Tática de Trump para resolver crise com a Colômbia indica como EUA devem tratar política externa

Não houve reuniões de crises e nem chamadas silenciosas para acalmar uma disputa com um aliado; a escolha foi por ameaças

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Por David E. Sanger (The New York Times)

No fim, levou apenas cerca de 12 horas para que o primeiro confronto direto do presidente Donald Trump com um dos aliados mais próximos dos Estados Unidos na América Latina, a Colômbia, resultasse em um recuo completo do presidente colombiano Gustavo Petro.

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Não foi uma grande disputa. A Colômbia depende dos Estados Unidos para mais de 25% de suas exportações. Embora os detalhes da disputa provavelmente sejam rapidamente esquecidos, a ameaça rápida de Trump em impor tarifas esmagadoras e a rápida rendição de Petro provavelmente encorajarão o presidente americano enquanto ele pensa em como fazer uso da mesma arma contra novos alvos.

Não há muito mistério sobre quem seriam os próximos: a Dinamarca, cujo primeiro-ministro disse a Trump que a Groenlândia não estava à venda durante uma conversa exaltada e cheia de palavrões há quase duas semanas, e Panamá, onde o secretário de Estado Marco Rubio deve desembarcar em alguns dias para exigir que o país devolva o controle do Canal do Panamá aos EUA — o país que o construiu, há 120 anos.

Imagem do dia 25 mostra o presidente americano Donald Trump durante um evento em Las Vegas. Trump entrou em conflito diplomático com o presidente colombiano Gustavo Petro em torno de deportações Foto: Kenny Holston/NYT

Esta é a era que Fred Kempe, presidente do centro de estudos Atlantic Council, de Washington, chamou de “mais mercantilista, menos livre comércio e de mais arrogância das grandes potências”.

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O desastre diplomático com a Colômbia teve os três elementos, mas também foi um exemplo sobre como o governo Trump toma as decisões de política externa: não houve documentos políticos, reuniões para pesar opções e nem um movimento nos bastidores para diminuir as tensões com um aliado cuja cooperação os EUA precisam em uma série de problemas.

Seria dessa maneira que uma disputa sobre colombianos deportados porque estavam nos Estados Unidos ilegalmente seria resolvida em uma presidência comum, independente do presidente ser democrata ou republicano.

Neste caso, talvez não houvesse muita necessidade de debate interno: a Colômbia não é a China, ou a Rússia, ou mesmo a Coreia do Norte e o Irã, países que têm maneiras de revidar os Estados Unidos ou os interesses americanos. Então era um alvo fácil — e um lugar relativamente sem custos para Trump agir como ele imagina que deva usar o poder americano.

Não houve processo interno neste caso — e não houve tempo para tal processo. Ele aconteceu primeiro nas redes sociais, com uma postagem furiosa de Gustavo Petro sobre não permitir que os EUA pousassem aeronaves militares no país com colombianos algemados. “Não posso fazer com que os migrantes fiquem em um país que não os quer, mas se esse país os enviar de volta, deve ser com dignidade e respeito por eles e por nosso país”, escreveu o presidente colombiano.

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Trump revidou no Truth Social — onde ele coloca pronunciamentos antes de serem divulgados pela assessoria de imprensa da Casa Branca (que se atualiza citando as postagens do Truth Social) — ameaçando Petro de sair de seu caminho ou ter a sua economia esmagada. Ele anunciou a imposição de tarifas de 25% sobre exportações colombianas, o que afetaria as indústrias de petróleo bruto, carvão e café, e que as dobraria se Petro não recuasse em uma semana.

Imagem de outubro de 2024 mostra o presidente colombiano Gustavo Petro na cerimônia de abertura da COP-16, em Cali. Petro pediu respeito a migrantes colombianos deportados pelos EUA Foto: Fernando Vergara/AP

O presidente americano concluiu chamando o presidente colombiano de “socialista”, o que Petro admite sem nenhum problema.

O que aconteceu depois foi fascinante: Petro reagiu brevemente, anunciando as próprias tarifas sobre importações americanas e acusando Trump de tentar derrubar seu governo democraticamente eleito. “Você não gosta da nossa liberdade, tudo bem”, escreveu. “Eu não aperto a mão de escravizadores brancos.”

Houve muita história aqui, claro. Há 122 anos, os EUA apoiaram a revolução panamenha contra a Colômbia com a intenção de acelerar o caminho para a construção do Canal do Panamá. Isso na era sobre a qual Trump fala de maneira saudosa.

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Presumivelmente, Petro olhou para suas chances de sair vitorioso desse conflito e decidiu que era zero. Rapidamente decidiu que seu melhor caminho era sair do caminho de Trump. Os voos militares poderiam ser retomados, anunciou o Ministério das Relações Exteriores da Colômbia. Houve mais palavras sobre exigir que os passageiros fossem tratados com dignidade, mas claramente isso não era executável. Os Estados Unidos suspenderam os aumentos de tarifas antes de serem impostas, e Rubio disse que as restrições de visto para o presidente colombiano permaneceriam até as deportações de fato ocorrerem.

Quando o dia acabou, quase nada havia mudado. Petro havia recusado alguns voos, Trump havia ameaçado retaliar, Petro havia cedido, e o status quo foi retomado. Mas para qualquer um que tente descobrir os próximos passos do governo Trump, houve muitos indicadores nessa crise sobre para onde as coisas podem estar indo.

A começar pela Dinamarca, cuja primeira-ministra, Mette Frederiksen, teve uma conversa tensa e agressiva com Trump cinco dias antes de sua posse. Ciente das ameaças do presidente americano de coerção militar ou econômica para conseguir o que quer na Groelândia e no Canal do Panamá, ela começou a conversa expondo ideias sobre como os EUA poderiam expandir a presença militar existente na Groelândia — hoje, há uma base da Força Espacial lá — e ajudar a explorar os consideráveis ​​recursos minerais. Trump não estava interessado em cooperação; ele queria controle, talvez propriedade, e parecia feliz em encorajar um movimento na Groenlândia para buscar a independência da Dinamarca para chegar lá.

Foi uma troca notável. A Dinamarca é, afinal, uma aliada da Otan, e no mês passado Trump falou sobre usar todos os elementos do poder americano — econômico e militar — para forçá-la a entregar território. Se alguma vez houve um exemplo de como o Trump não está interessado em manter a “ordem baseada em regras” pós-2.ª Guerra e substituí-la por políticas de superpotências, foi este.

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A Dinamarca “estaria ansiosa para negociar com os americanos sobre direitos de base, desenvolvimento de recursos, coordenação de segurança no Ártico e qualquer outra coisa que a Administração Trump quisesse”, escreveu Ian Bremmer, que lidera a consultoria Eurasia Group, na manhã de segunda-feira, 26. “Agora é mais provável que a Groenlândia vote pela independência em um referendo futuro, criando seu próprio acordo de segurança com os americanos, minando criticamente as relações dos EUA com a Dinamarca e, com ela, o Bloco Nórdico.”

E então há o Panamá, que se prepara para receber Marco Rubio. Normalmente, a primeira visita de um secretário de Estado é sobre reafirmar alianças e ansiar por anos de cooperação. A chegada de Rubio provavelmente incluirá um pouco disso — e uma demanda para que o Tratado do Canal do Panamá seja descartado e o arranjo volte ao que Theodore Roosevelt tinha em mente em 1903: o controle americano.

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