WASHINGTON - O governo de Donald Trump determinou nesta segunda-feira, 28, novas sanções à estatal de petróleo venezuelana, a PDVSA. Todo o dinheiro pago pela compra de petróleo da Venezuela pelos Estados Unidos irá para contas bloqueadas e só poderá ser sacado quando "um governo democraticamente eleito estiver no controle" do país, segundo o secretário do Tesouro Steve Mnuchin. O objetivo das sanções é impedir o acesso da cúpula chavista e do presidente Nicolás Maduro à renda do petróleo e pressionar os militares, que comandam atualmente a PDVSA, a mudar de lado.
As sanções também vão congelar quaisquer bens que a PDVSA possuir nos Estados Unidos e impedir empresas americanas de fazer negócios com a estatal. "Os Estados Unidos estão punindo os responsáveis pelo declínio trágico da Venezuela e seguirão usando medidas diplomáticas e econômicas para apoiar o presidente interino Guaidó", disse Mnuchin.
"Essa medida também impedirá Maduro de desviar recursos da PDVSA. O caminho para a remoção das sanções será transferir o controle da empresa para o presidente interino e um governo democraticamente eleito", acrescentou.
Nesse sentido, pouco antes do anúncio, o líder opositor venezuelano, Juan Guaidó, que na semana passada se declarou presidente interino do país, disse nesta segunda-feira, 28, que dará início ao processo de nomeação de novos diretores da PDVSA, a estatal venezuelana do petróleo, e da Citgo, a filial americana da empresa. Guaidó afirmou também que o Parlamento assumirá o controle de contas do Estado venezuelano em instituições financeiras internacionais.
Reconhecido por grande parte da comunidade internacional, principalmente no continente americano, Guaidó pretende com isso ter acesso a recursos financeiros que antes eram controlados pelo presidente Nicolás Maduro.
As exportações de petróleo venezuelano para os Estados Unidos caíram bastante nos últimos anos, principalmente a partir do agravamento da crise no país sul-americano. Em 2017, segundo o Departamento de Energia, os Estados Unidos compravam diariamente 500 mil barris, frente a 1,2 milhão de 2008.
Apesar disso, a Venezuela oscila entre o terceiro e o quarto lugar de maior fornecedor de petróleo dos Estados Unidos, com cerca de 6% das compras americanas no mercado mundial da commodity.
Para economistas, a crise deve ter, no entanto, grave impacto na população. Maduro, que por enquanto parece ter o respaldo da cúpula das Forças Armadas, acusa os Estados Unidos de planejarum golpe de Estado contra ele ao apoiar a decisão de Guaidó e incentivar outros países a fazerem o mesmo.
Chavismo sem acesso a recursos
A estratégia arriscada e incomum de reconhecer um governo alternativo sem poder de facto tem por trás um objetivo econômico: bloquear o acesso do regime chavista aos recursos provenientes da exportação de petróleo e ativos venezuelanos no exterior, o que traz consigo inúmeras implicações jurídicas e financeiras.
O principal alvo dessa estratégia é a Citgo, a filial americana da PDVSA com sede em Houston, responsável por grande parte das receitas da empresa.Outro alvo são os US$ 1,2 bilhão em reservas de ouro depositadas no Banco da Inglaterra, que correspondem a 15% das reservas em moeda forte do país.
Caso a União Europeia se junte aos países americanos que reconhecem o governo da oposição, Maduro poderia ter ainda mais dificuldades para vender o petróleo venezuelano, ampliando os efeitos da crise. Bruxelas deu até o fim desta semana para Maduro organizar eleições livres no país.
"Se Maduro continua no poder, a Venezuela pode sofrer uma catástrofe humanitária”, avaliar o economista-chefe da Torino Capital, Francisco Rodríguez.
Na avaliação dele, o cenário é similar ao ocorrido na invasão da Líbia em 2011, quando o governo do presidente Barack Obama congelou ativos do governo líbio durante a Primavera Árabe. Em consequência disso, a produção de petróleo líbia caiu 70%.
A diferença na comparação com a Venezuela é que Caracas ainda tem aliados e clientes importantes que reconhecem Maduro, como é o caso da Rússia, da China, Índia, Turquia e Malásia. Esses países, em tese, podem absorver os 500 mil barris que são vendidos diariamente aos Estados Unidos.
O problema para os chavistas, nota Rodríguez, é que sem acesso a bancos europeus e americanos, a logística dessas exportações ficaria muito complicada. Segundo o economista Russ Dallen, da Caracas Capital, os custos da operação também aumentariam, porque os portos venezuelanos não estão aptos a carregar navios para países tão distantes. Com isso, a escassez de alimentos e remédios, que na Venezuela são importados, tende a se agravar.
Efeitos colaterais Se Guaidó conseguir tomar o controle da Citgo, haveria, no entanto, um efeito colateral. Em virtude de um acordo fechado com a Rússia em 2017, a estatal Rosneft pode tomar 49.9% do controle da empresa se o governo venezuelano der calote nos pagamentos de empréstimos aos russos. Ou seja, se a oposição não honrar esses compromissos, Moscou tomaria conta de um ativo estratégico petrolífero nos próprios Estados Unidos. “É uma situação incrivelmente complexa”, explica Alen. “A perda da Citgo e do mercado americano afetará diretamente o fluxo de caixa do governo, o que levará a mais fome e mais gente fugindo do país.” A produção venezuelana de petróleo está em crise há pelo menos sete anos, com o sucateamento da PDVSA e a fuga de cerébros após o presidente Hugo Chávez demitir diretores críticos a seu governo. Nos últimos anos, a queda se acentuou e hoje a produção é só um terço do que era há 20 anos. Rodríguez calcula que se o impasse entre Guaidó e Maduro continuar, a economia deve se contrair 30% este ano e a inflação deve chegar a assombrosos 23 milhões por cento. No caso de uma transição, o economista Orlando Ochoa estima que a comunidade internacional teria de desempenhar um papel-chave, para que Guaidó consiga reorganizar a economia do país e sua dívida externa./ AFP, REUTERS, AP e EFE
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