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Fábricas de indígenas que utilizam folhas de coca desafiam marca registrada da Coca-Cola

Fabricante de energéticos, cervejas e bebidas alcoólicas à base de coca argumenta que direitos dos povos originários foram violados e pede que proteção da marca registrada seja revogada

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Por María Luisa Paúl (Washington Post) e Bryan Pietsch (Washington Post)
Atualização:

A Coca-Cola pode ser uma das marcas mais conhecidas do mundo. Mas o que dizer de apenas metade do nome?

Uma empresa de indígenas na Colômbia agindo, segundo afirma, “em defesa da folha de coca”, está pedindo ao governo para revogar a patente centenária da gigante dos refrigerantes sobre a palavra “coca”.

A planta de coca, que além de ser usada para produzir Coca-Cola também é a matéria-prima da cocaína, é um dos principais cultivos legalizados em vários países sul-americanos.

Campo de cultivo de coca em zona rural da Colômbia.  Foto: Joaquin Sarmiento/AFP

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A Coca Nasa, que fabrica energéticos, cervejas e bebidas alcoólicas feitas de coca, argumenta que a proteção de marca registrada ampliada para a multinacional sediada em Atlanta viola “direitos fundamentais de povos indígenas”. O mecanismo tem sido usado “abusivamente” pela Coca-Cola Company, afirmou a empresa colombiana em um comunicado, e deveria ser rescindido.

O que motiva a ação, segundo a Coca Nasa, é o que a empresa qualifica como um histórico de intimidação por parte da Coca-Cola contra empresas menores para que suas exigências sejam cumpridas.

“É como se Davi e Golias estivessem lutando em razão do colonialismo”, disse ao Washington Post David Curtidor, cofundador da Coca Nasa. “Essas gigantes chegam aqui pensando que têm direito à nossa herança cultural e que podem exigir que paremos de usar a coca. O que estamos dizendo é: ‘Chega’.”

Um porta-voz da Coca-Cola respondeu a uma lista de perguntas do Post sobre as relações da empresa com comunidades indígenas, o uso que faz da planta de coca e a disputa com a Coca Nasa com um comunicado.

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“A Coca-Cola Company respeita todas as comunidades e suas tradições, bem como as leis e regulamentos de cada país onde opera”, disse o porta-voz, Scott Leith.

A batalha entre as duas empresas ocorre há quase duas décadas — a maior parte da história da Coca Nasa.

Curtidor e sua sócia, Fabiola Piñacué, fundaram a Coca Nasa, batizada em homenagem a um povo indígena do sul da Colômbia, em 1998. Seu objetivo era desestigmatizar a coca, que é cultivada por comunidades andinas para fins medicinais e cerimoniais há séculos. Ao vender bebidas, alimentos e suplementos feitos com a planta, disse Curtidor, a Coca Nasa tentou “mostrar a outra face da coca e ajudá-la a se livrar de sua imagem suja”.

Em sua forma natural, a folha de coca não surte os efeitos narcóticos da cocaína — assim como as sementes de papoula não são a mesma coisa que a heroína. Para fazer cocaína, as folhas de coca devem ser decompostas e processadas com produtos químicos para fabricar uma pasta que pode ser reduzida a um pó branco. Desde a década de 60, porém, quando a Colômbia se tornou o centro global de produção de cocaína, a coca virou símbolo da violência, das mortes e do vício que seu uso provocou.

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Um tratado de 1961, até hoje validado pela Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes, exige a “remoção de todos os arbustos de coca que crescem na natureza” e proíbe a distribuição de produtos com quantidades mínimas da planta. Mas uma brecha permite que as folhas sejam vendidas internacionalmente se lhes for retirado o alcalóide da cocaína, com intenção de produzir um “agente flavorizante” — que a Coca-Cola usa em seu produto.

“E tudo isso é incrivelmente irônico e hipócrita, porque nossos produtos foram proibidos e nossa herança cultural, destruída, enquanto a Coca-Cola foi autorizada a continuar vendendo sem problemas”, disse Curtidor.

A cocaína era um “ingrediente primário” da Coca-Cola no fim do século 19, de acordo com a agência antidrogas dos Estados Unidos (DEA), antes de “sua forma bruta” ser removida do produto. “Hoje, o extrato das folhas de coca, uma versão decocainada, é fabricado nos EUA e usado no sabor da Coca-Cola”, diz a DEA. (A Coca-Cola afirma que seu refrigerante “não contém cocaína nem qualquer outra substância prejudicial, e que a cocaína nunca foi um ingrediente adicionado à Coca-Cola.”)

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O primeiro entrevero entre Curtidor, da Coca Nasa, e a gigante americana dos refrigerantes ocorreu em 2007, disse Curtidor, depois que a Coca Nasa lançou sua bebida energética Coca Sek e a Coca-Cola respondeu com um processo de violação de patente. O processo foi rapidamente rejeitado, mas o produto foi banido temporariamente das prateleiras depois que a Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes enviou ao Ministério das Relações Exteriores da Colômbia uma carta pedindo que as autoridades colombianas que explicassem de que maneira a bebida não violava o tratado de 1961. A Coca Nasa apelou da proibição e venceu.

Planta da coca é usada para produzir a Coca-Cola e é também matéria-prima para cocaína.  Foto: Joaquin Sarmiento/AFP

Quando a Coca Nasa lançou a Coca Pola — “pola” é uma gíria colombiana que define cerveja — a resposta foi semelhante. A Coca-Cola enviou uma carta exigindo que a empresa colombiana deixasse “permanentemente de usar o nome Coca Pola ou qualquer termo semelhante que pudesse ser confundido com as marcas comerciais” detidas pela empresa americana. Apesar de Coca Pola rimar com Coca-Cola, Curtidor insistiu que o termo era apenas “a maneira óbvia de batizar uma cerveja feita com coca”.

Em sua carta, a Coca-Cola disse que a Coca Nasa tinha 10 dias para agir. Para Curtidor, foi a gota d’água.

“Foi quando dissemos: ‘Na verdade, não. Vocês que têm 10 dias para explicar quem lhes deu permissão para usar a planta de coca e quem lhes deu permissão para usar o nome de um elemento fundamental da nossa cultura em seus produtos’”, afirmou Curtidor. “Nós lhes enviamos uma carta com esse questionamento e, bem, eles nunca responderam.”

Essa ausência de resposta, disse Curtidor, levou a Coca Nasa a pedir, neste mês, que agência de marcas e patentes da Colômbia intervenha. De seu ponto de vista, ter registrado a patente sem consultar a comunidade indígena Nasa equivaleu a uma “prática abusiva e usurpadora, que viola nossos direitos”.

A Superintendência de Indústria e Comércio da Colômbia, afirmou ele, tem até 20 de setembro para responder à reivindicação de sua empresa — que, se reconhecida, proibirá a gigante das bebidas de usar seu nome icônico. O gabinete da superintendente não respondeu a um pedido de comentário.

Curtidor disse que a comunidade indígena não se oporia à Coca-Cola usar “coca” em seu nome — “se eles pedissem educadamente”.

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A Coca-Cola já combateu empresas menores por supostas violações de marcas registradas antes. Ganhou um processo contra uma fábrica norueguesa que vendia um refrigerante chamado Jallasprite, cujo nome um tribunal decidiu que era parecido demais com Sprite. E desistiu de um processo contra uma empresa australiana que vendia um chá gelado chamado Honest Tea, cujo nome batizava também uma bebida produzida por empresa que a Coca-Cola havia adquirido. A revista Salon chamou o caso de “intimidação judicial”.

“O problema essencial é a respeito do direito da Coca-Cola”, disse Curtidor. “Se eles viessem e pedissem permissão, se sentassem para dialogar e discutissem alguma compensação, nós não teríamos problemas, e estou certo de que poderíamos chegar a um acordo. Mas você não pode simplesmente nos intimidar e esperar que fiquemos sentados de braços cruzados só porque somos uma empresa menor.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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