Modelo híbrido, presencial ou EAD: qual será o futuro da pós-graduação?

Ensino a distância ganhou mais destaque no pós-pandemia; 65% dos alunos estudavam nesta modalidade no último ano

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Por Paulo Reda
Atualização:

A pandemia consolidou um modelo de pós-graduação, com amplo destaque para o ensino a distância (EAD). O total de alunos nesse formato no País foi de 693 mil, em 2016, para 1,42 milhão em 2022, conforme os dados do Instituto Semesp. Em 2019, antes da chegada da pandemia, 779 mil estavam em aulas presenciais e 443 mil no EAD. Já em 2022, houve uma inversão, com 487 mil no modelo presencial e 922 mil na modalidade EAD – quase 2 em cada 3.

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Para Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp, entidade que representa as faculdades particulares, é preciso considerar que se vive agora um momento de estabilidade no número de alunos, mas de transição de modelo.

“Hoje, o modelo de oferta está descasado da demanda. O presencial puro não tem mais espaço, pois ele custa muito caro para a vida do aluno de pós-graduação, que tem de se deslocar duas, três vezes por semana para um local. E o EAD para esse público também perdeu sentido. Porque quando se faz uma pós se pensa no contato presencial, no network, na convivência, e o aluno também não quer aulas gravadas, estáticas”, afirma.

Para ele, nos próximos anos as instituições devem avançar para um modelo misto, que mantenha momentos presenciais – “que sejam marcantes, como palestras com presidentes de empresas, seguidos por exemplo de um coquetel, para fazer a rede de contatos – com momentos remotos – “mas ao vivo, em lives, com participação”. Ou seja, um formato com conteúdos tanto síncronos quanto assíncronos.

Perfil

Ocorre a ascensão de um novo modelo, que privilegia não apenas a pesquisa acadêmica, mas também necessidades específicas do mercado de trabalho. Para Abílio Baeta Neves, professor aposentado da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e ex-presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento Profissional de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão federal responsável pelo cadastramento dos cursos de pós-graduação, durante muito tempo se teve como parâmetro a pesquisa e a docência, o que vem mudando nos últimos anos. “Cresceu a demanda fora do meio acadêmico muito mais do que esperávamos. É a pós-graduação por crescimento salarial, desenvolvimento pessoal. É o fim de um ciclo.”

Especialização é buscada por quem deseja alavancar a carreira. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Na visão de Neves, a primeira mudanças necessária no sistema de pós-graduação é fazer que o mestrado volte a ser visto como formação profissional, e não apenas acadêmica. “O pesquisador começa com o doutorado. Atualmente, 50% dos estudantes no Brasil terminam o doutorado com mais de 30 anos. Nos Estados Unidos, esse porcentual é de 10%. O mestrado é uma instância de formação mais elevada, mas profissional”, afirma.

Ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Maria Inês Fini diz que atualmente o sistema de educação continuada exige uma mobilidade muito maior por parte das instituições que oferecem esses cursos. “Em muitos casos, a educação corporativa está anos luz à frente da universidade tradicional em termos de inovação. Hoje o mundo do trabalho muda a um ritmo disruptivo”, diz. “Uma série de conceitos está ficando para trás. Não pode pegar papel novo e embrulhar ideia antiga”, afirma.

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Nesse ponto, há ainda dois elementos a considerar: gênero e etnia. O levantamento mais recente do Semesp – novos dados estão sendo tabulados e devem ser apresentados neste mês – aponta predominância maior do sexo feminino, com cerca de 65% das vagas ocupadas em cursos de pós-graduação – praticamente duas em cada três.

Quando, contudo, o quesito é a raça, ainda existe uma grande disparidade. Em 2016, apenas 5,8% dos estudantes de pós-graduação se declaravam pretos, número que teve uma pequena alta em 2022, para 8,5%. “O Brasil ainda precisa atuar de forma decidida na aplicação de políticas de cotas nos cursos de pós-graduação”, afirma Rodrigo Capelato.

Regulamentação

O avanço na pós-graduação, porém, aumenta as dúvidas quanto à atual regulamentação. Recentemente, o governo federal lançou a proposta de criar uma agência específica para cuidar do ensino superior – após uma análise ruim do último ciclo avaliativo de faculdades, via Enade.

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O cenário preocupa as instituições de ensino. “Houve uma aceleração desenfreada da educação distância, com uma guerra de preços desenfreada. É preciso olhar isso com cuidado. Mas antes de eu sair criando agência reguladora, a primeira coisa que eu preciso é repensar os instrumentos de avaliação”, diz Capelato. “Há uma percepção de problemas, mas os instrumentos não estão captando isso. No EAD, 87% tem nota 4 e 5 (no Enade, cuja nota vai até 5).”

Segundo ele, deve-se reconsiderar parâmetros. Mas o MEC dentro de suas secretarias de regulação, já possui pessoal qualificado para fazer a devida análise das instituições. /COLABOROU CLÁUDIO VIEIRA

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