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Pandora, a maior joalheria do mundo, agora só usa ouro e prata reciclados em seus produtos

Mudança na empresa dinamarquesa foi iniciada em 2020; especialistas, porém, advertem que o termo ‘reciclado’ pode obscurecer a origem de alguns metais

Por Elizabeth Patton
Atualização:

THE NEW YORK TIMES - A Pandora, conhecida por seus braceletes com pingentes de prata esterlina (com pelo menos 92,5% de prata pura) a preços acessíveis, é a maior empresa de joias do mundo em volume: a rede dinamarquesa vende mais de 100 milhões de peças por ano. E, nesta semana, ela anunciou ter atingido a meta de adquirir apenas prata e ouro 100% reciclados para suas coleções.

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A medida foi apontada como um passo importante de uma grande empresa para reduzir sua pegada ambiental. “Queríamos dar o exemplo”, disse o CEO da Pandora, Alexander Lacik. “Se pudermos fazer contribuições positivas para a sociedade por meio do uso de ouro e prata reciclados, isso significa que qualquer pessoa pode fazer isso.”

Ao trabalhar com metais que já foram extraídos, a Pandora não precisa cavar mais fundo em busca de novos materiais, permitindo que a empresa reduza substancialmente suas emissões de gases de efeito estufa. A mineração requer mais energia e recursos do que a reciclagem e é uma das principais fontes de poluição por mercúrio.

A Pandora obtém metais reciclados de refinaria suíça Foto: Tom Lindboe/The New York Times

Em um comunicado à imprensa em 2020, quando anunciou sua mudança para metais reciclados, a Pandora citou estatísticas do World Gold Council e de outras entidades mostrando que o processo de reciclagem de ouro reduz as emissões em cerca de 99% em comparação com a mineração, enquanto a reciclagem de prata reduz as emissões de carbono em cerca de 66% em comparação com a mineração.

Outras marcas, como Prada e Monica Vinader, também começaram a usar metais reciclados. Mas alguns observadores do setor alertam que esses materiais podem parecer mais virtuosos do que realmente são.

Assim como “sustentabilidade”, a palavra “reciclado” pode ter significados diferentes para pessoas diferentes. Essa lacuna de interpretação pode ser problemática, disse Tiffany Stevens, CEO do Jewelers Vigilance Committee (Comitê de Vigilância de Joalheiros), uma organização da cidade de Nova York que se concentra na defesa da ética e das políticas do setor.

Decisão de adquirir apenas prata e ouro 100% reciclados e não utilizar mais materiais recém-minerados já vinha sendo planejada há anos Foto: Tom Lindboe/The New York Times

“Reciclado é um modificador positivo na maioria dos contextos, mas esse não é necessariamente o caso quando se trata de ouro ou prata”, disse ela. O termo “reciclado”, acrescentou, dá às joias feitas com esses materiais uma “auréola verde”, ou uma aura de serem ecologicamente corretas.

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Mas o termo “não dá às pessoas nenhuma resposta clara sobre a origem dos metais”, disse Stevens, razão pela qual sua organização e outras solicitaram à Federal Trade Commission que proibisse o uso de “reciclado” para descrever produtos de joalheria vendidos nos Estados Unidos. Espera-se que a FTC responda a isso este ano, quando lançar atualizações em suas diretrizes de marketing ambiental.

Essas diretrizes atualmente dizem que “é enganoso declarar, direta ou implicitamente, que um item contém conteúdo reciclado, a menos que seja composto de materiais que tenham sido recuperados ou de outra forma desviados do fluxo de resíduos”. No entanto, os metais preciosos geralmente não são considerados resíduos, pois foram derretidos e reutilizados durante séculos e, normalmente, mantêm seu valor.

Grupo alerta que termo 'reciclado' pode dar aos metais uma aura de respeito ao meio ambiente sem indicar a origem dos materiais Foto: Tom Lindboe/The New York Times

O termo “reciclado” também pode obscurecer as origens de alguns metais, como aqueles obtidos pelos chamados cowboy miners, ou refinadores fora da lei conhecidos por usar mão de obra infantil ou realizar operações que financiam as atividades de redes criminosas. Patrick Schein, um refinador e membro da diretoria da Alliance For Responsible Mining (Aliança pela Mineração Responsável), disse que a palavra pode criar a ilusão de que o processo de reciclagem sempre produz “ouro recém-nascido que é eticamente aceitável”.

A Alliance For Responsible Mining, um grupo de defesa, promoveu outras maneiras de melhorar as cadeias de suprimentos do setor de joias, incluindo o apoio das empresas a programas de grupos como a Better Gold Association, que trabalha com mineradores de pequena escala que refinam metais de forma mais responsável.

“A compra de ouro exclusivamente reciclado exclui esse setor, que emprega muitas pessoas que já enfrentam situações de vulnerabilidade”, diz uma declaração de 2020 divulgada pela aliança e outras organizações.

Lacik disse que a mudança para o fornecimento apenas de metais reciclados na Pandora se baseou mais em fatores ambientais do que em como isso poderia afetar os garimpeiros de pequena escala, um grupo responsável por quase dois quintos do volume mundial de mercúrio, de acordo com um relatório de 2018 das Nações Unidas.

Pandora planeja pagar cerca de US$ 10 milhões por ano por metais reciclados usados na fabricação de seus amuletos e outras peças Foto: Pandora via The New York Times

“Você tem de decidir: o tema climático é mais ou menos importante do que determinadas comunidades?”, disse ele. “No nosso caso, achamos que controlar a questão climática e avançar o progresso é um tópico mais importante para a humanidade a longo prazo.”

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Embora o uso de metais reciclados possa reduzir a pegada ambiental da Pandora, a mineração de ouro e prata novos não diminuiu na última década, o que sugere que o interesse crescente das empresas por esses materiais fez pouco para compensar a pegada climática geral da mineração.

Uma equipe de 100 funcionários esteve envolvida na mudança para metais reciclados na Pandora, que passou de diamantes extraídos para diamantes cultivados em laboratório em 2021. A mudança no fornecimento de metais exigiu a adaptação de processos e equipamentos às medidas estabelecidas pelo Responsible Jewellery Council, um grupo de Londres reconhecido por estabelecer padrões globais.

Entre os fornecedores de metais reciclados da Pandora está a MKS Pamp, uma refinaria e comerciante suíça. “Conhecemos cada uma das fontes de nossa cadeia de suprimentos e podemos dizer em gramas o que vai para quem”, disse Xavier Miserez, chefe de vendas da refinaria. “O risco zero não existe, mas tentamos mitigar o máximo possível.”

A Pandora planeja pagar cerca de US$ 10 milhões por ano por metais reciclados. Isso é mais do que estava pagando por metais recém-minerados, disse Lacik, “mas esse é um custo que estamos dispostos a absorver”.

“Também sou realista quanto à importância disso para os compradores de joias”, acrescentou ele, observando que a maioria é motivada por dois fatores principais: design e preço. “Alguns podem se perguntar sobre a produção sustentável, mas não muitos.”

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