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Festival de Teatro de Curitiba abre hoje com grande aposta na representatividade

Mostra paranaense reúne mais de trezentos espetáculos e foca em temáticas sociais, inclusivas e identitárias

Por Dirceu Alves Jr.
Atualização:

Quando o espetáculo Hamlet, da companhia peruana Teatro La Plaza, abrir o Festival de Teatro de Curitiba nesta segunda, 27, será dado o tom da 31ª edição da maior mostra de artes cênicas do país. A montagem, dirigida por Chela De Ferrari, que terá sessão única no Teatro Guaíra, faz uma livre adaptação da obra de Shakespeare com atores portadores da síndrome de Down. O questionamento do príncipe da Dinamarca - “ser ou não ser” - pode ser aplicado a, entre outras reflexões, como seria um mundo em que todos tivessem as mesmas oportunidades. “O objetivo é fazer um festival para todos, todos os artistas e todos os públicos”, explica Fabíula Passini, uma das diretoras do evento.

Entre hoje e 9 de abril, mais de trezentos espetáculos serão vistos em sessenta espaços da cidade, movimentando quase 1800 artistas. Grande parte desta grade foi selecionada por três curadores, a pesquisadora Daniele Sampaio, a atriz e produtora Giovana Soar e o crítico Patrick Pessoa, que buscaram valorizar a representatividade. Temáticas sociais, inclusivas e identitárias permeiam as atrações e, mesmo nas peças de maior apelo comercial, o conceito é facilmente identificado.

Cena da peça Gaslight, Uma Relação Tóxica, de Patrick Hamilton, com direção dividida entre Jô Soares e Maurício Guilherme Foto: Priscila Prade

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Última direção de Jô Soares (1938-2022), o thriller Gaslight - Uma Relação Tóxica enfoca um casal (os atores Giovani Tozi e Erica Montanheiro) enredado no abuso psicológico. A comédia Intimidade Indecente, com Marcos Caruso e Eliane Giardini, traz um homem e uma mulher que, com o avanço das décadas, se confrontam com o etarismo. Até os bailarinos do Grupo Corpo tratam das interdições do mundo pandêmico e da violência nas coreografias Primavera e Breu.

A atriz Vera Holtz deve surpreender com o solo Ficções, em que questiona as mazelas do mundo contemporâneo, e, se é para ter musical, uma das escolhas recaiu sobre O Bem-Amado, versão do clássico político de Dias Gomes, com Cassio Scapin à frente do elenco e canções de Zeca Baleiro. Uma atração estrangeira capaz de gerar expectativa é Square, da companhia holandesa Wunderbaum, que busca ressignificar as áreas públicas e poderá ser vista na Praça Santos Andrade.

Outro musical é Brenda Lee e o Palácio das Princesas, protagonizado por Verónica Valenttino, a primeira atriz trans a vencer o Prêmio Shell, que trata do preconceito aos portadores de HIV. Quem também levou o Shell foi a dramaturga Dione Carlos por Cárcere ou Porque as Mulheres Viram Búfalos, peça sobre a opressão contra as mulheres. Entre as estreias nacionais aparecem O Tempo e a Sala, que marca o reencontro de vários atores paranaenses como Simone Spoladore, Leandro Daniel, Rodrigo Ferrarini e Ranieri Gonzales. A atriz Nena Inoue também lança o solo Sobrevivente, que investiga suas origens étnicas e o apagamento das mulheres de sua família.

A atriz Vera Holtz, em cena da peça Ficções Foto: Alex Silva / Estadão

Giovana Soar reconhece que Curitiba é considerada uma cidade conservadora e afirma que a programação pretende realmente desafiar um público menos aberto às novidades. “Não queremos que ninguém vá embora no meio de um espetáculo, a nossa intenção é agregar, mas achamos pertinentes mostrar diferentes manifestações até como forma de provocar o público”, justifica.

Fabíula Passini ressalta que não existe qualquer intenção de deixar o espectador tradicional na mão, pelo contrário, o objetivo é ampliar o alcance dos temas escolhidos. Tanto que o pensamento não fica restrito a Curitiba. O festival busca dialogar com outras mostras e, por isso, convidou esse ano 28 produtores e curadores de vários estados que poderão descobrir talentos. “Tem muita gente que vem pela primeira vez ao festival, como o Quatroloscinco (MG), a Cia. Dos à Deux (RJ), e o Grupo Carmin (RN), e nosso papel é incentivar a circulação”, diz Fabíula.

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Fringe

Inspirado na vitrine paralela do Festival Internacional de Edimburgo, o Fringe de Curitiba volta depois de três anos de silêncio. São mais de 280 espetáculos divididos em treze mostras temáticas que ocupam teatros, praças e ruas da cidade entre hoje e 9 de abril com produções vindas de doze estados brasileiros. O extenso tamanho da oferta deu origem a uma piada nos bastidores das edições anteriores do festival. “Encontrar qualidade no Fringe é quase como achar agulha em palheiro”, costumava-se brincar.

Por via das dúvidas, a organização mudou critérios esse ano que redesenharam o perfil do evento. Antes bastava as companhias se inscreverem para, dentro de um número limite, serem aceitas. Agora, foi feita uma seleção de acordo com o conceito de cada uma destas mostras. O festival também passou a oferecer hospedagem e alimentação aos artistas, além da tradicional bilheteria das apresentações. Antes, cada um vinha por conta própria. Um dos destaques é o grupo carioca Aslucianas, formado há duas décadas, que leva a Curitiba uma seleção do seu repertório. Também vale salientar a Mostra Caixa Preta, formada por solos que exploram temáticas intimistas.

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