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‘O Aprendiz’ de Roberto Justus faz falta na TV brasileira após 10 anos; leia análise e relembre

Desconsiderando as edições com celebridades e influenciadoras, última edição do programa em seu formato ‘tradicional’, diferente de outros realities, foi ao ar há em 2013

Por André Carlos Zorzi

Já faz praticamente uma década que o público não pode assistir a uma edição ‘clássica’ de O Aprendiz no Brasil. Mais que uma quantia em dinheiro, os participantes disputavam uma vaga para trabalhar numa das empresas de Roberto Justus (posteriormente João Doria), que, com olhar sério e trilha sonora imponente, anunciava as eliminações com um: “Você está demitido”.

Roberto Justus no reality 'O Aprendiz' em 2014. Foto: Edu Moraes / Record TV / Divulgação

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O leitor pode estranhar a citação aos quase 10 anos, já que houve edições em 2014 e 2019. O problema é que foram edições atípicas: uma envolvia apenas celebridades, e a outra somente influenciadores digitais. Em outras palavras, foi um bom entretenimento, mas sem o mesmo grau de seriedade e cobrança que as edições anteriores buscavam passar.

Durante a final do Aprendiz em 2019, Justus confirmou uma nova temporada para o ano seguinte - desta vez, sem famosos, apenas os tradicionais ‘anônimos’. Mesmo com a pandemia de covid, a temporada ganhou até data de estreia: 7 de setembro de 2020, “de um jeito até muito arriscado, estranho e diferente”, segundo o próprio Justus. Não deu certo e o prazo foi estendido para março de 2021, e depois para o ano seguinte - mas ficou apenas na promessa.

O Aprendiz, em seus moldes tradicionais, faz falta na TV brasileira. O erro das últimas edições foi ter apostado que a presença de famosos poderia turbinar a audiência. No Aprendiz: Celebridades, porém, a maioria dos participantes eram artistas pouco conhecidos ou que estavam no ostracismo, com raras exceções (a título de curiosidade, a edição foi vencida por Ana Moser, hoje ministra dos Esportes).

Roberto Justus ao centro da mesa na final de 'O Aprendiz 3', em 2006 Foto: Sebastião Moreira/Estadão

O mesmo aconteceu em 2019, quando tentou-se aproveitar os seguidores dos participantes na audiência - mas quem acompanha os vídeos de um youtuber para ver dicas de viagem não necessariamente tem pique para vê-lo tentando vender frutas na feira, por exemplo, especialmente com sua presença diluída entre os outros 17 participantes.

Em ambos os casos, porém, ficou perceptível um nível de cobrança menor por parte de Justus. A própria escolha de conselheiros demonstrou isso, como Cacá Rosset, que entende mais de arte do que de negócios, e José Roberto Marques, que fazia discursos que iam do nada ao lugar nenhum. Algo que nem de longe se comparava aos comentários de alguém como Walter Longo, por exemplo.

Segundo o colunista Flávio Ricco publicou em 2022, a ideia de Justus seria mudar o nome do programa para O Contratado (inclusive, o canal de YouTube da atração chegou a ser atualizado com a nova marca), e focar mais nas contratações do que em demitir as pessoas. Pode até dar certo, mas parece mais um passo no caminho das duas edições anteriores, apostando em muitas mudanças em vez de focar no que deixou saudade.

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Roberto Justus durante coletiva da 1.ª edição de 'O Aprendiz', em agosto de 2004 Foto: Beto Barata/Estadão

Quem sabe se a produção “voltar ao passado” no formato do programa e entender que O Aprendiz tem um público próprio, não disputando diretamente com atrações como A Fazenda e o BBB, possa fazer sucesso novamente? Seja em uma emissora de TV aproveitando o YouTube, como bem fez recentemente, ou até numa plataforma de streaming.

O que era único em O Aprendiz

A dinâmica era interessante: os candidatos, com formação em variadas áreas, dividiam-se em duas equipes que concorriam entre si uma vez por semana. Os desafios poderiam ser focados na articulação de rede de contatos, na criatividade para uma ação publicitária, na capacidade de organização de eventos, e por aí vai.

Ao fim de cada programa, enquanto a equipe vencedora recebia algum prêmio ou benefício, os perdedores iam para a sala de reunião, onde basicamente Justus e seus conselheiros faziam duras críticas aos erros cometidos até que se chegasse à conclusão de quem seria demitido.

O programa é uma versão brasileira de “The Apprentice”, surgida também em 2004, que ajudou a impulsionar a volta por cima na vida pública de ninguém menos que Donald Trump.

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Por que Roberto Justus saiu do Aprendiz?

Roberto Justus apresentou, anualmente, as seis primeiras temporadas entre 2004 e 2009, quando deixou a Record e foi para o SBT para apresentar programas de auditório como o Topa Ou Não Topa e o Um Contra Cem. A emissora chegou a anunciar o reality O Grande Desafio, mas ele nunca foi ao ar. Na sinopse, prometia “Desafios que vão testar sua competência nos negócios e a capacidade de superar seus maiores medos. 18 participantes postos à prova por Roberto Justus em mais de sete países ao redor do mundo.” O apresentador deixou o canal de Silvio Santos em julho de 2011.

Roberto Justus à frente de seu programa 'Roberto Justus+', na Record, em 2013. Além de 'O Aprendiz' e de sua passagem pelo SBT, apresentador também esteve à frente de reality shows como 'A Fazenda' e 'Power Couple Brasil' Foto: Record TV/Divulgação

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Mas o apresentador poderia ter levado o programa consigo à nova emissora? A reportagem “O Aprendiz no SBT - Emissora quer tirar formato da Record”, publicada pelo Estadão em 16 de julho de 2009, falava sobre o tema. À época, o formato pertencia à empresa Fremantle e o contrato era fechado a cada edição. Justus declarava interesse em levá-lo ao SBT, mas a Record propôs a manutenção do programa no canal, com um novo apresentador.

“João Doria Jr. foi o nome sugerido. Essa mudança depende da aprovação do criador do original, o britânico Mark Burnett, que sempre se mostrou muito impressionado com a atuação de Justus na versão brasileira”, dizia a reportagem (clique aqui para ler a íntegra). Pouco depois, Doria foi aprovado e a atração continuou na Record.

O Aprendiz de João Doria

João Doria ao lado de seus conselheiros em 'O Aprendiz: Universitário' em 2010: Cristiana Arcangeli e David Barioni Foto: Edu Moraes/Record/Divulgação

As edições de 2010 e 2011 foram comandadas por João Doria (que anos depois se tornaria prefeito de São Paulo), dono de um estilo diferente em relação ao antecessor. Quem assistiu aos dois apresentadores sabe que é até difícil explicar, mas a diferença existia e estava lá. A colunista Cristina Padiglione, por exemplo, opinava sobre a estreia de Doria no Estadão à época:

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“Até que João Dória se saiu bem. Tinha sinceramente a ideia de que o substituto [de Justus] ficaria muito aquém. Não ficou.Texto seguro, tom adequado, closes levemente exagerados. Para o que o programa propõe, o Dória não foi mal, não”.

Em declarações públicas, Justus e Doria se acostumaram a trocar elogios e manter a cordialidade. Em 2010, quando a dupla se encontrou no Show Business, programa de entrevistas de Doria, Justus comentou: “Só porque você me sucedeu no Aprendiz as pessoas acham que nós somos inimigos. Não tem nada a ver”.

As últimas edições de O Aprendiz

Em 2013, O Aprendiz - O Retorno fazia referência tanto à volta de Justus ao comando da atração quanto à segunda chance dada aos participantes - todos já conhecidos do público por terem participado de edições anteriores, incluindo as de Doria.

A emissora também podia proporcionar um programa de maior qualidade do que as edições iniciais, já com uma quantidade maior de brasileiros com acesso à televisão em HD, fora os anos de experiência na produção de um reality show do tipo.

Em 2014, Justus apresentou a versão com celebridades, e anunciou o Aprendiz Celebridades 2 para 2015, mas o programa nunca foi ao ar. Em 2019, já na Band, foi feita a edição com influenciadores digitais, até o momento, a última que o reality show teve no Brasil.

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