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Professor da PUC-Rio e economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo escreve quinzenalmente

Opinião|‘Preço da traição’ de parlamentares que contrariam seus eleitores aumentou com as redes sociais

Situação complica o governo na hora de negociar aprovação de pautas consideradas ‘de esquerda’ na economia

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Após sete meses de governo o presidente Lula da Silva ainda não conseguiu estruturar uma coalizão estável no Congresso. Os projetos têm sido discutidos e votados caso a caso, com vitórias e derrotas importantes. Entre as vitórias, tivemos a aprovação da reforma tributária e da volta do voto de qualidade no Carf, ambas na Câmara dos Deputados (falta o Senado), e do arcabouço fiscal na Câmara e no Senado, sendo necessária nova votação na Câmara.

Entre as derrotas, a retirada do decreto executivo que muda o Marco Regulatório do Saneamento e do projeto das “fake news”, para evitar derrotas humilhantes, e a sinalização de que, caso o governo tentasse acabar com a autonomia do Banco Central e desfazer a privatização da Eletrobras, seria derrotado no Congresso.

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Segundo o presidente da Câmara, projetos que beneficiam o País serão discutidos e aprovados, enquanto projetos com viés ideológico de esquerda dificilmente serão aprovados. Uma demonstração de independência incomum do Legislativo brasileiro. O que mudou?

A transformação das emendas parlamentares de autorizativas em impositivas, ou seja, uma vez aprovadas no Orçamento, elas têm de ser pagas ao longo da execução orçamentária, tornou a relação entre Executivo e Legislativo mais equilibrada. Com isso, a liberação das emendas deixou de ser parte do “toma lá dá cá” entre os dois Poderes.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, tem dado seguimento a propostas do governo como o arcabouço fiscal e a reforma tributária Foto: Marina Ramos / Câmara dos Deputados

Segundo, ao contrário do que ocorria no passado, quando a imprensa tradicional dava pouco espaço ao parlamentar “médio”, ao chamado “baixo clero”, agora eles criaram suas próprias redes sociais e passaram a participar ativamente da discussão política. Com o eleitor sendo informado dia e noite pelos próprios políticos que elegeu, “trair o eleitor”, mudando o voto após ter sido eleito, pode significar a perda do voto no futuro, como ocorreu com vários parlamentares nas últimas legislaturas. Em outras palavras, o “custo de trair o eleitor” aumentou. Esse processo é reforçado pela forte polarização vigente na sociedade brasileira.

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Montar uma base sólida no Congresso vai exigir que o PT e o presidente mudem seu caráter hegemônico e aceitem uma maior divisão de poder com os partidos do centro. Ministérios periféricos, como Turismo, não conseguirão resolver esse problema. Uma condição indispensável para aprovar os aumentos de impostos necessários (mas talvez não suficientes) para cumprir o arcabouço fiscal.

Opinião por José Márcio de Camargo

Professor aposentado do Departamento de Economia da PUC-Rio, é economista-chefe da Genial Investimentos

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