PUBLICIDADE

Espetáculo ‘Outono Inverno’ coloca submissão feminina e opressão na mesa de jantar

Dirigido por Denise Weinberg, peça traz encontro familiar repleto de mágoas e segredos bem guardados

Por Dirceu Alves Jr.

ESPECIAL PARA O ESTADÃO - O dramaturgo sueco Lars Norén (1944-2021) lançou a peça Outono Inverno em 1992. O texto chegou ao Brasil em 2006, dirigido por Eduardo Tolentino de Araujo, em um momento em que os dramas familiares e psicológicos ainda chamavam atenção na cena nacional, hoje dominada pelas temáticas sociais e pautas identitárias.

PUBLICIDADE

Para voltar aos palcos, a história escrita por Norén precisava ressaltar questões que conversassem de forma contundente com o público e ultrapassassem as intenções de um revelador jantar de família. Sob a direção de Denise Weinberg, a montagem que estreou na quinta-feira, 27, no Itaú Cultural, faz uma desconstrução do original. O espetáculo, rebatizado de Outono Inverno ou O Que Sonhamos Ontem, confere contemporaneidade às intenções do autor sem trair a essência das situações ou desrespeitar suas palavras.

Coube ao dramaturgo Kiko Marques reinventar o incômodo encontro entre Henrique e Margarida (interpretados por Riba Carlovich e Noemi Marinho), casal sessentão afogado em ressentimentos, com as duas filhas diante de uma mesa de jantar. “Trouxe para o presente tanto o tempo como o espaço em que esses personagens se encontram para mostrar como nós os compreendemos hoje”, explica Marques sobre sua intervenção dramatúrgica.

A filha mais velha, Eva (vivida por Nicole Cordery), é a executiva workaholic que camufla as frustrações apoiada no dinheiro. Mais jovem e raivosa, Ana (Dinah Feldman) dá duro como garçonete para sustentar o filho e perdeu a paciência com a afetação dos parentes. Conflitos em torno da submissão feminina e da opressão familiar ganham tintas mais fortes e detonam mágoas que revelam segredos bem guardados.

Cena do espetáculo 'Outono Inverno', dirigido por Denise Weinberg. Foto: Leekyung Kim

Família

Denise, que em 2006 interpretou Ana, optou por uma encenação oposta àquela de que participou ao lado de Sérgio Britto e Laura Cardoso. Relutou até em aceitar a decisão do cenógrafo Chris Aizner de colocar no palco uma mesa convencional. “Quis quebrar com aquele realismo de sala de jantar, toalha, pratos, porque o mundo mudou e eu enxergo esses personagens de outra maneira”, afirma a diretora. “Para mim, eles eram mais revoltados, mas, após perder meus pais e ganhar um neto, entendo melhor a dinâmica das famílias e suas incompreensões.”

Em seu primeiro trabalho com Denise, Nicole Cordery ressalta a importância de tratar da temática depois da pandemia e das turbulências políticas. “Denise trouxe uma violência para a peça que fala da sociedade e isso é representado na hora de virar a mesa, quebrar tudo”, comenta a intérprete.

Dinah, que produz o espetáculo junto de Nicole, é comandada por Denise pela quarta vez e entende a família como uma organização micropolítica em que sobressaem fragilidades, traumas e estruturas de poder. A atriz levanta outro ponto: as diferentes formas de lidar com a maternidade. “Temos uma mulher que se arrependeu de ter as duas filhas, uma outra mãe solteira e uma terceira que não consegue engravidar.”

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.