Devedor contumaz: Receita pode arrecadar R$ 1,25 bi com antecipação de pagamentos com ‘Refis’

Relator inclui vantagens para quem antecipar pagamentos de programas de parcelamento de dívidas tributárias; texto cria punições a empresas que sonegam impostos de maneira recorrente

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Foto do author Giordanna Neves
Atualização:

BRASÍLIA – A proposta que cria uma lista de “nomes sujos” para empresas que sonegam impostos de maneira recorrente, chamadas de devedores contumazes, prevê que empresários que aderiram a programas de parcelamento de dívidas tributárias (“Refis”) no passado possam ter vantagens se anteciparem os pagamentos. Cálculo da Receita Federal indica que, se em 28% dos atuais parcelamentos os contribuintes optarem pelas vantagens, seria possível arrecadar R$ 1,25 bilhão.

O cálculo consta de relatório do projeto de lei que cria a figura do devedor contumaz, de autoria do deputado Danilo Forte (União-CE), e informa que o estoque de dívidas de programas de refinanciamento é de R$ 11 bilhões, dos quais R$ 7 bilhões derivam de dívidas com juros.

Valor do fundo eleitoral será definido pela Lei de Diretrizes Orçamentárias, sob relatoria do deputado Danilo Forte (União-CE). Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

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Forte decidiu incluir em seu parecer a oferta para que empresas possam antecipar esses pagamentos, com o argumento de que a cobrança tem hoje um prazo longo e que há gastos de operação também para o governo. As condições seriam uma redução de 70% de juros e multas e prazo para pagamento (mais 120 meses). Programas de refinanciamento de dívidas tributárias de 2000, 2003, 2006 e 2009 são alvo do projeto.

A reforma da Previdência de 2019 proibiu o lançamento de novos programas de refinanciamento de passivo que envolvam dívidas de tributos que financiam a Seguridade Social.

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O deputado, que preside a Comissão de Desenvolvimento Econômico, pretende colocar seu relatório em votação no colegiado nesta quarta-feira, 4. O tema ainda teria de ser apreciado pelo plenário, mas vem despertando preocupação de advogados tributaristas em razão da determinação de Forte de punir empresas sonegadoras. O texto também colocou em alerta entidades representativas de setores empresariais, que devem estimular um pedido de vistas ao relatório nesta quarta.

Além da inabilitação do CNPJ, a proposta prevê que as empresas que entrarem na lista suja de sonegadores não poderão participar de licitações ou ter vínculo com a União ou com governos estaduais e municipais. Também não poderão mais se livrar de uma eventual punição penal quitando a dívida da sonegação.

“Quem for configurado como devedor contumaz, ainda que se recupere, ainda vai responder pela punição”, afirma o advogado Rafael Oliveira Beber Peroto, sócio da Oliveira e Olivi Advogados Associados.

Ele critica a forma como ficou redigida a norma, com o argumento de que as empresas em dificuldade que se tornaram sonegadoras dificilmente poderão se reerguer.

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(O texto) vai contra o interesse de recuperar o débito porque mata a empresa, e isso é contra o próprio interesse da União”, afirma. “É praticamente uma sentença de morte (a inclusão na lista suja)”.

O advogado observa ainda que é altamente discutível outro trecho inserido por Forte que cria solidariedade de contribuintes que realizarem transações com devedores contumazes, determinando que assumam a dívida desses sonegadores.

“Isso é altamente discutível, porque se trata de uma empresa que não é destinatária do tributo, e nem poderia ser, e que seria responsabilizada de maneira solidária”, afirma Peroto.

Forte vem afirmando que tem o apoio da Receita Federal para seu projeto, mas no Senado um projeto paralelo voltou a ganhar tração nesta semana e tem chance de avançar. Ele é de autoria do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e tem a relatoria de Efraim Filho (União-PB), além do apoio de alguns setores por ser considerado menos punitivo a sonegadores.

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Quem é devedor contumaz

Para ser considerado devedor contumaz, a empresa tem que ter uma dívida tributária, inscrita ou não em dívida ativa, de ao menos R$ 15 milhões e superior ao seu patrimônio. O segundo critério é que essa dívida esteja em situação irregular por mais de um ano. Um terceiro critério é que a empresa tenha vinculação com outro CNPJ, ativo ou extinto, com dívida tributária semelhante.

A proposta cria, por outro lado, cadastros de bons pagadores de impostos, que poderiam ter o benefício de abater até 3% do valor devido da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

A ideia partiu da Receita Federal, mas a redação foi alterada durante a tramitação na Câmara, iniciada em fevereiro.

Para diminuir a resistência do setor produtivo, Forte incluiu a previsão de que confederações patronais, de âmbito nacional, possam impugnar a inclusão na lista suja.

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Em seu relatório, ele afirma que as entidades deverão atestar que uma situação excepcional levou a empresa à sonegação recorrente, sem dolo por parte do empresário. Além disso, o processo de avaliação pelas confederações deverá ser transparente, com regras objetivas, e acessível ao Fisco.

Dívidas resultantes de autos de infração e de lançamentos no valor de até R$ 10 mil, tratadas como de baixo valor pelo parlamentar, seriam perdoadas, o que representaria uma renúncia tributária de R$ 105 milhões.

200 empresas

No relatório apresentado nesta terça-feira, o deputado afirma que a previsão de empresas que potencialmente poderiam ser alvo do cadastro de devedores contumazes caiu em relação ao inicialmente projetado pela Receita.

No início, escreveu ele, a Receita previu que 1 mil empresas poderiam entrar no radar, detentoras de um passivo de R$ 200 bilhões. A previsão atualizada, diz ele, é que sejam 200 empresas, com passivo de R$ 22 bilhões.

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A redução se deve a medidas que ampliaram os critérios para a exclusão de empresas do cadastro de devedores, como não considerar juros e multas no passivo de R$ 15 milhões além de Receita e Procuradoria da Fazenda avaliarem a capacidade de pagamento da empresa devedora.

A capacidade de pagamento deverá ser atestada segundo as regras da Receita Federal, o que vem gerando preocupação de grandes empresas, que veem mais dificuldade em demonstrar essa capacidade pelas normas do Fisco do que pelas da Procuradoria da Fazenda, o que provocou um impasse.

Outro atenuante é a exclusão do cadastro negativo caso a empresa tenha pagado valores superiores ao principal da dívida (excluindo juros e multas) nos últimos três anos.

Também deverão ser descontadas do valor de R$ 15 milhões valores de juros e multas, além de valores a receber de governos.

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