Em 2006, quando a ABPD entrou na Justiça contra internautas brasileiros que baixavam e disponibilizavam músicas ilegalmente na rede, ele afirmava que com as ações a associação queria conscientizar os usuários: “A grande rede não pode ser transformada numa terra de ninguém, onde se pode tudo”. Hoje, ele conta que o setor “está se reinventando e adaptando-se a esta nova realidade e a este novo mercado, buscando novos modelos de negócio além da “venda” de música”. Os principais trechos dessa conversa, você confere aí embaixo:
Leia também (Link no papel – 05/10/09): * Lily Allen vs. Thomas Edison. O chilique da cantora inglesa contra o P2P não é novidade: música sempre olhou torto para o novo * Entrevista – Gerd Leonhard fala sobre pirataria e alternativas da indústria
COMO CHEGAMOS ATÉ AQUI “A popularização do uso de redes P2P descentralizadas e as facilidades de disponibilização ilegal de links para conteúdo musical através de sites, blogs, redes sociais, fóruns de discussão, etc., e por via de conseqüência, o fato do público em geral acessar com facilidade qualquer tipo de conteúdo a qualquer tempo, afetaram de modo dramático a indústria fonográfica em todo o mundo. Outras indústrias de produção de conteúdo como filmes, softwares, livros e notícias também estão sendo afetadas, mas a música, por geralmente vir contida em arquivo de poucos bytes é o tipo de conteúdo mais exposto e facilmente transmitido pela internet”, afirma.
E continua: “O faturamento do setor em todo o mundo reduziu-se à metade (no Brasil a 25% do que representava em 1997), o número de artistas contratados por cada companhia certamente diminuiu significativamente, muitos profissionais de nossa indústria perderam seus empregos, redes de lojas especializadas em música fecharam e mais uma gama enorme de conseqüências que poderiam ser enumeradas. De uma forma genérica, as companhias do setor estão se reinventando e adaptando-se a esta nova realidade e a este novo mercado, buscando novos modelos de negócio além da ‘venda’ de música, como o licenciamento, o agenciamento de seus artistas, parcerias com patrocinadores, etc.”
NAPSTER, 10 ANOS “Hoje é muito fácil dizer que o fechamento do Napster não teve impacto positivo para os negócios com música, até porque vários outros softwares e redes P2P surgiram na seqüência. Mas na época (em 2000), era o que a indústria podia fazer para tentar resguardar seus direitos e os dos artistas e autores”, defende.
QUAL O FUTURO DO NEGÓCIO? “Um mercado físico e digital de música auto-sustentável, que remunere autores, artistas, músicos e produtores/gravadoras de forma a estimular continuamente os investimentos em novas produções musicais”, aponta.
ADAPTAÇÃO AS MUDANÇAS “Elas têm todo o potencial para serem positivas no futuro, embora haja poucas indicações disto no atual cenário do setor. Toda a indústria musical está trabalhando e se adaptando à realidade que a internet e as novas tecnologias ajudaram a construir. Isto inclui necessariamente que de uma maneira ou de outra, o acesso a música gere remuneração justa aos criadores e produtores e alimente toda a cadeia produtiva da música”, afirma.
PIRATARIA “No caso de ‘compartilhamento’ de músicas protegidas por Direito Autoral, os usuários de uma rede P2P cometem dois ilícitos cíveis e penais de acordo com a lei brasileira: a disponibilização ilegal de conteúdo sem autorização de seus titulares e a reprodução fraudulenta dos mesmos. No caso do P2P, ganha (e muito) o desenvolvedor do software, através de receitas advindas de publicidade. Já no caso das redes sociais, tipo Orkut, por exemplo, onde há comunidades inteiras 100% voltadas à disponibilização ilegal de links para música, ganham obviamente os administradores de tais redes sociais. Nos dois casos ganha o Provedor de Acesso que usa freqüentemente a largura da banda, velocidade de conexão e facilidades para download como atrativos para novos clientes”, observa.
E conclui: “Só não ganha o autor que cria, o artista que grava e o produtor que financia todo o processo e ainda gasta em promoção”.
NOVAS RECEITA “As fontes alternativas passam a fazer parte do portfólio de receitas principais: venda em suportes físicos como o CD e DVD; venda de downloads de músicas avulsas; venda de álbuns completos; licenciamento genérico; agenciamento de artistas; gestão coletiva de direitos autorais por utilizações que não podem ser cobradas individualmente, etc, etc”, explica.”
DOWNLOAD VS. STREAMING “O download, embora tenhamos na Apple uma história de muito sucesso, realmente ainda não compensa a queda na venda de música em suportes físicos. Talvez nunca compense, e é possível que o ‘acesso’ a conteúdo armazenado online (via streaming) e não a ‘posse’ de arquivos em um computador, venha a ser o que o futuro reserva para a indústria musical”, acredita.
Esta entrevista é a décima de uma série que o Link está publicando com artistas e executivos das principais gravadoras sobre os desafios da música na era digital.
Leia as outras aqui: * ‘Estamos deslumbrados com o avanço tecnológico. Não questionamos mais nada’, diz Fred 04, do Mundo Livre S/A * ‘Download legal está com dias contados. Pessoas não pagam pelo que é ofertado de graça’, diz John Ulhoa do Pato Fu * ‘Vai ser ‘brega’ uma pessoa dizer que tem álbum pirata’, diz Henrique Portugal do Skank * ‘Só quem ganha com a pirataria (física) são os pilantras’, diz Tiaguinho do Exaltasamba * ‘A internet é uma ‘terra sem lei”, diz cantora Claudia Leitte * ‘Compartilhar o que é seu é direito de todos’, diz Chorão do Charlie Brown Jr. * ‘Projetos para monitorar internautas não vão sair do papel’, diz mídia futurista Gerd Leonhard * ‘A internet encoraja as gravadoras a divulgar novos artistas’, diz Danillo Ambrosano, da Universal Music * Para Márcio Buzelim, do Jota Quest, gravadoras passam por “uma espécie de ‘lei de Darwin’”