O Novo Mercado da Bovespa está "parado no tempo". Criado em 2000 para reunir as empresas com melhores práticas de governança corporativa, o segmento deixou de ser atrativo, o que levou a Bolsa a propor a reforma do segmento pela terceira vez.
O novo regulamento permanece em audiência pública até esta sexta-feira, 9. Após analisar as sugestões, a Bovespa vai elaborar a proposta definitiva de reforma do Novo Mercado. Na próxima fase, as empresas listadas terão até o dia 6 de fevereiro de 2017 para votar se aceitam ou não as mudanças.
Na opinião de especialistas, a evolução do Novo Mercado foi frustrada pelo próprio desenvolvimento da regulamentação do mercado, que tornou triviais as normas antes consideradas um diferencial do grupo, e pelo desrespeito das empresas a essas regras.
Hoje, 128 empresas fazem parte do segmento, cerca de 30% do total de companhias listadas na Bolsa, 438. Esse porcentual está estagnado desde dezembro de 2013, quando o Novo Mercado registrou seu recorde de empresas listadas, 134. De lá para cá, 12 empresas saíram do grupo, enquanto somente seis entraram para o "pelotão de elite" de governança da Bolsa.
"A reforma é uma questão de vida ou morte", destaca o presidente da Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec), Mauro Cunha.
Embora haja consenso com a urgência da sua atualização, investidores, empresas e especialistas discordam sobre qual deverá ser o próximo regulamento para manter o segmento atrativo.
Bloco de controle. Também não há consenso sobre o porcentual de ações que forma o bloco de controle e obriga o acionista a comprar os papéis de investidores minoritários.
Pelo regulamento em debate, o acionista que atingir 30% de participação numa empresa de capital pulverizado terá de realizar uma oferta pública de aquisição de ações (OPA). A OPA é a oportunidade do acionista minoritário vender sua fatia na empresa.
O custo da medida é considerado alto porque o acionista terá de comprar as ações dos outros investidores pelo maior preço pago por ele próprio nos últimos 12 meses. Muitas empresas também têm questionado o porcentual para determinar uma participação relevante.
Na opinião de Carlos Lobo, sócio da Veirano Advogados, essa regra vai sofrer resistência, assim como em 2010, porque tira a liberdade das companhias e a atratividade para investimentos. A lei brasileira exige atualmente que a OPA seja realizada somente nos casos em que haja mudança de controle, conhecido como mecanismo de tag along que, na prática, é uma maneira de proteger o acionista minoritário.
"Essa regra vai prejudicar as empresas que precisam de capitalização, porque o investidor não vai querer aportar um montante extra para pagar a OPA. Um controlador que tenha 35% de participação também terá dificuldade de vender", reclama.
Saída. As regras de saída do Novo Mercado também são tema de debate. Atualmente, a única exigência é a realização da OPA, mas a Bolsa propôs agora a realização de uma assembleia com quórum mínimo de aceitação de 50% das ações em circulação no mercado, como forma de combinar o preço da oferta.
A Bolsa também propõe na reforma mais flexibilidade para o porcentual mínimo de ações que devem ser mantidas em livre circulação. A empresa pode escolher manter 25% dos ativos no mercado ou 20%, se tiver volume de negociação diário igual ou superior a R$ 25 milhões. Há mudanças também sobre os conselheiros independentes, que agora devem ser no mínimo dois.
Controles internos. Após a Lava Jato e a Lei Anticorrupção, a proposta de reforma do Novo Mercado formulada pela Bovespa traz novidades no âmbito de fiscalização e controle. Hoje, não há qualquer exigência sobre o assunto no regulamento, mas o documento em audiência pública prevê três novos requisitos: o Comitê de Auditoria Estatutária, auditoria interna e departamento de compliance.
Outra inovação está relacionada às medidas de proteção aomeio ambiente. A ideia agora é que todas as empresas do Novo Mercado tenham política socioambiental e entreguem relatório sobre o assunto. Flavia Mouta, diretora de Regulação de Emissores da BM&FBovespa, afirma que esses assuntos são fundamentais no momento atual, pós Lava Jato e Lei Anticorrupção.
"Em 2016, você querer trazer o Novo Mercado para um novo patamar de reconhecimento para que ele continue sendo um selo diferencial de melhores práticas de governança e não abordar questões socioambientais e de compliance e controles internos ficava algo muito desconectado da realidade".