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Mundo não pode mais ser ditado pelo G-7, diz Amorim; Lula nega que Brics seja ‘contraponto’

O ex-chanceler afirmou que o bloco do qual o Brasil faz parte com Rússia, China, Índia e África do Sul é uma ‘afirmação global’; em discurso nas redes sociais, presidente brasileiro adota um tom mais conciliador

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Por Felipe Frazão
Atualização:

ENVIADO ESPECIAL A JOHANNESBURGO - Assessor especial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o embaixador Celso Amorim afirmou nesta terça-feira, dia 22, que o interesse de 23 países em fazer parte do Brics evidencia a existência de uma “nova força” na ordem global e que o mundo não pode mais ser “ditado pelo G-7″.

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“Todo esse interesse que existe na expansão, países que desejam ser parceiros ou membros plenos do Brics demonstram que há uma nova força no mundo, que o mundo não pode mais ser visto como ditado pelo G-7″, disse Celso Amorim.

No mesmo dia, Lula adotou um tom mais conciliador em uma transmissão feita nesta terça-feira, 22, nas redes sociais. Lula negou que o Brics seja um contraponto ao G-7 —o grupo dos países industrializados, liderado pelos Estados Unidos.

“A gente não quer ser contraponto ao G-7 ou ao G-20, nem aos Estados Unidos. A gente quer se organizar. A gente quer criar uma coisa que nunca teve, que nunca existiu. O Sul Global... Nós sempre fomos tratados como se fôssemos a parte pobre do planeta, como se não existíssemos. Nós sempre fomos tratados como se fôssemos de segunda categoria. E de repente a gente está percebendo que podemos nos transformar em países importantes”, disse.

O assessor da presidência do Brasil, Celso Amorim, conversa com o ditador da Venezuela, Nicolás Maduro  Foto: Palácio de Miraflores//Reuters

O ex-chanceler, o mais influentes conselheiro direto de Lula na política externa, participa das reuniões de Lula na 15ª Cúpula do Brics, em Johannesburgo e vai estar no retiro reservado aos líderes. Os chefes de Estado e de governo tomarão decisões sobre a expansão do bloco, impulsionada pela China, e sobre a criação e uso de moedas alternativas ao dólar.

“O Obama já tinha dito isso, quando disse que o G-20 tinha substituído o G-7. Mas agora estava havendo uma tendência, em função das rivalidades entre Estados Unidos e China, em função da guerra na Ucrânia, de retração. Acima de tudo, essa reunião do Brics, com interesse enorme de países em desenvolvimento, demonstra que o mundo é mais complexo do que isso.”

“Há uma nova realidade no mundo, faz parte de uma nova organização, uma ordem mundial que não pode ser ignorada. Essa reunião deixa muito claro isso, a importância de um grupo de países em desenvolvimento que agora é uma afirmação global”, afirmou o embaixador, que não quis antecipar posicionamentos do Brasil.

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Antagonismo

A declaração de Amorim ecoa planos da China e contrasta com visões dentro do próprio governo. “O Brics não significa tirar nada de ninguém”, insistiu Lula. “O Brics tem essa simbologia. Não é a simbologia da rivalidade, mas de criar um organismo novo, forte, que tenha muita gente e muitos recursos.”

Mais cedo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o bloco formado atualmente por Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul, não significa um “antagonismo” a outros fóruns internacionais dos quais os países participam.

“O Brics tem grande contribuição a dar. Brasil, África do Sul, Índia, China e Rússia podem, cada um a partir de sua perspectiva, oferecer ao mundo uma visão coerente com seus propósitos e que não signifique nenhum tipo de antagonismo a outros fóruns importantes dos quais nós mesmos participamos”, disse o ministro da Fazenda.

O ministro da Fazenda do Brasil, Fernando Haddad, ressaltou a necessidade de o Brasil continuar dialogando com outros fóruns internacionais  Foto: Evaristo Sa/AFP

Haddad antecipou o recado do governo brasileiro, que resiste à expansão dos membros do Brics, principal discussão na cúpula sul-africana. Um temor claro do governo é não se indispor com parceiros como os Estados Unidos e a União Europeia, com as discussões em andamento no Brics.

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A China, mais poderoso integrante do Brics, pressiona pela inclusão de até 23 países, o que alteraria o perfil político, econômico e populacional do Brics. O entendimento de diplomatas brasileiros é que Pequim ambiciona a formação de um bloco cada vez mais antagônico ao Ocidente e ao G-7, com a provável expansão de membros do Brics.

Moeda

Um dos projetos que Lula quer discutir durante o encontro do bloco e a possível criação de uma moeda única do Brics para reduzir a dependência do dólar. “Eu sonho com a construção de várias moedas entre outros países que façam comércio, que o Brics tenha uma moeda. Como o euro”, disse o petista em Hiroshima, após encerrar sua participação na cúpula do G-7 em maio.

Em entrevista ao jornal britânico Financial Times, o ex-economista do Goldman Sachs que cunhou o acrônimo Brics, Jim O’Neill, classificou como “ridícula” a ideia de que o grupo possa desenvolver sua própria moeda.

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Para O’Neill, criar uma moeda comum para as cinco economias seria inviável. “É simplesmente ridículo”, disse ele sobre a “moeda de troca” proposta por Lula e outros políticos do bloco. “Eles vão criar um banco central dos Brics? Como fariam isso? É quase constrangedor.”

Moscou também já declarou que no curto prazo a ideia de uma moeda única do Brics não é possível. “Muitos países estão trilhando o caminho de usar moedas nacionais em acordos. Certamente, há discussões em andamento sobre a possibilidade e viabilidade de introduzir determinados processos de integração, mas dificilmente isso poderá ser implementado no curto prazo”, afirmou o porta-voz do Kremlin Dmitri Peskov sobre a proposta defendida pelo Brasil.

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