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Foto icônica de Che é usada para vender sorvete e cigarro

Imagem que ganhou o mundo foi tirada por Korda, fotógrafo oficial de Fidel, em 1960.

Por Stephanie Holmes
Atualização:

Ela talvez seja a imagem mais reproduzida, reciclada e copiada do século 20. Che Guevara, os olhos emoldurados por grossas sobrancelhas, a boina com uma única estrela sobre o cabelo despenteado, o olhar desviado da foto com uma intensidade austera. Já faz 40 anos que o rebelde argentino foi morto a tiros, logo qualquer jovem radical que tenha torcido por suas lutas revolucionárias em Cuba e na Bolívia já entrou na meia idade há tempos. Mas a imagem foi repetida infinitas vezes - estampada em camisetas e pichada nas paredes, transformada em arte pop e usada para embrulhar sorvetes e vender cigarros - e seu apelo não desbotou. "Não há outra imagem igual. Que outra imagem se sustentou dessa maneira?", pergunta Trisha Ziff, curadora de uma exibição itinerante sobre a iconografia de Che. "Che Guevara virou uma marca. E o logotipo da marca é essa imagem, que representa mudança. Ela se tornou o ícone do pensamento independente, seja no nível que for - anti-guerra, pró-verde ou anti-globalização", diz ela. Sua presença - que vai dos muros dos territórios palestinos às butiques parisienses - faz dela uma imagem que está "fora de controle", diz Ziff. "Ela se transformou numa corporação, um império, a essa altura." A proliferação da imagem - baseada em uma fotografia tirada por Alberto Korda em 1960 - aconteceu, em parte, devido a uma escolha política de Korda e outros de não cobrar pelo uso não-comercial da imagem. Jim Fitzpatrick, que produziu o onipresente desenho em contraste no fim dos anos 60, quando era um jovem artista gráfico, disse à BBC que ele queria que sua arte fosse disseminada. "Eu deliberadamente o criei (o desenho) para que se reproduzisse como os coelhos", diz ele. "A forma como o mataram, não haveria nenhum memorial, nenhum local de peregrinação, nada. Eu estava determinado que aquela imagem receberia a maior circulação possível", explica Fitzpatrick. "A imagem dele nunca morrerá, seu nome nunca morrerá." Para Ziff, o assassinato de Che Guevara também marca o início da imagem mítica. "O nascimento da imagem acontece na morte de Che, em outubro de 1967", diz ela. "Ele era bonito, ele era jovem, mas mais do que isso, ele morreu por seus ideais, então ele automaticamente se transforma num ícone." Alberto Korda captou a famosa imagem no dia 5 de março de 1960, durante um funeral em massa em Havana. Um dia antes, um navio de carga francês cheio de munição explodiu no porto da cidade matando cerca de 80 cubanos, num ato que Fidel Castro atribuiu aos americanos. Korda, o fotógrafo oficial de Castro, descreve a expressão de Che na foto, que ele intitulou "Guerrilheiro Heróico", como "encabronado y dolente", ou zangado e triste. Duas fotos foram tiradas naquele momento. A primeira incluía a folhagem de palmeiras e um homem virado para Che, ambos cortados na seqüência. Sem ser publicada por um ano, a foto só era vista por aqueles que passavam pelo estúdio de Korda, onde ela ficava pendurada na parede. O homem que levou a imagem de Che para a Europa foi o intelectual italiano Giangiacomo Feltrinelli, que distribuiu cartazes com a foto pela Itália em 1967. Depois disso, a fotografia de Korda apareceu em diversas revistas. Foi numa publicação alemã que Fitzpatrick viu a imagem pela primeira vez. Depois da morte de Che, o artista imprimiu cópias e cópias do desenho que havia criado e as enviou para grupo de ativistas políticos por toda Europa. Com a passagem do tempo, o significado e o homem representados na imagem se perderam de seu contexto, diz Ziff. O rosto de Che começou a ser usado como decoração de produtos, de lenços a lingerie. A Unilever até criou uma versão "Che" do picolé Magnum na Austrália, com sabor de cereja e goiaba. "Há uma teoria de que a imagem só pode existir por um certo tempo até que o capitalismo se aproprie dela. Mas o capitalismo só quer se apropriar de imagens que guardem um certo senso de perigo", diz a curadora de arte. Na América Latina, no entanto, o rosto de Che continua sendo símbolo da revolução armada, segundo Ziff. O presidente venezuelano, Hugo Chávez, usa com freqüência uma camiseta com a imagem estampada e há relatos de que Evo Morales, da Bolívia, presenteia visitantes com uma versão da foto feita com folhas de coca. Combinando capitalismo e comércio, religião e revolução, para Ziff, o ícone segue absoluto. "Não há outra imagem que chegue perto de nos levar a lugares tão diferentes." BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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