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De antena ligada nas HQs, cinema-pipoca, RPG e afins

Três vezes Brasil em Locarno

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Por Rodrigo Fonseca
Atualização:
É NOITE NA AMÉRICA Foto: Estadão

RODRIGO FONSECA Apoiada numa engenharia sonora sofisticada de Chico Bororo, "É Noite Na América" é um exemplar do "cinema poético" - ou etnopoético - da diretora e artista visual Ana Vaz, que leva a Locarno, na mostra Cineasti Del Presente, um estudo sobre catividade. Ela flana por Brasília captando tamanduás, lobos-guará, corujas, cachorros-do-mato, capivaras e toda uma fauna que traduz os desafios da preservação da vida. A partir dessa imersão na Natureza, nas franjas do concreto, ela tece uma trama de perspetivas cruzadas, construindo um diorama ecológico e político sobre a sobrevivência das espécies - num país em crise.

REGRA 34 pode dar a láurea de Melhor Atriz para Sol Miranda Foto: Estadão

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Nesta quarta, Locarno confere um (ousado e necessário) estudo sobre os fantasmas do sexismo e do machismo na sociedade carioca (que vale para todo o Brasil) chamado "Regra 34". A direção é de Julia Murat. O longa concorre ao Leopardo de Ouro e teve uma sólida acolhida em sua sessão de imprensa, onde foi definido (sobretudo pelos jornalistas alemães) como um "gesto de coragem na contramão da filosofia Bolsonaro". Há já uma torcida aqui por prêmios para a atriz Sol Miranda, que dá ao festival suíço uma atuação fina, com farto ferramental dramático na construção de uma figura acossada pelo desejo - um desejo vetorizado por espectros do machismo. Sol vive uma estudante de Direito que embarca em práticas sexuais BDSM (prazer com dor) e encontra da asfixia uma curiosidade que fascina e põe em xeque suas novas formas de curtir sua libido. Mas a cena de um plástico bolha em seu pescoço carrega um simbolismo gigante frente a tempos em que o conservadorismo reina. O entusiasmo da crítica egresso da Alemanha, supracitada, pode ser um reflexo da boa acolhida que o longa anterior de Julia, "Pendular", teve na Berlinale, em 2017. Ela saiu de lá com o Prêmio da Crítica, votado pela Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica (Fipresci). E pode repetir o feito em terras suíças. Mas merece mais.

Igualmente potente, da lavra brasileira, é o curta "Big Bang", de Carlos Segundo, que deu a Locarno seu melhor diálogo. A dado ponto do filme, que segue a rotina de Chico (Giovanni Venturini), um técnico de conserto de fogões, o protagonista, saído de um aciedente, desabafa: "Eu destruo tudo aquilo em que eu entro dentro". A produção concorre na seleção Corti d'Autore, levando esse ensaio existencial sobre a vida de Chico, fincada em Uberlândia, às telas de Locarno.

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