A ministra Damares Alves, da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, engrossou o coro formado por políticos de outros países contra o filme francês Lindinhas (Cuties, em inglês), lançado pela Netflix. Premiado no Festival de Sundance e sem provocar polêmicas quando lançado na França, em agosto, Lindinhas é acusado de sexualizar jovens garotas.
Por meio de sua conta no Facebook, Damares chamou a produção de “abominável”.
No centro da reação, está a ideia de que Lindinhas está perigosa e irresponsavelmente sexualizando meninas pré-adolescentes, o que, ironicamente, é o que o próprio filme critica também. A campanha contra o filme, que inclui pedidos para centenas de milhares de assinantes cancelem suas contas no Netflix, está repleta de imprecisões devido em parte ao fato de que alguns críticos não viram o filme (um afirma que há nudez infantil quando não há).
“Estou brava, Brasil! Estou muito brava! É abominável uma produção como a deste filme. Meninas em posições eróticas e com roupas de dançarinas adultas”, escreveu Damares. “Quero deixar claro que não faremos concessões a nada que erotize ou normalize a pedofilia! Quero aproveitar e dar um recado aos pedófilos que por anos têm vindo ao Brasil abusar de nossas crianças: no Brasil existe um governo que se importa de verdade em proteger as crianças e as famílias.”
A batalha continuou no Twitter, no qual a ministra, respondendo a um usuário que perguntou se ela estava sabendo sobre o filme, afirmou: “Não vamos ficar de braços cruzados. Deixa comigo”.
A Netflix disse em um comunicado que o filme trata de um “comentário social contra a sexualização de crianças pequenas”.
Escrito e dirigido por Maïmouna Doucouré, Lindinhas é sobre uma imigrante senegalesa de 11 anos chamada Amy (Fathia Youssouf), que vive em um subúrbio pobre de Paris com sua família muçulmana praticante. Ela fica fascinada com um grupo de garotas rebeldes de seu colégio, que coreografam danças, usam tops curtos e saltos altos. Elas falam sobre Kim Kardashian e dietas, praticam “twerking” e riem dos meninos, além de tratar de assuntos relacionados ao sexo que elas ainda nem entendem.
No final da semana passada, os senadores republicanos Ted Cruz, do Texas,e Tom Cotton, de Arkansas, pediram ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos que investigasse a produção e distribuição do filme. Cruz, em sua carta ao procurador-geral William Barr, pediu que eles “determinassem se a Netflix, seus executivos ou os indivíduos envolvidos na filmagem e produção de Lindinhas violaram quaisquer leis federais contra a produção e distribuição de pornografia infantil”.
Alguns críticos de cinema dos EUA também avaliaram a polêmica e destacaram os méritos do filme. “Teria sido fácil para Doucouré usar um pincel largo para pintar os diferentes extremos da experiência de Amy (‘sufocar tradição ruim, dançar bem’), mas ela não está exatamente fazendo Footloose aqui,” observou Bilge Ebiri, da New York Magazine. “Lindinhas não traz um discurso rude ou é um conto de advertência, agitando o dedo em qualquer direção – o que é uma razão pela qual qualquer pessoa que assiste ao filme em busca de mensagens claras sobre o certo e o errado está fadada a ficar desapontada, talvez até indignada.”
A cineasta conta que o filme foi inspirado quando ela observou algumas meninas de 11 anos dançando “como costumamos ver em videoclipes”, em uma reunião em Paris, e queria investigar por que essas meninas estavam imitando o comportamento adulto. “Nossas meninas notam que, quanto mais uma mulher é excessivamente sexualizada nas redes sociais, mais ela tem sucesso. As crianças apenas imitam o que veem, tentando alcançar o mesmo resultado sem entender o significado”, disse Doucouré. “É perigoso.” / COM AP
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