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Cientista político e economista

Opinião|O fim de um ano infeliz

Nacionalismo está em franca ascensão, e não se pode mais contar com a ONU

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Este foi um ano que ficará na memória de praticamente todos os países. Guerras amargas foram travadas sem qualquer fim à vista. Quase todos os países sentiram os efeitos da mudança climática, o que finalmente levou a esforços mais acelerados de adaptação. As forças armadas tiveram novas oportunidades de intervenção, e o fizeram. Esquerda e direita buscam o poder implacavelmente.

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As preferências populares promoveram mudanças políticas em países em desenvolvimento que poucos teriam previsto. A incerteza está por toda parte, das regras internacionais da computação até as decisões judiciais e a busca por novas constituições e, mais recentemente, o impeachment do presidente Biden.

Isso ocorre em muitos lugares, e os efeitos variam muito dependendo do local. Alguns países, como Argentina e Equador, têm novos presidentes, de direita, mas mal conseguem funcionar. Na África e na Ásia, secas agudas e enchentes severas afetam o mesmo país. Não se pode mais contar com a racionalidade ao pensar em respostas. É impossível adivinhar os preços de amanhã. Invariavelmente, o investimento no futuro é limitado. O consumo parece estar aumentando.

O nacionalismo está em franca ascensão. Não se pode mais contar com as Nações Unidas e seu crescente envolvimento, mesmo com um aumento global na renda.

Guerra na Faixa de Gaza; ano foi marcado por conflitos Foto: Evelyn Hockstein/Reuters

Até os Estados Unidos perderam sua posição internacional de comando. A dinâmica política doméstica parece ser o único assunto relevante. As questões internas agora dividem os americanos em vez de uni-los. Falou-se até na possibilidade de terceiros para resolver a questão da escolha presidencial em 2024.

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Dados de pesquisas recentes e imparciais mostram o ex-presidente Trump com uma vantagem cumulativa maior em relação a Biden ao longo de 2023. Tudo isso apesar do crescimento econômico mais rápido e de uma inflação abaixo do esperado. Até o banco central americano, o Federal Reserve, indica que fará cortes substanciais nos juros no ano que vem.

A sorte de Trump está no fato de as pessoas culparem Biden pelo surgimento de juros mais altos, e de déficits fiscais maiores decorrentes de um acordo bipartidário no início do mandato para os gastos de 2021. Isso permitiu que a economia começasse a se recuperar da crise causada pela epidemia de covid, que desacelerou substancialmente a economia mundial a partir do início de 2020. A incapacidade de Trump de compreender ou gerenciar a crise foi responsável pela vitória de Biden em 2020. Nem as suas mentiras e a tentativa de subverter a constituição com uma invasão do congresso tiveram esse resultado. Duas propostas de impeachment padeceram sem o apoio necessário no Senado.

Todos pensaram que a carreira de Trump na política teria chegado ao fim. Mas a democracia ainda não venceu. Trump está de volta com força total, como mencionado acima. Os demais candidatos nas primárias republicanas estão fracassando na busca por amplo apoio. Trump nem se deu o trabalho de participar delas. Ainda assim, espera-se que seja ele o candidato escolhido.

Somente o judiciário pode impedir que isto ocorra. Há três processos fundamentais que estão em andamento ou têm audiências agendadas. Um deles é na cidade de Nova York, envolvendo o crime de fraude. O procurador do estado cobra uma multa de US$ 250 milhões e deseja cassar a licença de Trump para fazer negócios em Nova York. Outro julgamento deve ocorrer em março, em tribunal federal, lidando com a sua posse de documentos confidenciais e a tentativa de ocultá-los. É o caso apresentado por Jack Smith, e uma das sentenças possíveis é a prisão. Um terceiro caso corre na Geórgia, por extorsão, com audiência marcada para 5 de agosto, sendo que outros funcionários federais do alto escalão já se declararam culpados e ofereceram seus depoimentos.

Enquanto isso, no Brasil, os problemas de um futuro imposto sobre o valor agregado e potenciais déficits fiscais em 2024 parecem ter sido provavelmente resolvidos. Parabéns ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad! Parece que ali os políticos podem, às vezes, ser heróis. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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Opinião por Albert Fishlow

Economista e cientista político, professor emérito nas universidades de Columbia e da Califórnia em Berkeley

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