é deflagrar esta reforma que é responsabilidade constitucional do Congresso e que deve mobilizar a sociedade em um plebiscito, por meio de uma consulta popular", disse.

Ao mesmo tempo em que terá uma batalha complicada no front político, a presidente enfrentará desafios muito difíceis no campo econômico.

A inflação teima em flertar com o teto da meta de 4,5 por cento com 2 pontos percentuais de tolerância, as contas fiscais têm apresentado resultados cada vez piores e as transações correntes vêm registrando déficits crescentes. E a cada mês diminui o número de postos de trabalho formais criados, uma das jóias da coroa da administração petista.

Além disso, Dilma não contará com a boa vontade dos mercados financeiros, que preferiam Aécio e as políticas defendidas por ele, num cenário em que todos os analistas consideram que 2015 será um ano dificílimo no lado econômico. A presidente sabe disso.

"Vamos dar mais impulso à atividade econômica em todos os setores, em especial no setor industrial", disse Dilma em seu pronunciamento. "Quero a parceria de todos os segmentos, setores, áreas produtivas e financeiras, nessa tarefa que é responsabilidade de cada um de nós brasileiros e brasileiras."

As chances de seu novo governo ser bem-sucedido dependerão da equipe que montar, dos sinais que emitir para empresários e políticos e das medidas que adotar nos próximos meses.

(Reportagem adicional de Jeferson Ribeiro, em Brasília, e Eduardo Simões, em Belo Horizonte)

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