O samba antes e depois de Rildo

O veterano produtor, que impulsionou as carreiras de sambistas importantes, vem aí com novo álbum

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Por Lucas Nobile
Atualização:

A calmaria mora no não dito. O gaitista, produtor, arranjador e maestro Rildo Hora precisou de tempo para entender isso e fazer um "pacto com a generosidade", como ele mesmo define. Do alto de seus 1m90, o intempestivo e magro Rildo, que ganhou da amiga Beth Carvalho o apelido de "Comprido Hora", costumava bater de frente com artistas e gravadoras para impor suas ideias. E os arroubos de imperatividade não se restringiam apenas à profissão. Nascido em Caruaru de uma família predominantemente branca e reacionária, recém-saído da adolescência, Rildo deixava crescer a vasta cabeleira "pixaim", que havia herdado do pai, só para provocar a ira das tias e avós. "Em 1968 eu me considerava um comunista. Hoje sou um órfão do Kremlim. Assim como o presidente Lula, aprendi a conviver com os contrários", diz Rildo, lulista convicto, que justifica seu principal hobby, a política, assistindo à TV Senado nas horas vagas.Hoje, aos 70 anos - e mais de 50 de carreira -, Rildo se tornou uma espécie de Rei Midas do Samba e coleciona em sua cobertura no Corte do Cantagalo, no Rio de Janeiro, cerca de 150 discos de ouro e platina de diversos artistas com quem trabalhou, e 4 Grammys Latinos conquistados ao lado de Zeca Pagodinho (2001/02/ 03/ 06).Consagrado como produtor e arranjador, ele ainda respira novos projetos que caminham na contramão dos enlatados do mercado. Sem abandonar os grandes nomes com quem trabalha no momento, como Zeca e Fundo de Quintal, Rildo se atualiza, dedicando seu tempo à produção de jovens artistas da cena independente. "Acredito na força de baixo para cima na cultura e estou muito sensibilizado em trabalhar com sangue novo. O segmento independente é muito interessante, lá não se fala a palavra "vender". É ele que vai dar a futura cara da música brasileira, com liberdade de expressão", comenta o produtor.Mesmo com a estrada de uma longa carreira pavimentada pela produção e por arranjos de gravações antológicas, Rildo ainda faz questão de refrescar a memória do público, revelando mais duas de suas facetas: a de gaitista e a de compositor. A primeira ainda resiste com participações em discos e frequentes shows-solo que ele faz pelo Brasil. Foi com a gaita que Rildo conquistou os contemporâneos de bossa nova com registros singulares, como Batida Diferente, de Durval Ferreira, no seu disco de estreia, Samba Made in Brazil - Rildo Hora e o Clube dos 7, e impressionou os estrangeiros, como os jornais que o classificaram de "virtuoso da gaita" e o coreógrafo Mikhail Baryshnikov, em viagem à antiga União Soviética, em 1965.E a segunda faceta está mais viva do que nunca, já que Rildo acaba de entrar em estúdio para gravar um disco com sua filha, a cantora Patrícia Hora, com lançamento previsto para o início de 2010. No repertório, composições inéditas antigas e recentes de Rildo com parceiros como Nelson Sargento, Luiz Carlos da Vila, Humberto Teixeira, Nei Lopes e Zélia Duncan, e a regravação de Anda, Sai Dessa Cama, parceria com Martinho da Vila.Em relação à carreira de arranjador e produtor, Rildo não poderia estar mais contente, já que depois de um hiato de 25 anos ele voltará a trabalhar com Beth Carvalho. O disco, que começa a ser gravado apenas no próximo ano, terá no repertório sambas inéditos resgatados no imenso baú da "Madrinha do Samba".

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