O que a ‘hipótese dos avós ativos’ pode nos dizer sobre envelhecer bem

A necessidade de avós saudáveis e ativos que possam ajudar na criação dos netos pode estar codificada em nossos genes

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Por Gretchen Reynolds
5 min de leitura

THE NEW YORK TIMES - LIFE/STYLE - Por que a atividade física é tão boa para nós à medida que envelhecemos? De acordo com uma nova teoria sobre exercícios físicos, evolução e envelhecimento, a resposta está, em parte, em nossa necessidade ancestral dos avós.

A teoria, chamada de “Hipótese dos Avós Ativos” e detalhada em um editorial recente na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, sugere que nos primeiros dias de nossa espécie, caçadores-coletores que viviam além de seus anos férteis poderiam contribuir e fornecer recursos extras e socorro aos netos, ajudando esses descendentes a sobreviver. A teoria também defende que foi a atividade física que ajudou os caçadores-coletores a sobreviverem o suficiente para se tornarem avós - uma ideia que tem potencial relevância para nós hoje, porque pode explicar, em primeiro lugar, por que o exercício é bom para nós.

Necessidade ancestral dos avós faz com que exercitar-se se torne tão importante à medida que envelhecemos, diz pesquisa.  Foto: Pixabay

A maioria de nós provavelmente pensa que já sabemos por que devemos nos exercitar. Temos amplas evidências de que a atividade física de quase qualquer tipo melhora a saúde do coração, reduz os riscos e a gravidade de várias doenças e, de muitas maneiras, apenas faz com que a gente se sinta melhor.

Mas esses benefícios explicam como o exercício é bom para nós, “não por que”, disse Daniel Lieberman, biólogo evolucionário da Universidade de Harvard e principal autor do editorial. Lieberman, uma autoridade no papel da atividade física na evolução humana, foi autor de um estudo seminal de 2004 na Nature sobre o papel da corrida de longa distância na evolução humana que ajudou a gerar o movimento de corrida descalço. Ele também é o autor do livro de 2021 Exercised.

Recentemente, ele começou a se perguntar por que o movimento parece ter um impacto tão diferente em nós em comparação com outros primatas. Estudos de Lieberman e outros descobriram que macacos selvagens e em cativeiro normalmente caminham menos de três quilômetros por dia, menos do que o adulto americano médio, que caminha cerca de quatro quilômetros por dia, e muito menos do que os modernos caçadores-coletores, como os Hadza da Tanzânia, que geralmente percorrem 9 quilômetros ou mais por dia.

Mas, apesar desse relativo langor, os símios raramente desenvolvem os tipos de distúrbios ligados à inatividade em humanos, como doenças cardíacas, artrite e diabetes. Eles conseguem se manter saudáveis sem muita atividade, enquanto nós geralmente não conseguimos.

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Por outro lado, normalmente vivemos mais que os símios e a maioria dos outros mamíferos. Os caçadores-coletores, cuja expectativa de vida imita a de nossos antepassados, geralmente vivem bem até os 70 anos (desde que sobrevivam à primeira infância). Isso está muito além da idade de ter filhos, pelo menos para as mulheres, o que é incomum na natureza.

Um famoso artigo de 1998, também publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, propôs que as mulheres evoluíram para viver bem após a menopausa para ajudar a garantir que as gerações sucessivas prosperassem. Essa ideia, conhecida como Teoria da Avó e amplamente aceita pelos antropólogos hoje, descreve como as mães fornecem alimentos e cuidados aos filhos e depois, quando os filhos têm filhos, ajudam a alimentar e cuidar desses bebês, garantindo o êxito das gerações futuras.

Mas Lieberman e seus colegas sentiram que a Teoria da Avó deixou algumas perguntas sem resposta sobre o que permitiu que os humanos vivessem tanto, em comparação com a maioria das outras espécies. Foi aí que entrou a atividade física.

Os primeiros humanos tinham que se movimentar com frequência para caçar comida, segundo o pensamento, e aqueles que se moviam mais e encontravam mais comida tinham maior probabilidade de sobreviver. Ao longo de eras, esse processo levou à seleção de genes que foram otimizados pela atividade física abundante. A atividade física também parece desencadear vários processos celulares controlados por genes que ajudam a promover a saúde. Dessa forma, a evolução favoreceu as tribos mais ativas, que tendiam a viver mais tempo e podiam então intervir para ajudar com os netos, favorecendo a sobrevivência das famílias ativas.

Em outras palavras, o exercício é bom para nós, eles apontam em seu novo artigo, porque há muito tempo, os humanos mais jovens e vulneráveis precisavam de avós, e esses avós precisavam ser vigorosos e móveis para ajudar a manter os netos nutridos.

Crucialmente, o novo artigo Active Grandparents (Avós Ativos) também investiga o que ocorre na atividade física que ainda a torna tão necessária para o envelhecimento saudável hoje. Por um lado, movimentar-se consome energia que, de outra forma, poderia ser armazenada como gordura, que, em excesso, pode contribuir para doenças da vida moderna, como diabetes tipo 2, escrevem Lieberman e seus coautores.

A atividade também desencadeia uma cascata de efeitos que nos fortalecem. “O exercício é uma espécie de estresse”, disse-me Lieberman. Ele rasga ligeiramente os músculos e tensiona os vasos sanguíneos e os órgãos. Em resposta, um grande corpo de ciência do exercício mostra, nossos corpos iniciam uma variedade de mecanismos celulares que consertam os rompimentos e tensões e, na maioria dos casos, reconstroem as partes afetadas. “É como se você derramasse café no chão, limpasse e seu chão ficasse mais limpo do que estava”, disse Lieberman. Essa reação exagerada interior provavelmente é especialmente importante quando somos mais velhos, ele continuou. Sem exercícios e os reparos que os acompanham, os corpos humanos envelhecidos não funcionam tão bem. Nós nos desgastamos. Não podemos cuidar dos netos.

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Fundamentalmente, disse Lieberman, a falta de exercício durante o envelhecimento explica por que há uma diferença entre o tempo de vida humano - quantos anos vivemos - e o tempo de saúde - quantos desses anos permanecemos com boa saúde.

“Eles costumavam ser a mesma coisa”, disse Lieberman. Um humano primitivo inativo não permaneceria saudável e provavelmente morreria cedo. Hoje, muitos de nós podem permanecer inativos e sobreviver até a velhice, mas as chances são de que não permaneceremos totalmente saudáveis se o fizermos. Nossa herança genética e história como seres humanos requerem exercício e movimento, disse Lieberman. “Aposentadoria não é hora de desacelerar.”

Essa ideia de que podemos, devemos e até precisamos permanecer ativos à medida que envelhecemos, graças à evolução humana, está no centro da Hipótese dos Avós Ativos. Sedutora como hipótese é, no entanto, apenas uma teoria e quase impossível de se testar.

E alguns especialistas questionam algumas de suas suposições. A Hipótese dos Avós Ativos não diferencia homens e mulheres, disse Kristen Hawkes, uma ilustre professora de antropologia da Universidade de Utah que foi a principal autora da Teoria da Avó. Ela destacou que a pesquisa original de seu grupo sobre longevidade e avós se concentrou nas avós, após os anos férteis. Os avós podem procriar até a velhice, então seus papéis nas famílias alargadas e sua história evolutiva seriam diferentes dos das avós, ela disse.

A hipótese também sugere que a atividade física afeta as pessoas de maneiras que podem ser exclusivas aos humanos. “Mas a atividade física ajuda a melhorar a saúde de outras espécies, como os camundongos”, disse Michael Gurven, antropólogo da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, que estuda biologia e evolução e está trabalhando em um livro sobre longevidade em caçadores-coletores. Ainda assim, ele disse: “Não há dúvida de que a atividade física habitual pode melhorar a saúde. Eu gosto de como este artigo não toma esse fato como garantido, mas se concentra na pergunta simples: por quê?”

A resposta que Lieberman e seus coautores estabeleceram vale a pena ser lembrada à medida que 2022 amadurece e adicionamos mais meses e anos às nossas vidas. “Fomos selecionados” através da evolução para sermos ativos, disse Lieberman. E ser fisicamente ativo pode ajudar a garantir que “a duração de nossa boa saúde corresponda à duração de nossas vidas”. /TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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