BRASÍLIA - A arrecadação de impostos desacelerou nos últimos dois meses e acendeu a luz amarela para o governo federal, Estados e municípios. O problema é maior para as contas do governo Lula, que, além de sofrer com a queda da arrecadação, está sendo pressionado pelo Congresso a socorrer os prefeitos, em ano pré-eleitoral, com um aporte extra ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
Governadores cobram o mesmo tratamento e já conseguiram articular na Câmara um reforço ao Fundo de Participação dos Estados (FPE), que amargou queda de mais de 30% na primeira parcela de setembro. Os dados foram compilados pela Febrafite, associação que reúne os fiscais estaduais, e serão levados ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em uma reunião marcada pelos governadores para o próximo dia 25.
Segundo apurou o Estadão, a Receita Federal identificou uma queda forte do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), pago por grandes empresas. Não há até o momento um diagnóstico claro das razões que levaram essas companhias a pagar menos tributo do que o governo esperava.
Em julho, o IRPJ caiu 16,44% (descontada a inflação) em relação ao mesmo período do ano passado. Já no acumulado do ano, até julho, a queda é de 5,69%.
A redução do IRPJ tem impacto direto no caixa dos Estados e municípios, porque a arrecadação do tributo é dividida com os governos regionais. A expectativa é de que, até o final de setembro, a origem do problema esteja mapeada para ser apresentada nos dados da arrecadação de agosto.
O tema é sensível porque vai na contramão da necessidade do governo de elevar a receita e zerar o déficit público em 2024. Para alcançar o objetivo, o ministro Fernando Haddad tenta colocar de pé um pacote de medidas arrecadatórias - sendo que a maior parte delas é vinculada, exatamente, ao Imposto de Renda.
A diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Vilma Pinto, aponta que tem havido uma desaceleração importante em diversos itens de receita, mas que a queda tem sido mais forte no IRPJ e na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Para ela, é difícil saber, no momento, até que ponto esse é um movimento de antecipação em resposta aos rumores sobre mudanças na tributação da renda ou efeito conjuntural.
E não é só o movimento do IRPJ que preocupa. A queda real de 13% de janeiro a julho do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) - tributo que também é partilhado e passou por um processo de diminuição linear das alíquotas no governo Bolsonaro - também está diminuindo o dinheiro no caixa dos governos regionais.
A conta chegou
Rodrigo Spada, presidente da Febrafite, sobre a queda do ICMS e as decisões recentes do Congresso
Já o ICMS - principal fonte de receitas dos Estados - levou um tombo de 9,76% de janeiro a junho deste ano, segundo números da Febrafite. “Os dados mostram uma situação muito preocupante, porque o ICMS representa 85% da arrecadação estadual”, afirma Rodrigo Spada, presidente da associação dos fiscais estaduais.
Ele ressalta que “a conta chegou” após a decisão do Congresso de aprovar no ano passado duas leis (192 e 194) com desoneração permanente do tributo.
“O aumento da arrecadação era conjuntural, mas fizeram um corte estrutural (no ICMS), sem prever uma nova fonte de compensação”, reforça André Horta, diretor do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz).
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Para a secretária de Fazenda de Alagoas, Renata dos Santos, as leis 192 e 194 foram um grande golpe em todos os Estados, e apenas 13 fizeram uma “reforma tributária” para ter a recomposição do ICMS com o aumento da alíquota.
“A nossa principal preocupação é a falta de previsibilidade para frente”, diz. No caso de Alagoas, metade da receita é proveniente de transferências, principalmente do FPE. “As despesas já estão contratadas”, afirma a secretária.
O secretário de Fazenda de São Paulo, Samuel Kinoshita, também está preocupado com a queda, que afeta todos os Estados, e relata que conversou com o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, sobre o problema.
Em meio à pressão, a Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quinta-feira uma antecipação de R$ 10 bilhões a prefeitos e governadores, referente à compensação pelo corte no ICMS no ano passado. Os parlamentares também determinaram que a União faça repasses extras de R$ 2,3 bilhões ao FPM e de R$ 1,6 bilhão ao FPE.
Mas os Estados querem mais e se preparam para a reunião com Haddad no fim deste mês. Os prefeitos também trabalham com a perspectiva de medidas adicionais, como um parcelamento de dívidas da Previdência, com retirada de juros e multas, em uma espécie de “Refis” - o que já foi sinalizado pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa.