Publicidade

Arcabouço fiscal: ajuste previsto de gastos só perderia para o do governo Temer, aponta pesquisa

Despesas cresceram 0,8%, em média, na gestão de Temer; se a regra proposta no atual governo estivesse em vigor, aumento no período seria de 1,6%

Foto do author Thaís Barcellos
Por Thaís Barcellos (Broadcast)

BRASÍLIA - Apesar do mau humor do mercado financeiro com a versão final do arcabouço fiscal proposto pelo governo, o ajuste de gastos previsto pelo projeto só perderia para o governo de Michel Temer se estivesse em vigor desde 1998, mostram os cálculos da consultoria Buysidebrazil.

PUBLICIDADE

Além do número de exceções à regra de limite de despesas, os investidores se incomodaram com a falta de punições mais rígidas em caso de descumprimento das metas fiscais no texto enviado ao Congresso, assim como com a alta dependência de receitas extras. “As metas fiscais são ambiciosas”, concorda Ariana Zerbinatti, uma das sócias e economista-sênior da Buysidebrazil.

A regra proposta pelo arcabouço é de que o crescimento real das despesas a cada ano seja limitado ao avanço real das receitas até junho do ano anterior (em 12 meses), respeitando um piso de 0,6% e um teto de 2,5%. Se houver descumprimento da meta fiscal, o aumento real do gasto no ano seguinte passa a ser limitado a 50% da elevação das receitas, já desconsiderando a inflação.

Considerando a média do mandato, as despesas cresceram apenas 0,8% em termos reais na gestão de Temer (2016-2018), o que coincide com a criação do teto de gastos. Se a regra proposta pelo atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estivesse em vigor, o aumento no período seria de 1,6%.

Se a regra proposta pelo atual ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estivesse em vigor, o aumento no período seria de 1,6% Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Mas o mecanismo previsto no novo marco fiscal geraria um volume de despesas muito menor do que nas administrações anteriores do PT. Nos dois primeiros mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o crescimento real dos gastos foi de 7,5% e 9,5%, respectivamente. Com o novo arcabouço, seria de 2,2% e 2%, nessa ordem. No governo de Jair Bolsonaro, os desembolsos avançaram 3,1%, contra 2% se a nova regra estivesse em vigor.

Considerando os resultados anuais, desde 1998, apenas em nove oportunidades o crescimento real efetivo da despesa teria sido menor ou igual ao proposto pelo arcabouço - quatro deles depois do teto de gastos (2017, 2018, 2019 e 2021 - após a explosão de despesas em 2020 devido à pandemia de covid-19).

De forma similar, os economistas Felipe Salto e Josué Pellegrini, da Warren Rena, já calcularam que a economia, caso o novo arcabouço estivesse em vigor desde 2011, seria de R$ 775,3 bilhões ou R$ 64,6 bilhões ao ano e que os resultados primários seriam melhores nesse período.

Publicidade

“A proposta de arcabouço fiscal tem seu mérito, ela é até bem rígida se considerarmos o histórico de gastos públicos dos últimos anos”, diz Ariana Zerbinatti, economista e sócia da Buysidebrazil.

A economista reconhece que a regra do teto era mais dura, mas lembra que, depois da pandemia de covid-19, iniciada em 2020, ficou mais difícil de ser cumprida, com diversos furos. Quanto às exceções previstas no novo marco, Zerbinatti tampouco vê “grandes problemas”, já que são bem similares ao teto, com poucos acréscimos e já esperados, como o piso da enfermagem.

Metas ambiciosas

Apesar da visão mais construtiva sobre o arcabouço, Zerbinatti compartilha da preocupação de muitos de seus colegas em relação à dependência de receitas extras para alcançar as “ambiciosas” metas de resultado primário previstas pelo governo.

Em suas contas, considerando estimativas próprias de PIB e arrecadação, faltam cerca de R$ 100 bilhões em receitas para chegar ao resultado primário zero no ano que vem. Segundo ela, as metas de 2025 (superávit de 0,5% do PIB) e de 2026 (superávit de 1% do PIB) são ainda mais desafiadoras.

PUBLICIDADE

Considerando que o Ministério da Fazenda vai ser bem-sucedido no esforço de arrecadação sem aumento de carga tributária e consiga R$ 100 bilhões em receitas extras, a consultoria estima que o superávit em 2024 seria de 0,06% do PIB. Em 2025 e 2026, o resultado superavitário seria de 0,22% e 0,52% do PIB, nessa ordem - aquém das metas fiscais, mesmo considerando a banda de 0,25 ponto porcentual para mais ou para menos.

O cenário para a dívida pública também é mais pessimista do que o do governo, que prevê estar próximo da estabilização ao fim do Lula 3. Já a consultoria estima que a estabilidade ocorreria em 2029, caso os R$ 100 bilhões de receitas extras sejam obtidos a partir de 2024. Sem os R$ 100 bilhões, o endividamento continuaria crescendo e encostaria em 90% do PIB em 2032.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.