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Ausência de sangramento externo não comprova ‘fakeada’; Bolsonaro teve hemorragia interna

Publicação engana ao sugerir que facada em Bolsonaro foi armação por falta de sangramento externo

Por Milka Moura

O que estão compartilhando: vídeo que mostra um homem visitando o local em que Jair Bolsonaro (PL) foi colocado após sofrer uma facada, em 2018. Ele destaca que o ex-presidente não sangrou durante o tempo em que ficou deitado, antes de ser levado para cuidados médicos. Um texto sobreposto à peça chama o ataque de “fakeada” — uma junção de “fake” (falso, em inglês) e “facada” — e pede uma “CPMI da facada” para apurar o caso.

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: a ausência de sangue, destacada pelo autor da publicação no Instagram, não indica que o atentado foi falso. Especialistas explicam que em muitos casos de facadas no abdome o sangramento é interno. Bolsonaro chegou à Santa Casa de Juiz de Fora com hemorragia interna.

Jair Bolsonaro foi esfaqueado durante campanha presidencial em 2018 Foto: Raysa Leite/AFP

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Saiba mais: Em 6 de setembro de 2018 o ex-presidente foi atacado enquanto fazia campanha em Juiz de Fora, Minas Gerais. Ele estava sendo carregado por apoiadores quando foi golpeado no abdome por Adélio Bispo de Oliveira, que está em um presídio federal em Campo Grande (MS).

Desde então, o caso é alvo constante de questionamentos e peças de desinformação. A falta de sangue nas imagens que flagraram o momento em que Bolsonaro é esfaqueado é uma das narrativas levantadas para dizer que o ataque foi uma farsa. Porém, a ausência não necessariamente é uma comprovação de que a agressão é falsa. É o que diz o médico José Gustavo Parreira, cirurgião com área de atuação em cirurgia do trauma e membro da Sociedade Brasileira de Atendimento Integrado ao Traumatizado (SBAIT).

“O fato de não haver sangramento externo não pode contradizer que ele levou uma facada, por que muitas vezes não existe [sangramento externo] mesmo”, diz. “No caso do abdômen, quando a faca entra dentro da barriga da pessoa, vai sangrar dentro da barriga e raramente vem para fora”, explicou Gustavo.

Em 2019 o cirurgião Luiz Henrique Borsato, que operou Bolsonaro no dia da facada, também explicou ao Estadão o motivo do sangramento não ter sido visível. “Não é um sangramento como se vê em televisão, que fica aquela roda de sangue. O que sangrará é para dentro do abdômen. Ele poderia ter perdido um volume muito maior, e não seria exteriorizado para o corpo”, disse. Segundo Borsato, Bolsonaro perdeu entre 1,5L e 2L de sangue.

O ex-presidente sofreu lesões nos intestinos grosso e delgado. A facada também atingiu uma veia no abdome. No dia do ataque, médicos da Santa Casa de Juiz de Fora informaram à imprensa que o então candidato chegou ao hospital com sinais de choque e hemorragia interna.

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Desde que foi esfaqueado, Bolsonaro já passou por cinco cirurgias abdominais. Três aconteceram após o episódio em 2018, a quarta foi realizada em 2019 e a mais recente em janeiro deste ano.

Em 2018, a Polícia Federal (PF) finalizou o primeiro inquérito sobre o ataque e concluiu que Adélio Bispo agiu sozinho e foi motivado por “inconformismo político”. Em 2022, a PF concluiu um segundo inquérito sobre o caso, que descartou a existência de mandantes para o crime. Em 2021, A PF reabriu uma investigação sobre o atentado, que está em andamento.

Até a publicação dessa checagem, o vídeo destacado que viralizou nas redes sociais contava com 56.732 visualizações no Instagram.

Outro lado

O documentário “Bolsonaro e Adélio - Uma Fakeada no Coração do Brasil”, foi apresentado em 2021 pela TV 247. O Estadão Verifica entrou em contato com Joaquim de Carvalho, autor da obra. Em nota, ele afirmou não ter exposto nenhuma conclusão sobre a falta de sangue após o atentado. Joaquim também defendeu que o documentário “deve ser visto no todo para que se tire alguma conclusão”. Confira a declaração na íntegra:

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

“O documentário deve ser visto no todo para que se tire alguma conclusão. O que chamo de Fakeada é a narrativa oficial sobre o caso, divulgada pela imprensa de uma maneira geral. Adélio não era o militante de esquerda apresentado. O único documento político encontrado em seus pertences foi uma carta em que pede desfiliação do PSD. Esse fato só foi divulgado por mim, dois anos e meio depois, embora a Polícia Federal tivesse a carta desde o início. Adélio, efetivamente, tinha sido filiado ao PSOL sete anos antes, mas militou posteriormente no PSD de Uberaba, a que pensou ter sido filiado. Mostrei o local onde Bolsonaro foi colocado naquele 6 de setembro, o piso de uma lanchonete. E efetivamente não há sangue. Mas não expus nenhuma conclusão. O documentário mostra omissões, inconsistências e mentiras que prevaleceram na narrativa oficial, divulgado pela imprensa de uma maneira geral sem contestação, repito. O inquérito sobre o episódio de Juiz de Fora não está encerrado, é bom lembrar.”

Como lidar com postagens do tipo: O atentado à Jair Bolsonaro foi um fato de grande repercussão nacional que até hoje é alvo de muitos debates. Em casos assim, é necessário ter atenção redobrada ao compartilhar informações virais na internet. O Projeto Comprova já listou o que é verdade e o que é falso em relação ao caso.

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