Zack Snyder quer transformar ‘Rebel Moon’ em nova franquia à la ‘Star Wars’: ‘Pura fantasia’

Diretor e elenco da nova saga da Netflix conversam com o ‘Estadão’ sobre o processo de produção, mensagens que o filme carrega e oportunidades abertas pelos personagens

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Foto do author Simião  Castro
Por Simião Castro

Construir uma mitologia do zero nunca é fácil. Mas o cineasta Zack Snyder não partiu exatamente do nada ao escrever o novo projeto. Assim, a primeira parte de Rebel Moon chega em 22 de dezembro à Netflix, cheia da estética e referências a filmes de aventura espacial do passado, mas discutindo temas muito contemporâneos.

Rebel Moon não apenas é inspirado em Star Wars, como foi pensado para ser um dos diversos capítulos da saga que nasceram nos últimos anos — o que é largamente admitido por Snyder. “Star Wars me fez querer fazer filmes”, diz o diretor em entrevista ao Estadão.

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Mas aí veio a Disney e jogou areia nos planos. Comprou a odisseia da Lucasfilm, do criador George Lucas, e não curtiu o rumo que o diretor de Liga da Justiça queria dar para essa história, o que acabou emperrando o processo. Ou liberando o diretor para fazer o que quisesse do próprio sci fi.

Antes mesmo de estrear para um público geral, Rebel Moon já tem cortes do diretor prometidos para ser, digamos, menos adequados para qualquer audiência. Criado assistindo a produções de classificação indicativa livre, como Conan, o Bárbaro e Excalibur, Snyder junta à lista de inspirações a revista de quadrinhos adultos de ficção científica e fantasia Heavy Metal.

O cineasta Zack Snyder dirige Charlie Hunnam como Kai e Ray Porter como Hickman no set de 'Rebel Moon' Foto: Chris Strother/Netflix

Mas sobre o que é Rebel Moon?

Numa galáxia muito, muito distante... Corta. Isso é do outro filme. Ação: numa lua nos confins do universo, chamada Veldt, uma jovem guarda um passado misterioso. Ela é Kora, interpretada por Sofia Boutella.

Após o assassinato do grande rei que governava esse império intergaláctico, sobe ao poder o tirânico regente Balisarius (Fra Fee), que tem no Almirante Atticus Noble (Ed Skrein) um leal e cruel pau mandado.

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Noble representa uma ameaça para o povo humilde e agricultor de Veldt, onde Kora vive. E ela se vê forçada a lutar contra o abuso dos poderosos para proteger a gente que a acolheu de braços abertos. Sai então pelo espaço em busca de rebeldes para ajudar na causa. E faz alianças para assegurar a sobrevivência dessa vila.

Sofia Boutella é Kora em 'Rebel Moon' Foto: CLAY ENOS/NETFLIX

Heroína talentosa e complexa

Na pele de Kora, Sofia vira uma guerreira incansável, que demonstra habilidades muito além do talento para arar a terra. E fica numa posição nem sempre privilegiada em filmes deste tipo, como a líder destemida em que todos confiam. Mas que também tem um passado obscuro e complexo.

“Eu honestamente não subestimo o devido valor disso”, diz a atriz ao Estadão. “Você simplesmente não vê uma mulher sendo colocada nessa posição, tendo essa força, precisando defender [um povo] e sendo a protagonista de um filme [como esse]. Acho que isso é importante”, completa.

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E ela traz mais um elemento que muitas vezes penaliza as mulheres no cinema — mas não neste caso: “Sou grata ao Zack por ter me dado essa chance. Não apenas porque sou mulher, mas também porque eu tinha 40 anos na época [das filmagens], e em nenhum momento senti que houve qualquer hesitação. Mas sinto que [isso] é simplesmente raro”.

Sofia Boutella, como Kora em 'Rebel Moon', precisa lutar para defender o povo que a acolheu na Lua Veldt Foto: Clay Enos/Netflix

“Fantasia é um negócio complicado”

Os atores elogiam a liberdade que Snyder deu a eles para participarem da construção do aspecto humano da narrativa, enquanto cuida do contexto mais amplo, de construir o cenário mitológico.

Ao menos é assim que Ed Skrein, que faz o impiedoso vilão da história, define a maneira do diretor trabalhar e conduzir as gravações. “Mesmo que ele pareça relaxado e flexível no set, está atingindo esse equilíbrio perfeitamente. E sou grato por isso”, conta o ator.

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Esse clima descontraído é corroborado por Ray Fisher, intérprete do líder rebelde Darrian Bloodaxe. É ao grupo dele que Kora recorre atrás de ajuda para Veldt quando Noble chega sem misericórdia.

“Essa energia [extrovertida] transborda direto do topo. É a maneira como Debbie [Deborah Snyder, produtora e mulher do cineasta], Zack e Wes [Collerm, produtor] sempre conduziram os sets. É como ir para um acampamento de verão, você que vai ser uma experiência legal”, revela o ator.

Ray Fisher como Darien Bloodaxe em 'Rebel Moon' Foto: Clay Enos/Netflix

Zack indica o motivo. Embora goste de ficção científica com o pé na realidade, do tipo que sugere algo que pudesse acontecer de verdade, não era essa a história que gostaria de contar. Interessa-lhe a fantasia pura. Para isso, ele precisa de bons atores. E motivados. “Fantasia é um negócio complicado”, afirma.

“Isso é pura fantasia científica, pois é tudo mitológico, tudo simbólico. Você precisa que os personagens e os atores a representem da maneira mais realista possível, porque você está exigindo muito mais [da imaginação] do público do que em um documentário sobre ir à Lua”, explica o diretor.

Talvez por isso deixe um tanto da trama escondida e subentendida nas ações das personagens. O que conta mais são as vivências deles e é visível a complexidade nos passados de cada um.

“O que é muito especial em um projeto como esse é que Zack dedica o tempo dele a realmente mergulhar nos antecedentes desses personagens. E, se não chegarmos a todos eles na primeira parte, talvez descubramos na segunda parte. Veremos”, instiga Michiel Huisman, que faz o braço direito de Kora, Gunnar.

Doona Bae como Nemesis (ao fundo) e Michiel Huisman como Gunnar (à frente) em cena de 'Rebel Moon' Foto: Clay Enos/Netflix

“Eu tenho a oportunidade de pintar com um pincel bem grosso e esses caras têm que pintar com um pincel bem fininho o tempo todo. Eles fazem um trabalho incrível de manter o pé no chão e trazem realidade para os momentos de forma que o encanto não caia. Mas é ótimo para mim, porque eu estou fazendo um conto de fadas e eles têm de vivê-lo”, elogia Snyder.

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Pelo tempo que levou desde a oferta da história ao universo Star Wars, ao redor de 2012, além do período em que os personagem viveram apenas na cabeça do diretor, é fácil perceber que esse não é um projeto recente. Snyder pensa nele há ao menos 20 anos.

Com uma segunda parte já garantida para 19 de abril de 2024, pergunto se tudo termina por aí. Afinal, pode-se dizer que já são duas décadas na produção desse novo mundo. “Temos história para ir um tanto mais longe. Vinte anos produzindo, vinte anos gravando, eu espero”, ri o cineasta.

Ed completa que o universo ficcional já é fantástico por natureza, e o que torna um filme assim convincente para o público é a conexão com as pessoas. “Eu e Sofia estamos apenas tentando fundamentar isso em emoções humanas reais. Ao contracenar com os outros atores, é claro que há um alienígena ali, ou uma arma do tamanho do meu carro ao meu lado, mas no fim é sobre emoções humanas”, compartilha.

Ed Skrein é o implacável Atticus Noble em 'Rebel Moon' Foto: Justin Lubin/Netflix

Fantasia com o pé na realidade

Humanas são também as questões e mensagens que o filme levanta. E são muitas. O principal conflito da história é motivado pelo interesse da “capital”, o chamado Mundo-Mãe, em grãos e alimentos para as tropas militares. E por isso a invasão a Veldt.

A escassez de recursos é uma coincidência conveniente e nada acidental entre o filme e a realidade. E a mensagem de cunho social foi o que atraiu o ator Djimon Hounsou para interpretar General Titus.

Ele ressalta que o filme foi escrito de forma épica, mas que o sentido da história é bastante trivial: o da responsabilidade coletiva. Para ele, Rebel Moon é sobre a nossa falta de cuidado com o planeta. E que um filme como esse pode mudar o mundo.

“Se você conseguir captar e entender a mensagem, com certeza. E, é claro, é obrigação de cada um de nós garantir que deixaremos este lugar em boas mãos para nossos filhos”, alerta o ator em entrevista ao Estadão.

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E. Duffy interpreta Milius e Ray Fisher vive Darrian Bloodaxe (de costas) em 'Rebel Moon'  Foto: Netflix/Divulgação

A insurreição contra o arbítrio é outro recado deixado pela história, na opinião de Charlie Hunnam, que interpreta Kai. “Há uma mensagem incrível no centro desse filme: de que você abdica da sua responsabilidade por sua conta e risco. Se você permitir complacentemente que as forças negativas deste mundo assumam o controle, será um futuro sombrio para todos nós. Então devemos nos levantar e lutar pelo bem coletivo”, complementa o ator.

Outro ponto que Rebel Moon expressa é das diferentes formas de conexão entre as pessoas. Um componente que faz diferença para E. Duffy, intérprete de Milius, integrante do exército de rebeldes. “Acho que o filme também enfatiza a comunidade, o lar e a família. E é muito legal ver esses conceitos retratados de uma forma tão fantástica”, afirma.

Já Staz Nair, que faz Tarak, observa uma perspectiva mais contemplativa sobre o motivo de sermos compelidos a histórias que se passam fora da Terra. Uma forma de escapar dos problemas. “Porque somos todos sonhadores, românticos. E o que há de mais belo do que imaginar um mundo ainda maior e mais grandioso do que este?”, finaliza.

Criaturas fantáticas também fazem parte do universo de 'Rebel Moon' Foto: Netflix/Divulgação
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