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Reforma ampla

Aprovar a CBS, deixando para depois a discussão sobre o ICMS e o ISS, mais atrapalha que ajuda

Por Bernard Appy

Em artigo publicado ontem, Ernesto Lozardo e Melina Lukic defendem que a reforma tributária deveria ser iniciada por meio da criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que trata apenas de tributos federais, deixando para um segundo momento a reforma dos tributos estaduais (ICMS) e municipais (ISS). Em que pese a qualidade técnica dos autores, sua análise política – que se contrapõe ao projeto de uma reforma tributária ampla, que inclua o ICMS e o ISS – está equivocada por diversos motivos.

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Em primeiro lugar, os autores alegam que a aprovação de uma reforma apenas dos tributos federais seria politicamente mais fácil. Este é um argumento enganoso, pois o custo político da aprovação da CBS não parece ser menor que o de uma reforma ampla, em particular no que diz respeito à resistência do setor de serviços, que – em boa medida por incompreensão – se opõe à adoção de uma alíquota uniforme na tributação do consumo. Ao contrário, a CBS pode gerar até mais resistência do setor de serviços, por causa da ausência de transição. Já as propostas de reforma ampla (PEC 45, da Câmara dos Deputados, e PEC 110, do Senado) propõem uma transição entre cinco e dez anos, que mitiga muito o efeito da mudança de preços relativos.

Para reduzir o impacto da falta de transição sobre o setor de serviços, os autores propõem uma medida desacertada, que seria a redução do porcentual de 32% aplicado para os prestadores de serviços no regime do lucro presumido. Essa medida amplificaria uma das maiores distorções do modelo brasileiro de tributação da renda, que é a baixa tributação de empresas cujo lucro efetivo é muito superior a 32% do faturamento (podendo chegar a 80% ou 90% em alguns casos). O pior é que seriam favorecidas mesmo empresas beneficiadas pela CBS – como os prestadores de serviços que estão no meio da cadeia produtiva e darão crédito integral para seus clientes.

É muito importante que as alterações no sistema tributário do País sejam aprovadas. Foto: Najara Araújo/Câmara dos Deputados

Em segundo lugar, é verdade que a inclusão do ICMS e do ISS na reforma tributária pode exigir o aporte de recursos da União para o Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), o que gera alguma complexidade política. Mas essa é uma equação muito mais fácil de ser resolvida numa reforma ampla que numa reforma apenas dos impostos subnacionais, em que a União tem menos interesse no resultado.

Se o custo do FDR para a União não for muito elevado, o impacto positivo do maior crescimento resultante da reforma sobre as receitas federais certamente será mais que suficiente para financiá-lo. O que não faz sentido é a União alegar que não tem recursos para financiar o FDR ao mesmo tempo que se discute a destinação de 30% dos recursos da partilha do pré-sal para os Estados e municípios, sem nenhuma contrapartida.

Por fim, os autores mencionam que a alíquota de 12% da CBS seria um indicativo de que a alíquota do IBS criado pela PEC 45 seria muito elevada, o que dificultaria sua aprovação. O que os autores esquecem é que a alíquota do IBS, ao contrário da CBS, é exatamente aquela que mantém a carga tributária atual, apenas explicitando o que a população já paga. Adicionalmente, há várias características do modelo da PEC 45 que fazem com que a alíquota seja mais baixa (como a dedução da receita da Cide-combustíveis, que será calibrada para manter a tributação atual da gasolina), além de haver fortes indícios de que a alíquota de 12% da CBS está superestimada.

Em suma, ao contrário do que alegam os autores, tudo indica que a aprovação da CBS, deixando para um segundo momento a discussão sobre o ICMS e o ISS, mais atrapalha que ajuda. De um lado, porque consumiria a energia política disponível para a aprovação de uma reforma ampla. De outro, porque, depois de criada a CBS, o governo federal tende a perder o interesse na criação de um IVA subnacional. Por fim, porque o desenho da CBS é tal que exige uma alíquota mais alta que a necessária para garantir a mesma receita no IBS – o que pode gerar resistências à extensão do modelo para o ICMS e o ISS.

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*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL