BUENOS AIRES - A declaração conjunta do Mercosul que definiu o futuro da Venezuela no bloco prevê em seu quarto e último artigo uma suspensão automática caso o país não cumpra as normas de adesão até 1.º de dezembro, sem necessidade de uma votação. A perda do status só seria revertida se Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai combinassem com Caracas os termos.
"A persistência do descumprimento levará ao fim do exercício dos direitos inerentes à condição de Estado parte do Mercosul, até que os Estados partes acertem com a Venezuela as condições para restabelecer o exercício de seus direitos", diz o texto.
Para os venezuelanos ficarem fora do bloco, bastará que os quatro concluam que a legislação local não foi adaptada à normativa do Mercosul. Este é o cenário mais provável, uma vez que o próprio governo de Nicolás Maduro vê trechos incompatíveis com a Constituição venezuelana. O Uruguai concordou com essas condições ao se abster.
"Já não discutimos a presidência do Mercosul pela Venezuela, mas sim sua condição de sócio. Se não cumprirem seus deveres até 1.º de dezembro, serão expulsos", disse nesta quarta-feira, 14, o chanceler paraguaio Eladio Loizaga, em declarações divulgadas pela presidência do país.
Tecnicamente se trataria de uma suspensão, mas a falta de uma data para o fim da pena explica o uso do termo expulsão pelo diplomata paraguaio. Para o retorno ao bloco, a declaração conjunta indica que haveria a necessidade de consenso. A volta, que provavelmente seria facilitada por uma troca comando em Caracas, dispensaria a aprovação pelos Parlamentos - algo que travou a entrada venezuelana até que o Paraguai foi suspenso em 2012. O país mais próximo de entrar no bloco hoje é a Bolívia, no estágio de Estado associado em processo de adesão.
O fato de não ser prevista uma votação em dezembro, na qual seria necessário consenso, diminui a chance de o Uruguai barrar uma sanção. Os uruguaios defendiam a chegada de Caracas à presidência semestral do bloco por considerar que as instituições democráticas seguem funcionando na Venezuela. "Quando fecharem o Parlamento, estaremos de acordo sobre uma pena", disse em agosto o chanceler uruguaio Rodolfo Nin Novoa. O Uruguai admite que a Venezuela não adaptou sua legislação e é improvável que em dezembro defenda o contrário, caso Caracas não avance na adaptação às normas.
Veja o documento abaixo:
O prazo anterior para Caracas adequar-se venceu em 12 de agosto, sem que o país tenha incorporado à sua legislação cerca de 500 pontos relacionados principalmente a temas alfandegários e de respeito aos direitos humanos.
Esse descumprimento foi um argumento de Paraguai e Brasil para vetar a chegada da Venezuela à presidência semestral, que correspondia ao governo de Maduro pelo critério de ordem alfabética. Outra alegação era que a instabilidade política e econômica poderia prejudicar a negociação de tratados de livre comércio com blocos como a União Europeia.
Até o fim do novo prazo, a presidência semestral, que corresponderia aos venezuelanos, será colegiada. A declaração diz que os países poderão definir cursos de ação e adotar as decisões em matéria econômica e comercial e em outros temas essenciais para o funcionamento do Mercosul.
A decisão termina com o impasse acentuado pela passagem unilateral da presidência pelos uruguaios aos venezuelanos, em julho. Um trecho comum dos comunicados de Paraguai e Argentina sobre a declaração conjunta ressalta que a medida foi tomada para avançar em negociações comerciais.
O comunicado brasileiro sobre o tema detalha pontos do descumprimento: "Entre os importantes acordos e normas que não foram incorporados ao ordenamento jurídico venezuelano estão o Acordo de Complementação Econômica nº 18 (1991), o Protocolo de Assunção sobre Compromisso com a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos do Mercosul (2005) e o Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul (2002)".