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Cine Ceará 2021 espelhou o estado do Brasil e do mundo com ruínas nas telas

O júri oficial outorgou troféu Mucuripi de melhor filme a '5 Casas', de Bruno Gularte Barreto

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

FORTALEZA - São mais de 30 anos de história. O Cine Ceará chegou à sua 31ª edição comemorando o retorno ao presencial. As sessões ocorreram entre 27 de novembro e 3 de dezembro no magnífico Cine São Luiz, na praça central da cidade – a do Ferreira –, e no Instituto Dragão do Mar. Com direção-geral de Wolney Oliveira e curadoria de Margarita Hernández, a seleção baseou-se em dois pontos, como ele explicou ao Estadão – qualidade e ineditismo. O mais interessante é que essa seleção terminou privilegiando um terceiro ponto importante. O Cine Ceará de 2021 espelhou o estado do Brasil e do mundo. Curtas e longas colocaram ruínas na tela. Mares revoltos, casas destroçadas, ruínas humanas. Mas, como todo mundo sabe que o fim pode ser um começo, ou o recomeço, foi o que se viu em Fortaleza. 

Cine Ceará 2021 foi realizado entre 27 de novembro e 3 de dezembro e trouxe o longa '5 Casas', de Bruno Gularte Barreto, como destaque Foto: Cine Ceará/Divulgação/YouTube

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Houve um punhado de longas que, por si só, garantiram a relevância do evento. Longas como 5 Casas, de Bruno Gularte Barreto, Bosco, de Alicia Cano Menoni, A Praia do Fim do Mundo, de Petrus Cariry, Fortaleza Hotel, de Armando Praça e, na competição Olhar do Ceará, o belíssimo Minas Urbanas, de Natália Gondim. Dividiram os troféus Mucuripi. Da competição de curtas, emergiu Chão de Fábrica, de Nina Kopko. A cerimônia de premiação foi na sexta, 3, à noite, seguida da exibição de O Marinheiro das Montanhas, de Karim Aïnouz. Em 2019, na que havia sido a última edição presencial do evento, Karim mostrou A Vida Invisível. Foi uma apoteose. Repetiu-se com O Marinheiro, só que agora ele não estava presente. Karim trabalha no próximo filme, na Inglaterra. 

5 Casas é um ensaio – autodocumentário, nas bordas – de um diretor que escava na memória para honrar seus entes queridos. Bosco é sobre uma diretora que parte em busca de suas origens familiares na Itália. Pensava em quatro ou cinco dias de entrevistas – o projeto tomou-lhe mais de dez anos de vida. A Praia do Fim do Mundo é dobre mãe e filha numa casa que está sendo erodida pelo mar. A filha está grávida. De alguma forma o filme revisita o mito de Jonas e a baleia, Jonas que terá 25 anos em 2046. Budapeste Hotel é sobre sororidade, uma mãe que tenta salvar a filha e sua ligação com uma sulcoreana que veio ao Brasil para enterrar o marido. 

Minas Urbanas dá voz a garotas da periferia. Chão de Fábrica viaja no tempo, ao período das grandes greves do ABC, em 1979. Operárias reúnem-se no banheiro das mulheres no período do almoço. Falam sobre a greve e sobre assuntos mais íntimos, comentam esse tal de Lula, dirigente sindical que está mobilizando as massas. O júri da crítica premiou o filme de Petrus. O júri oficial, integrado, entre outros, pelos cineastas Lírio Ferreira e Vicente Amorim, fez a coisa certa. Outorgou o Mucuripi de melhor filme a 5 Casas e o prêmio de direção à uruguaia Mina. O festival íbero-americano, na verdade, foi latino-americano. Dessa vez não houve concorrentes da Península Ibérica. 

O gran finale desse encontro para discutir – e celebrar – arte e vida por meio do cinema veio por meio de um prêmio especial – Eusélio Oliveira – que o festival outorgou ao governador do Ceará, Camilo Santana, do PT. Na contramão do desprezo do Governo Federal pela cultura, Camilo tem se pautado pela valorização do setor. No palco, a presença do veterano Rosemberg Cariry, pai de Petrus e figura histórica do cinema cearense, representou o aval da categoria. Das ruínas emerge o que promete ser uma nova era. 

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