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Por que a mudança da política de preços da Petrobras tende a ser ruim no longo prazo

Sem a visibilidade de como vai funcionar a nova sistemática de reajustes daqui para a frente, analistas temem que a porta esteja aberta para as ingerências políticas que já levaram a estatal a perdas bilionárias no passado

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Por Redação

O anúncio da nova política de preços da Petrobras, em substituição ao Preço de Paridade Internacional (PPI), sistema instituído no governo de Michel Temer, veio acompanhado de uma boa noticia para os consumidores: a queda do preço dos combustíveis. Essa redução terá impacto na inflação do ano, que pode ser até 0,39 ponto porcentual menor que o esperado anteriormente, segundo projeção da XP. E IPCA menor também pode acelerar a queda dos juros, hoje na casa de 13,75% ao ano e alvo de constantes reclamações do governo.

Mas, apesar dessas notícias positivas do ponto de vista do consumidor, a mudança na Petrobras embute um risco, no médio e longo prazos, que ninguém conseguiu medir. Como não ficou claro qual será exatamente a regra que vai balizar o reajuste de preços a partir de agora, há um temor de que a estatal volte a ser usada, por exemplo, para controlar a inflação, como já ocorreu no governo Dilma Rousseff - com resultados catastróficos para a empresa.

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Segundo comunicado ao mercado divulgado na manhã da terça-feira, 16, a nova estratégia de determinação de preços da Petrobras será fundamentada em dois critérios: o primeiro é o “custo alternativo do cliente”, que contempla os fornecedores de combustíveis como referência e é considerado mais objetivo pelo mercado, além de semelhante ao antigo PPI. O segundo, tido como mais nebuloso, é o “valor marginal” para a Petrobras, baseado no “custo de oportunidade” da companhia.

Para o analista do setor de Petróleo da Genial Investimentos, Israel Rodrigues, o critério de valor marginal como regra para definição de preços é pouco transparente e traz dúvidas sobre como a companhia vai reagir caso a cotação do petróleo no mercado internacional comece a subir de forma expressiva.

“Se o preço do petróleo explodir, a Petrobras vai manter os preços artificialmente mais baixos? Essa é a nossa principal preocupação com a nova estratégia comercial. Ela coloca algumas referências, como custos alternativos, mas são coisas que não conseguimos precificar tão bem em comparação com a regra antiga”, afirmou Rodrigues.

Na avaliação de Pedro Rodrigues, sócio-diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a nova estratégia de preços da Petrobras não ficou clara, mas com certeza deixa o preço da estatal menos transparente. “Com o PPI você tinha previsibilidade e a tendência do que acontecia. Essa previsibilidade acabou”, disse.

Para ele, as variáveis colocadas no comunicado da estatal, como o custo alternativo do cliente e o valor marginal, são difíceis de serem conhecidas pelo mercado, o que deixa muitas de forma geral, tanto para analistas, distribuidores, importadores e consumidores.

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“O Brasil é um país que não tem um passado muito bom quando se fala em menos transparência de preços. Será que a Petrobras vai deixar dinheiro na mesa? Se eu estou com dificuldade de entender essa conta, imagina o acionista da Petrobras”, disse Rodrigues.

Previsibilidade de preços

O PPI foi implantado em 2017, como uma forma de dar previsibilidade ao mercado sobre a formação de preços da Petrobras, jogada no centro das irregularidades investigadas na Operação Lava Jato e acumulando prejuízos bilionários nos anos anteriores, durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff: R$ 21,6 bilhões em 2014 e R$ 34,8 bilhões em 2015.

Vem da época de Dilma uma lembrança cristalina do uso eleitoral da Petrobras: para conter a inflação e viabilizar sua reeleição, em 2014, a ex-presidente manteve os preços congelados por meses, obrigando a estatal a vender gasolina, diesel e gás a preços inferiores aos praticados no mercado internacional. Como a Petrobrás importa parte do que vende, isso equivale a dizer que ela vendia com prejuízo - o que se refletiu nos balanços.

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Em setembro de 2014, a ex-presidente afirmou que não era possível querer que o Brasil pagasse um preço composto com base nos custos nacionais e o associasse a um mercado internacional. “Isso não quer dizer que não temos que buscar, da nossa forma, métodos de avaliar e valorizar o combustível, de reajustá-lo ou não”, disse, à época.

O ex-presidente Jair Bolsonaro também se insurgiu contra os reajustes de preços dos combustíveis, que lhe estavam custando popularidade às vésperas da eleição presidencial de 2022. Tentou trocar o presidente da estatal, mas o PPI foi mantido por todos os executivos que colocou no cargo. Para reduzir o preço, acabou sendo forçado a mexer nos impostos, o que provocou problemas para a arrecadação do governo.

Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (E), e o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, em anúncio da mudança na política de preços da estatal  Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

Agora, na gestão Lula, a fórmula de reajustes foi modificada. Segundo o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, a nova sistemática, por levar em conta também fatores internos, vai reduzir a volatilidade dos preços ao consumidor. Mas como não ficou claro como ela vai funcionar, a desconfiança é que questões político-ideológicas vão começar a dar as caras de novo.

Por enquanto, com os preços do petróleo comportados - o barril do óleo tipo Brent está cotado na casa dos US$ 75, muito abaixo dos US$ 140 que chegou a atingir no início da guerra na Ucrânia -, não há sinais de problemas à vista. Mas há muita desconfiança sobre o que vem à frente. “O teste da nova política vai ser quando o Brent alcançar US$ 100 (o barril)”, diz Ilan Arbetman, analista da Ativa Investimentos. / Denise Luna, Jorge Barbosa, Marlla Sabino e Antônio Temóteo

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