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BNDES: Mercadante assume comando e fala em mudar a TLP e em elevar crédito para a indústria

Novo presidente afirmou não pretender que o banco de fomento dispute mercado com bancos privados

Foto do author Rayanderson Guerra
Por Denise Luna (Broadcast), Rayanderson Guerra , Gabriel Vasconcelos (Broadcast) e Vinicius Neder
Atualização:

RIO - Aloizio Mercadante assumiu nesta segunda-feira, 6, a presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Durante a cerimônia de posse, ele voltou a falar em mudanças na Taxa de Longo Prazo (TLP), que baliza os financiamentos da instituição de fomento. Em vigor desde 2018, a TLP segue as taxas de mercado, diferentemente da TJLP, que vigorou desde 1994 e era definida pelo governo federal.

Segundo Mercadante, eventual mudança na TLP será debatida com o Congresso Nacional. “Não queremos e não estamos reivindicando padrões de subsídio no Orçamento, como no passado”, afirmou o no presidente do BNDES, em sua cerimônia de posse, na sede do banco, no Rio.

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Mercadante voltou a criticar o nível da TLP. Segundo ele, a taxa está acima das verificadas no “custo da dívida pública”. “Hoje, a TLP tem custo financeiro acima do custo da divida. Isso penaliza as pequenas e médias empresas”, afirmou o novo presidente do BNDES.

Além de refutar a possibilidade de voltar a ter subsídios fiscais com os juros mais baixos do BNDES, Mercadante ressaltou que não pretende que o banco de fomento dispute mercado com os bancos privados.

“Não pretendemos ficar disputando mercado com o sistema financeiro privado. Queremos entrar na Febraban”, afirmou Mercadante, em tom de brincadeira, dirigindo-se a Isaac Sidney, presidente da entidade que representa os bancos privados, que estava na plateia da cerimônia de posse.

Sede do BNDES, que fica no Rio de Janeiro Foto: FERNANDO FRAZÃO / AGÊNCIA BRASIL

Contexto

A posse de Mercadante marca o início do que parece ser um novo ciclo de expansão do BNDES, após quase sete anos de encolhimento, desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). A guinada rumo à diminuição veio logo no afastamento de Dilma. Uma das primeiras medidas anunciadas pelo então recém-indicado ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi justamente uma espécie de “tapering” do BNDES, com a devolução antecipada de R$ 100 bilhões de sua dívida com a União.

O crescimento dessa dívida, motor do gigantismo do BNDES nos governos do PT, se deu à base de aportes bilionários do Tesouro Nacional como “funding” para o banco. Foram cerca de R$ 440 bilhões entre 2009 e 2014. No governo Jair Bolsonaro (PL), a aceleração do ritmo das devoluções também foi uma das primeiras medidas anunciadas pelo ex-ministro da Economia Paulo Guedes. Mesmo diante de uma pausa, por causa da crise causada pela covid-19, essa aceleração se manteria - em novembro passado, como antecipou o Estadão/Broadcast, o BNDES fez mais uma devolução, de R$ 45 bilhões; os R$ 24,1 bilhões que restaram deverão ser pré-pagos até novembro deste ano.

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Ao mesmo tempo, o BNDES vendeu R$ 88,5 bilhões em ações de grandes empresas, que estavam alocadas em sua bilionária carteira de participações societárias, entre 2019 e 2022, e viu suas concessões de crédito tombarem. Em 2021, os desembolsos responderam por 0,74% do PIB, o menor nível da série histórica divulgada pelo BNDES, iniciada em 1995 - o auge, de 4,33%, foi atingido em 2010.

O tombo no crédito do BNDES se deveu tanto à queda da procura das empresas por financiamentos de longo prazo - afinal, os investimentos colapsaram na recessão de 2014 a 2016, e, na retomada, seguiram rateando - quanto a questões relacionadas às condições oferecidas. Em 2016, a diretoria comandada por Maria Silvia Bastos Marques mudaria a taxa de juros do BNDES. O desenho da nova taxa, a TLP, antecipado pelo Estadão/Broadcast no fim de 2016, aproximou os juros do banco de fomento dos cobrados pelo mercado. Era o fim do que economistas críticos chamavam de “meia-entrada” do mercado de crédito, a TJLP.

Por isso, o mercado financeiro segue atento para as possíveis mudanças que a nova gestão do BNDES, capitaneada por Mercadante, poderá fazer na TLP. Uma mudança mais profunda e uma expansão maior no crédito direcionado poderiam tirar potência da política monetária, segundo ex-diretores do Banco Central (BC) ouvidos pelo Broadcast na semana passada.

A mudança na TLP esteve na pauta da elaboração do programa de governo do hoje presidente Lula, no ano passado, ainda que sem muito destaque. Ao longo da campanha, a ex-ministra Míriam Belchior, que trabalhou com propostas para a infraestrutura no programa de governo da candidatura de Lula, e hoje é secretária-executiva da Casa Civil, fez críticas à TLP. O próprio Mercadante teceu suas críticas, em dezembro, no gabinete de transição de governo.

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De lá para cá, o novo presidente do BNDES tem dito, sem detalhes, que os planos não incluem uma volta à TJLP, mas, sim, alguma forma de moderação na TLP - as declarações são mais claras no sentido de negar a possibilidade de voltar a recorrer a aportes do Tesouro, o que ligaria um alerta sobre a possibilidade de aumento nos subsídios fiscais implícitos. A chegada de Mercadante, petista histórico, ao BNDES dá peso político para o banco, o que poderia aumentar as chances de mudanças mais profundas, inclusive na TLP.

Mercadante tem dito que não há espaço fiscal para subsídios nos juros como antes. A questão é que, se o impulso que a nova gestão do banco pretende dar à “reindustrialização” da economia, como Mercadante também tem dito, for via condições mais vantajosas de crédito, uma simples moderação na TLP poderá ser insuficiente. O mesmo vale para o objetivo de impulsionar o crédito para empresas de menor porte. Para o mercado, como disse uma fonte em dezembro, sob condição do anonimato, ideal seria não haver nenhuma mudança, mas a eventual aplicação de redutores à TLP seria melhor do que a recriação de uma TJLP definida administrativamente pelo governo.

Reindustrialização

Ao mencionar o “desafio da “reindustrialização” na cerimônia de posse, Mercadante afirmou que “não se trata da velha indústria”. “Trata-se da nova indústria: digital, descarbonizada, baseada em circularidade e, assim, intensiva em conhecimento. Essa nova indústria exigirá inovação e grandes investimentos na pesquisa aplicada”, discursou o novo presidente do BNDES.

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Segundo Mercadante, a participação da indústria nos desembolsos do BNDES era de 56% do total, em 2006, e caiu para 16%, em 2021. “Temos que reverter isso, isso não pode continuar”, afirmou o presidente do BNDES.

Ao mencionar a nomeação de Rafael Lucchesi, diretor da Confederação Nacional da Industria (CNI), como presidente do Conselho de Administração do BNDES, Mercadante ressaltou que seu objetivo é “colocar a indústria no topo das ações estratégicas do BNDES”.

O novo presidente do banco aproveitou para anunciar que o ex-ministro de Relações Exteriores e atual assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim, e Clemente Ganz, que foi diretor do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), serão indicados como membros do Conselho de Administração.

Mercadante aproveitou para ressaltar a nova ênfase em sustentabilidade. “Não haverá futuro se não preservamos a Amazônia e outros biomas”, afirmou o novo presidente do BNDES, dirigindo-se à ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, que estava na plateia da cerimônia de posse.

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