A Copa América virou um Fla-Flu da política em Brasília e nos rincões do País, polarizando mais uma vez um Brasil rachado há dois anos em quase tudo, agora também no futebol. Nunca durante esses mais de 15 meses de pandemia, o futebol foi tão discutido como na última semana, em que o presidente Jair Bolsonaro, apalavrado com CBF e Conmebol, anunciou a realização da Copa América no Brasil, passando por cima de tudo e de todas as discussões que pudessem ser feitas sobre o assunto, principalmente porque os Estados brasileiros ainda se dobram diante da covid-19. Mas nem Bolsonaro nem o presidente da CBF, Rogério Caboclo, muito menos Alejandro Domínguez, da Confederação Sul-americana, deram a mínima para esta condição e cada um se envolveu por vaidade própria.
A Conmebol queria salvar sua competição que não vale nada, mas que gera crédito de R$ 650 milhões aos seus cofres. A CBF viu chance de se reaproximar da Conmebol e voltar a ‘mandar’ no futebol do continente, como nos tempos de João Havelange e Ricardo Teixeira. E Bolsonaro entrou nessa porque o futebol tem sido uma de suas vitrines e palanques, fazendo sempre que pode a política da Roma Antiga, de pão e circo para o povo. “Se depender de mim, vai ter Copa América”, disse.
O presidente se vale do verde e amarelo desde que assumiu o posto. Seus adeptos tomaram para si as cores da seleção e agora defendem o futebol como nunca. Realizar a Copa América no Brasil virou questão de honra. E, claro, o assunto foi polarizado. Quem defende o torneio estaria do lado de Bolsonaro. Quem não o defende, seria contra o governo. Esse é o entendimento comum das ruas e das redes. Assim, o técnico Tite, do Brasil, que disputa as Eliminatórias, foi taxado de antigoverno porque se posicionou ao lado dos seus jogadores ao informar que o elenco vai se manifestar sobre o evento. Os atletas não querem a Copa América.
Mas somente Tite entrou nesse Fla-Flu que virou a competição. Os jogadores não estão contra o presidente. Muitos até já estiveram com ele em Brasília. Neymar e seu pai negociaram problemas do Fisco com Bolsonaro.
A disputa entrou na CPI da Covid e fez com que senadores apelassem aos jogadores para não jogarem o torneio, a exemplo de Renan Calheiros (MDB-AL), que também é relator da CPI. Ele pediu primeiramente a Neymar e depois aos atletas de Tite para abrirem mão da competição. Em Brasília, que será uma das sedes da Copa América, houve carreata com o slogan “Copa não, vacina sim”, numa referência à condição da pandemia no Brasil. O ato, em outras cores, nos fez lembrar as manifestações contra a Copa de 2014. Naquela ocasião, também se dizia ‘não’ ao torneio e se falava em mais hospitais.
Os minutos desse Fla-Flu estão sendo jogados e ainda prometem lances interessantes nesta semana. O maior deles talvez esteja com os jogadores da seleção, que prometem se posicionar amanhã sobre o tema, em manifesto, após o jogo do Brasil com o Paraguai, pelas Eliminatórias da Copa. Vão pedir dispensa do torneio.
Havia outra jogada sendo tramada pelo presidente da CBF: demitir Tite, sua comissão e até mesmo Juninho Paulista, que também está fechado com o atletas. Mas ele foi afastado antes pelo Comitê de Ética da CBF pela acusação de assédio. Isso inviabiliza mudanças na seleção. Se uma peça desse dominó caísse, todas as outras poderiam cair juntas. Se Tite fosse demitido por Caboclo, talvez o novo treinador tivesse de contar com outros jogadores também. A não ser que eles roessem a corda. E isso o capitão Casemiro disse que não iria acontecer.